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Comportamento

Saeed vive 2 aniversários desde que fugiu da guerra e provou liberdade

Saeed Abadi Ghadim é iraniano e veio para o Brasil à procura de viver livre de perseguição religiosa

Bárbara Cavalcanti | 10/08/2021 07:20
Saeed no Irã, pouco antes de vir para o Brasil. (Foto: Arquivo Pessoal)
Saeed no Irã, pouco antes de vir para o Brasil. (Foto: Arquivo Pessoal)

“Cheguei no Brasil em 13 de outubro de 1986. Essa data pra mim é mais importante que meu próprio aniversário, pois foi quando eu comecei a viver”.

A declaração é do agrônomo Saeed Abadi Ghadim, de 57 anos. Iraniano de nascimento, Saeed fugiu do país ainda adolescente, em busca de viver livre de perseguição religiosa. Ele pertence ao grupo religioso Baha’i, que no Irã, é uma minoria religiosa perseguida pelo governo. Por aqui, ele não gosta muito de falar dos conflitos, mas abre o coração para falar com amor de sua religião e costumes, que ainda geram muita curiosidade em quem não o conhece.

Saeed, nascido na capital iraniana Teerã, relata que cresceu em uma família Baha’i e lembra de episódios de perseguição religiosa no dia a dia, vivido por amigos e familiares. Com a região ainda marcada por constantes conflitos armados, Saeed resolveu deixar o Irã e começar uma nova vida no Brasil.

“No Irã, quem é da religião Baha’i é impedido de estudar, de trabalhar, de tirar documentos. Teve uma ocasião em que entregaram um formulário para meu pai preencher, e nele assinalou a opção Baha’i na questão sobre religião. Chegaram nele e falaram que se ele não trocasse para outra opção, ele ficaria sem o salário. Também já vi um amigo que foi tentar renovar documentos na embaixada, mas que por causa da religião, teve todos seus documentos confiscados. Já vi também relatos de pessoas que foram até fuziladas”, detalhou.

Saeed de vermelho à direita com alguns familiares no Irã. (Foto: Arquivo Pessoal)
Saeed de vermelho à direita com alguns familiares no Irã. (Foto: Arquivo Pessoal)

Saeed chegou ao Brasil com 18 anos, sem falar a língua e com ajuda financeira por apenas um mês. Apesar de hoje falar e entender o português fluentemente, o sotaque carregado entrega que não é sua língua nativa. Não gosta de falar da guerra, fica incomodado e pede logo para trocar de assunto. “Não é um assunto que eu gosto de lembrar”, comentou.

Os primeiros conflitos armados no Oriente Médio, na região do Irã, começaram na década de 70. Nessa ocasião, Saeed tinha apenas 11 anos de idade, mas não comenta muito sobre a experiência. Desde então, a religião Baha’i  não é reconhecida como legítima pelo governo, que persegue os fiéis até hoje.

Ele explica que a partida dele do Irã foi com a ajuda da própria organização Baha’i. “Na ocasião, nos deram a opção de escolher entre alguns países. Entre Estados Unidos, Alemanha e Brasil, escolhi o Brasil”, detalhou. Desembarcou primeiro em São Paulo e depois veio para Campo Grande.

Saeed conversando com o Lado B sobre sua história. (Foto: Thiago Mendes)
Saeed conversando com o Lado B sobre sua história. (Foto: Thiago Mendes)

O choque cultural foi grande. “Brasil e Irã são como água e vinho”, ri. “Nas ruas, as mulheres andavam de biquíni. Nunca que isso aconteceria no Irã”, ainda acrescenta entre risadas. Porém, ao ser questionado em qual idioma prefere conversar, é firme com a resposta.

”É a mesma coisa que pedir para um pai escolher entre os filhos qual ele ama menos e pode deixar matar. Ou qual dedos das mãos pode arrancar, já que a gente não usa todos. O Irã é minha pátria, mas foi no Brasil que consegui liberdade de viver, de expressar minha religião e trabalhar. Converso tanto em persa, quanto em português tranquilamente”, reforça.

Saeed demonstra forte fé em suas crenças. A fé Baha’i é baseada nos escritos de Bahá’u’lláh, considerado um dos educadores divinos enviados para estabelecerem as bases para o desenvolvimento humano, como Abraão, Buda, ou Muhammad.

Nos escritos de Bahá’ullah, Saeed ainda detalha que existem orações que são feitas pedindo bênçãos para a família, para o casamento ou para a paz. Hoje, os encontros Baha’i acontecem online e os livros sagrados podem ser acessados até por aplicativo. Durante a entrevista, Saeed leu um trecho em persa.

Trecho de oração de escritos sagrados do Baha'i em persa. (Foto: Thiago Mendes)
Trecho de oração de escritos sagrados do Baha'i em persa. (Foto: Thiago Mendes)

De acordo com Saeed, aqui em Campo Grande, existem aproximadamente 100 adeptos ao Baha’i, entre outros estrangeiros e brasileiros. Existe um templo Baha’i em cada continente, e o da América do Sul é localizado no Chile.

“Eu gosto muito do Irã e sinto muita falta da minha família, da comida e da cultura. Mas sou muito feliz de poder ter a liberdade de estudar, trabalhar e exercer minha fé em um país em que minha religião é reconhecida”, comentou.

Saeed em visita ao templo Baha'i no Chile. (Foto: Arquivo Pessoal)
Saeed em visita ao templo Baha'i no Chile. (Foto: Arquivo Pessoal)

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