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Comportamento

Na teoria o discurso é afiado e adolescente não tolera violência contra mulher

Alunos também opinam sobre o papel da escola na luta contra a violência

Thailla Torres | 11/12/2019 08:34
Redações revelam o que pensam adolescentes sobre violência contra mulher. (Foto: Kísie Ainoã)
Redações revelam o que pensam adolescentes sobre violência contra mulher. (Foto: Kísie Ainoã)

A violência contra a mulher ainda apresenta números significativos no Brasil. Mato Grosso do Sul é o 3º no ranking nacional de denúncias. Nos primeiros onze meses deste ano, 26 mulheres foram vítimas de feminicídio. E do outro lado, por sorte, os dados não estão só nas estatísticas. Permeiam também a cabeça de crianças e adolescentes que sabem que o problema hoje é uma luta de todos.

Pelo segundo ano, a Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul premiou, na semana passada, alunos de escola pública no concurso de redação promovido pela instituição com o tema “A sociedade não precisa ser assim! Quais os desafios que a Escola pode enfrentar para reduzir as diversas formas de violências contra as mulheres?”.

A surpresa foi receber mais de 900 redações com número significativo de alunos que compreendem os riscos da violência e que falam da importância da escola em promover a igualdade de gênero, que longe das polêmicas geradas quando se fala do assunto, tem como objetivo formar uma sociedade livre de ódio, violência e discriminação.

Defensora pública defende o tema dentro das escolas. (Foto: Marcos Maluf)
Defensora pública defende o tema dentro das escolas. (Foto: Marcos Maluf)

“A violência contra a mulher no Brasil é um problema que arrasta por muito tempo, devido ao fato da sociedade machista e patriarcal”, diz uma aluna de Aquidauana, do 9º ano Ensino Fundamental, em sua redação. Aos 14 anos, ela diz como é difícil dar um basta na situação por medo e cabe à sociedade o dever de denunciar qualquer agressão às mulheres. “Não podemos nos calar. A denúncia é um dos fatores que pode colaborar com a diminuição da violência”, sugere.

As palavras podem soar simples para quem escreve de maneira excessivamente formal, mas ganham peso extra quando surgem de adolescentes que provam a insatisfação com a violência tão presente. Meninos e meninas descrevem situações cotidianas que não só machucam, mas matam e continuam seu ciclo na roda da violência.

“A violência contra mulher pode ocorrer devido a criação, pois desde pequena somos ensinadas na base do machismo, com a consciência de que mulheres cuidam da casa, dos filhos, enquanto o homem pode sair com os amigos. O homem pode sair para beber, o homem pode sair e pegar várias, o homem pode trabalhar. Já a mulher, se sair com as amigas tem intenções erradas. Se a mulher pegar vários em uma noite é “puta”, se está usando roupa curta está pedindo para ser estuprada... A mulher tem muito motivo para andar sozinha na rua com medo”, descreve uma adolescente campo-grandense, também do Ensino Fundamental.

Contudo, segundo os adolescentes, não se pode esperar que se tenha mudanças imediatas sem um olhar sensível para violência. É um processo coletivo, com atividades que envolvem o diálogo e o espaço de fala que devem ser aplicadas dentro e fora da escola.

“Hoje, há providências em relação as consequências, mas o que está sendo feito na prevenção de certas realidades sociais absurdas? Por exemplo, ideias construídas, como as de que a mulher é “sexo frágil”, “foi feita para esquentar a barriga no fogão”, “não sabe dirigir”, “é inferior ao homem”, estão presentes no inconsciente coletivo. A escola deve ser atuante em descontruir tais falácias, capacitando o seu aluno, ensinando-o a equidade entre todos”, escreve um adolescente de Terenos.

Chega de machismo, pede aluna. (Foto: Thailla Torres)
Chega de machismo, pede aluna. (Foto: Thailla Torres)
Em violência contra mulher se deve meter a colher, diz outra aluna. (Foto: Thailla Torres)
Em violência contra mulher se deve meter a colher, diz outra aluna. (Foto: Thailla Torres)

Capaz de se manifestar de diferentes formas, a violência contra a mulher produz efeitos em diferentes cenários. Para além da vida da vítima, as consequências chegam a crianças e adolescentes que vivem em lares onde persiste esse tipo de situação, por isso, a escola tem um papel importante, explica a defensora pública Thais Dominato Silva Teixeira. “A gente acha que de fato a escola é a grande possibilidade de mudança. A escola amplia a leitura de mundo, por mais que exista uma lei, mas se não houver mudança cultural, mudança na educação, não adianta”, explica.

Thais observa que um dos problemas é a limitação para o diálogo entre esses jovens, enquanto o mundo lá fora cobra excessivamente a punição. “Todo mundo cobra muita punição. Pode punir mil vezes o agressor, mas, se não mudar o jeito de pensar, ele vai continuar a agredir e agir de forma machista. E a escola é uma das grandes colaboradoras para o exercício de cidadania, o respeito à diversidade de gênero, por isso, a gente acha importante falar sobre isso, sobre como a escola pode ajudar”.

O que surpreendeu a comissão organizada pelo Núcleo Institucional de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher (Nudem) e Núcleo Institucional de Promoção e Defesa dos Povos Indígenas e da Igualdade Racial e Étnica (Nupiir) foi a compreensão total do tema. “A maioria já entendeu que a violência contra mulher é um problema de todo mundo, não é algo mais individual. Eles entenderam que isso é um problema da sociedade, de interesse dos direitos humanos. Bacana também foi ter meninos entre os vencedores e perceber que eles têm repostas claras sobre como esse cenário pode melhorar”, destaca a defensora.

Na visão do aluno vencedor, “ao ser bem formado, o homem deixará de lado a violência dando lugar à promoção, à proteção e a provisão da mulher, dando a ela o melhor que quer para si mesmo. Um mundo melhor, com respeito à mulher, pede uma escola melhor”.

O concurso reuniu quase mil trabalhos de escolas públicas de todo o Estado.

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A escola deve ser atuante em descontruir tais falácias, capacitando o seu aluno, ensinando-o a equidade entre todos”, escreve um adolescente de Terenos. (Foto: Thailla Torres)
A escola deve ser atuante em descontruir tais falácias, capacitando o seu aluno, ensinando-o a equidade entre todos”, escreve um adolescente de Terenos. (Foto: Thailla Torres)
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