A praça fechou, mas o jogo continua firme entre velhos amigos
Bem longe do vai e vem das pessoas, aposentados que transformaram a Praça Ary Coelho em ponto de encontro e de jogo agora experimentam um ambiente muito mais sossegado.
Como a praça fechou para reforma, o grupo teve de encontrar outro espaço para o dominó e para as partidas de canastra e hoje passa as manhãs e tardes sob as árvores do Horto Florestal de Campo Grande.
“Nossa, aqui é uma tranquilidade só”, comenta Sinvano Patzloff, de 70 anos. Com o sotaque gaúcho e a carteira do Internacional no bolso, ele é o que mais conversa. “A Ary Coelho é onde a gente se encontrou, sempre foi o nosso lugar, mas aqui também é bom, o que atrapalha é a mesa baixa e o banco duro”, reclama.
A rotina nunca mudou, apesar de ficarem desalojados. “No outro dia a gente já estava aqui”, conta Joaquim Rodrigues, de 71 anos.
Envolvidos na partida de canastra, os 4 amigos dizem que só voltam para casa antes das 20 horas se chover.
Como a maioria, Joaquim anda de ônibus. Sai do bairro Tiradentes, do outro lado da cidade, para encontrar os velhos amigos de praça todos os dias, com exceção de segunda-feira, quando o Horto fica fechado para manutenção.
“Não tenho como andar de carro. O cara fica velho e perde a carteira de motorista. Mas não tem problema não”, diz o aposentado.
Hermann Reichangt diz aparecer de vez enquanto, “porque ainda trabalho”. O vendedor lembra que é “assim que começa” e que passou a jogar na praça “desde que fiquei velho”.
Nas duas mesas de cartas postas, a conversa é sempre alinhavada por risadas e histórias de “velho”, como eles mesmos dizem.
O mesmo tom tem o bate-papo da turma do dominó, a diversão em duas outras mesas de concreto do Horto Florestal.
As partidas curtas têm como marcadores moedas antigas, de 10 ou 20 centavos, da época em que o dinheiro ainda se chamava “cruzado”.
De mochila nas costas, Ugo Carvalho, de 72 anos, explica que sai pela manhã do bairro São Jorge da Lagoa e dois ônibus depois chega “contente” ao Horto Florestal. Tem dias que até almoça por ali mesmo, a marmita doada por um dos funcionários.
“Gosto mais daqui, não tem aqueles maconheiros que ficam fumando do nosso lado lá na Ary Coelho, mas o banco é muito pequeno”, lembra o aposentado bem gordinho, mostrando um circulo cortado na madeira que ele leva todos os dias ao Horto para ter o mínimo de conforto.
“Bil”, como Ugo é chamado pelos amigos, é um dos mais antigos no grupo, mas garante que “não o mais velho”. “Olha só, quando eu comecei a frequentar a praça, já tinha uns 100 por lá”.
Sobre a expectativa de receber uma Ary Coelho novinha em folha, depois da revitalização, os amigos pedem pouco. “A gente só quer uma mesinha boa de jogo e um banco maior”, diz Bil.