O que você faz com as sementes do Cerrado que encontra pelo caminho?
De idosos a crianças, oficina ensinou a reconhecer e coletar sementes para incentivar o plantio de árvores
O que você faz com as sementes do Cerrado que encontra pelo caminho? Ter um pé de frutas nativas do bioma sul-mato-grossense no quintal ou ipês para enfeitar a calçada é totalmente possível. Além disso, é uma excelente alternativa para preservar as espécies nativas e garantir que as árvores continuem ocupando espaços verdes em quintais, chácaras e praças.
De idosos a crianças, uma oficina realizada nessa quinta (23) e sexta-feira (24), em Campo Grande, ensinou os participantes a reconhecerem e coletarem sementes, incentivando o plantio de árvores e compartilhando conhecimentos sobre as espécies do Cerrado. Durante a atividade, os participantes aprenderam desde o preparo da semente para criar mudas até como identificar a saúde de uma árvore e seus benefícios, tanto ambientais quanto sociais.
Igor Rios, de 27 anos, foi o responsável pela oficina. Ele começou a pesquisar e estudar árvores nativas há 10 anos, influenciado por seu pai, que trabalha com produção de mudas em viveiros.
Para a atividade, Igor levou amostras de cascas, folhas e sementes de 30 espécies nativas de diferentes biomas brasileiros, como Cerrado, Pantanal, Mata Atlântica e Amazônia. Entre elas estavam castanha-sapucaia, pau-terra, ipês, ipê-verde, peroba-cebolinha, mogno-brasileiro, angelim-do-cerrado, o majestoso jequitibá, buriti, jacarandá e muitas outras.
Plantar uma árvore é mais simples do que parece, mas exige paciência, estudo e dedicação. O primeiro passo é respeitar a natureza, já que algumas sementes podem ser de árvores venenosas.
Também é importante ter cuidado ao colher as sementes, pois, em alguns casos, retirá-las diretamente da árvore pode causar danos ou resultar na coleta de sementes ainda imaturas, que não germinarão. Igor explica que é fundamental conhecer as características básicas da árvore e verificar se ela está na época de semeadura. Caso encontre uma semente no chão, o ideal é observar as árvores ao redor para identificar de onde ela veio.
Na hora de plantar, é preciso ter em mente que árvores do Cerrado precisam de menos água que plantas de biomas mais úmidos, por exemplo, e que elas precisam de terra para se desenvolver. Por esse motivo, utilizar apenas o esterco comprado no supermercado não basta. "É uma terra muito preta para o nosso bioma, então tem que misturar um terço da terra com a areia para essa semente germinar".
Na hora de enterrar a semente também é necessário prestar atenção ao tamanho dela, pois se enterrar em um buraco muito profundo, ela pode sufocar, mas se deixar muito rasa, pode ser levada pelo vento. O ideal é enterrar em uma profundidade equivalente ao tamanho da semente.
Na fase de germinar, Igor destaca que é necessário molhar todo dia, mas quando a muda começar a brotar, o consumo de água deve ser reduzido e a muda deve ser mantida em um espaço em que possa tomar bastante luz do sol.
É bom ter em mente também que algumas sementes não desenvolvem um embrião, outras acabam pegando uma traça no caminho, e algumas vão brotar melhor que outras, por isso, se não der certo algumas vezes, não precisa desistir.
"A natureza tem esse processo de dificuldade natural, mas quando a gente começa a plantar, a gente começa a perceber porque que certa espécie perde mais e outra menos e você vai melhorando sua relação com aquela espécie. Você começa a desenvolver um relacionamento com a árvore, porque você começa a entender o que ela precisa", expressa Igor.
Durante a oficina, ministrada nesta sexta-feira (24), as crianças tiveram a oportunidade de tocar, sentir as texturas e aprender a manusear as sementes. Igor também compartilhou conhecimento sobre as diversas espécies existentes no Pantanal, Cerrado e Mata Atlântica.
A dinâmica contou com uma breve introdução ao público a respeito das sementes, das árvores e da função de cada uma delas, com discurso voltado ao incentivo da preservação do bioma e a importância do plantio de árvores.
Após aprender um pouco mais sobre elas, as crianças tiveram a oportunidade de plantar as sementes e criar suas próprias mudas, que puderam ser levadas para casa no final da atividade.
Ao Lado B, Igor compartilhou que uma pesquisa recente, realizada em 2024 pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), sobre a restauração do Cerrado, foi descoberto que, das 700 espécies nativas do bioma, metade não estão sendo cultivadas em áreas de replantio, e boa parte das que estavam presentes no campo de replantio, não eram nativas, o que ascende um alerta ara a valorização e preservação do bioma.
Para ele, isso acontece porque o clima do Cerrado é bastante árido, sem abundância de água, como acontece, por exemplo, na Mata Atlântica e na Amazônia, por isso, por aqui as árvores demoram mais tempo para crescer. Logo, "a gente não tem a relação com o cerrado. Ninguém conhece, ninguém valoriza", diz.
"A gente não tem esse conhecimento popular para criar uma cultura de valorizar as árvores. Não tem mercado nem incentivo público para isso. [As árvores] são um patrimônio brasileiro, várias coisas aqui só tem no Brasil, e você não vai conseguir plantar em outros lugares, então eu considero esse um trabalho muito necessário".
A atividade fez parte do cronograma cultural do projeto Arte nas Estações, que trouxe para Campo Grande um circuito de exposições, acompanhada de uma série de atividades gratuitas voltadas à população, incluindo palestras e oficinas.
A oficina encerrou a terceira e última mostra do circuito, 'A Ferro e Fogo', que reflete as contradições entre o indivíduo e o coletivo, assim como a relação entre a cultura e a destruição da natureza.
O curador da exposição Ulisses Carrilho destaca que as obras também remetem às queimadas no Pantanal, trazendo à tona a urgência de debates sobre a ecologia e a preservação ambiente.
A exposição ficará aberta para a visitação até o dia 19 de fevereiro, no Centro Cultural José Octávio Guizzo. A entrada é gratuita.
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