Produtoras criam grupo para mostrar força e o poder da mulher do campo
Com mais de 20 anos, grupo feminino tomou frente da produção orgânica de assentamento e agora participam de feiras do MST pelo Estado e pelo Brasil
O ano era 1995. A data não poderia ser mais propícia, 8 de março, Dia Internacional da Mulher. Foi aí que as líderes do acampamento Andalúcia resolveram formar o Grupo de Mulheres Raízes do Cerrado. Neste mesmo dia, foram conhecer a sede da fazenda que viria a se tornar um tempo depois o assentamento Andalúcia, localizado a 50km de Nioaque, distante 199km de Campo Grande.
De lá pra cá, elas se juntaram, cresceram e, desde o ano passado, quando conseguiram um espaço para fazer sua horta, estão produzindo alimentos e participando de feiras orgânicas pelo Estado e pelo Brasil, já foram vender até em São Paulo no encontro nacional do MST. Ontem estiveram aqui em Campo Grande, onde participaram da 2ª Mostra da Cultura Camponesa, que aconteceu no Taquarussu.
Para conquistar tudo que estão colhendo agora não foi fácil. Passaram por muitos perrengues até conseguir suas terras. Segundo a coordenadora do grupo, Vera Luisa Dias, quando foram até a sede da fazenda que hoje é o assentamento, foram todos recebidos a tiros pelo proprietário, que estava só.
“Estávamos em cerca de 150 pessoas, entre homens e mulheres, todo mundo do acampamento. Ouvimos os tiros e paramos, mas decidimos não recuar e fomos em frente, só estávamos indo conhecer naquela vez. Chegou o capataz da fazenda e foi falar com ele, como um intermediário. Ele o achou muito machucado, um tiro havia estourado em sua mão”, lembra Vera.
Depois disso, o proprietário da fazenda, que era espanhol, voltou ao seu país e nunca mais retornou ao Brasil, sendo que os produtores só tem contato com o seu representante que vive na sede da fazenda.
Quando finalmente conseguiram o assentamento, há cerca de 20 anos, o grupo já estava bem fortalecido. “Nos reuníamos, principalmente, para estudar, quase sempre política. Também estudávamos história, além de discussões acerca do papel da mulher no campo e sociedade, e da violência que sofremos. Assim ficamos mais preparadas para ir atrás das coisas”, conta. “Também tinha os momentos de descontração feminina, onde nos emperequetávamos todas, somos mulheres, queríamos mostrar nossa beleza”, completa Vera.
A produção, tanto orgânica, quanto de outros meios de geração de renda, como o artesanato, não era tão trabalhada no início do grupo por conta da falta de apoio. Mas, desde dezembro do ano passado, quando conseguiram um terreno numa escola inativa em Nioaque, estão cultivando uma horta.
No entanto, não tem sido fácil. “Era uma quadra de vôlei de areia, já conseguimos plantar bastante coisa lá. Nossa horta já tem bananeiras, feijão, hortaliças, entre algumas outras coisas. Trouxemos tudo para comercializar aqui hoje. Mas, até hoje, ainda estamos em fase de recuperação do solo”, detalha Eva Antunes Birnfeld, vice coordenadora do grupo.
Além disso, elas são desacreditadas dentro até do próprio assentamento. “Acharam que nossa horta, nossos produtos não iam dar em nada, ainda acham que não somos capazes de produzir”, declara Eva.
Com as feiras elas estão mostrando o contrário, que assim como na cidade a mulher do campo também tem seu espaço. “Tudo o que fazemos lá é orgânico, é muito significante para nós. Estamos enxergando aquilo que sonhávamos desde o início da ocupação, é a realização”, conclui emocionada a vice coordenadora.
No primeiro sábado de cada mês, acontece uma feira de orgânicos junto com shows musicais na praça dos Heróis em Nioaque, das 16h às 23h. O Grupo de Mulheres Raízes do Cerrado voltam a Campo Grande com seus produtos na 1ª Feira da Reforma Agrária do MST/MS, nos dias 24, 25 e 26. O evento está previsto para acontecer na praça Ary Coelho.