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Comportamento

Em ano desafiador, professor chorou e sorriu na batalha de ensinar

Willie, Kelen e Luciana contam desafios para ensinar e suas esperanças para a educação

Thailla Torres | 15/10/2020 07:30
Luciana Felix é professora em Campo Grande.
Luciana Felix é professora em Campo Grande.

Para Willie, Kelen e Luciana, o caderno de planejamento escolar vai entrar na história como um dos mais simbólicos da batalha de ensinar. Num ano em que a pandemia do novo coronovírus mudou os rumos de tantas profissões, o Dia dos Professores é de reflexão sobre as lições que 2020 trouxe à educação.

Professores foram forçados a repensar metodologias para contemplar os mais diferentes contextos. A diversidade da sala de aula deixou de ser apenas sobre a personalidade dos alunos e passou a ser quanto às formas de chegar aos estudantes nos mais variados ambientes, utilizando muitos recursos simultâneos – portais de ensino, plataformas de aprendizagem, vídeo aulas gravado, web aulas por meio de videoconferências ao vivo, roteiros de estudo impressos, mensagens por e-mail ou por outros aplicativos – sem limite de carga horária para conseguir resolver toda a demanda. E, meses depois, eles ainda tentam entender o processo e atender a alfabetização de seus alunos.

Por um lado, muitos avançaram décadas no que se refere ao uso das tecnologias a serviço do ensino. Por outro, isso tudo tem sido muito cansativo e até frustrante. “Eu fico feliz de ver muitos alunos aprendendo a usar ferramentas novas, contudo também me sinto limitado por não poder fazer mais por aqueles que não possuem o mesmo nível de acesso. Este ano trouxe uma sensação de insuficiência, apesar de também ter havido progresso”, confessa o professor mestre Willie Macedo de Almeida, 32 anos, que atualmente ensina Língua Portuguesa, Literatura e Redação em Miranda.

Willie é professor em Miranda.
Willie é professor em Miranda.

Willie pertençe a uma família de educadores. A mãe foi professora por 20 anos. Os relatos delas sobre metodologias que deram certo após situações desafiadoras, capazes de revolucionar não só a aprendizagem, mas também a vida dos seus alunos, sempre o impressionaram.

“Sabe aquela história – que parece clichê cinematográfico – do moleque rebelde, cheio de dificuldades de aprendizagem e de relacionamento, mas que acaba se tornando amigo da professora e, então, com o tempo se transforma em alguém de sucesso? Pois é! Eu cresci vendo essas narrativas se concretizarem quando minha mãe e minhas tias encontravam alguns dos antigos alunos”, lembra.

Hoje, quando entra na sala de aula – ainda que seja virtual – Willie aproveita a oportunidade de interagir entendo que, como professor, tem o privilégio de construir algo mais significativo. “Não ergo prédios, mas tenho o ensejo de edificar pessoas. Não faço casas, mas estabeleço relações significativas e ornamento a história dos meus aprendizes com um pedacinho do que eu sou através do pouquinho que sei”, diz.

Para ele o mais desafiador em 2020 tem sido a necessidade de adaptação ao que alguns chamam de “novo normal”. “Todos os protocolos de biossegurança modificaram demais o cenário. As máscaras ocultaram os sorrisos, que passaram a ser lidos apenas no franzir dos olhos quando a bochecha se levanta. As indicações no chão impuseram um distanciamento que não possibilita aqueles abraços que fazem tão bem à nossa saúde emocional. Sem contar que, por motivos particulares, nem todos podem comparecer à escola. Então, temos que conviver com a saudade e encarar os ajustes tão necessários”.

Kelen é professora da Educação Infantil em Campo Grande.
Kelen é professora da Educação Infantil em Campo Grande.

A pergunta que fica é: foi possível ensinar em 2020? Willie afirma que sim, assim como a pedagoga e bióloga Kelen Fochesatto, 40 anos, e a pedagoga Luciana Félix Bezerra Komiyama, 41 anos, que lecionam em Campo Grande.

“Professores buscaram superar seus limites para ofertar um ensino de qualidade aos seus alunos, das mais variadas maneiras. Entretanto, ainda resta aquela sensação de insuficiência decorrente dos resultados que estamos acostumados a produzir”, diz Willie.

Ainda assim, pequenos passos foram significativos, como para Kelen, que conseguiu alfabetizar e acompanhar os primeiros traçados da escrita de seus alunos pela tela do computador.  “Eu trabalho com grupo quatro crianças de 4 a 5 anos. Vi através de imagens e vídeos eles iniciando o traçado da sua letra inicial e alguns já escrevem o nome. E isso foi muito significativo”.

Cápsulas da Saudade feitas pela professora Kelen.
Cápsulas da Saudade feitas pela professora Kelen.

Kelen passou dias pesquisando, gravando e até errando na busca de qual era o melhor aplicativo para gravar uma aula. “Precisei entender que não podia ter vídeos muito longos, lembrando-se da condição familiar desse aluno que às vezes não tivesse um celular com uma memória suficiente. E buscar uma relação de muita parceria com a família que esse foi o maior desafio”, comenta.

Para Luciana, que tem acompanhado o desenvolvimento dos alunos através das atividades devolvidas e de fotos enviadas, ela acredita que houve uma mistura de avanços. “Mas temos que levar em conta que cada criança tem seu momento, sua maneira de aprender. E as famílias têm sido (a maioria, na minha turma) muito parceiras. Mas não tem como medir o aprendizado real. Por que alfabetização é um processo. E nós estamos vendo mais o produto final do que esse processo em 2020.

Por isso, neste dia 15 de outubro, que fica para os três professores é a esperança.

O que realmente faz valer a pena são as pessoas que tornam tudo isso mais significativo, gratificante ou leve: familiares que apoiam colegas que dão suporte, os alunos que realmente se empenham para dar sentido ao processo educativo, os responsáveis por cada estudante que participam ativa e colaborativamente... enfim, todos que fazem esse esforço valer a pena. Esse tipo de comunidade escolar é uma dádiva contínua na vida de um professor. Portanto, quem deseja homenagear um professor deve abraçar a missão dele”, diz Willie.

Eu acredito sim que nós professores somos transformadores diários na vida do ser humano, pois conseguimos vencer barreiras e enfrentar desafios. Ser professor é uma dádiva rara que poucos conseguem possuir e cultivar de maneira competente e para o nosso retorno nossos alunos precisam mais do que tudo do nosso acolhimento e do nosso desejo de ensinar”, afirma Kelen

Nessa fase de pandemia, minha esperança é de que acabe e meus alunos continuem bem e com saúde. Para o futuro, espero um dia professor ser visto com a devida importância. Parece piegas, mas somos responsáveis por todas as outras profissões e somos vistos, muitas vezes, como inimigos”, finaliza Luciana.

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