Cansada de reclamar do Carnaval, família põe som mais alto que bloco
Som dos alto-falantes é ensurdecedor, mas para moradores de casa histórica é só um barulho a mais para lidar

No coração do Carnaval de Rua de Campo Grande, a casa com cerca de madeira da Rua Dr. Temistocles ganha voz, canta e grita. Uma caixa de som gigante, instalada na parte da frente, embala os foliões com os hits do passado e presente. O que eles não fazem ideia é que no endereço, há uma família de cinco pessoas e que a anfitriã, Eunice Nunes França, está cansada de ter que trabalhar na data para tentar preservar a moradia.
Em 30 minutos de observação o cenário se compõe e a música nunca para. O som que sai dos alto-falantes é ensurdecedor, mas para eles é só um barulho a mais para lidar nos cinco dias de Carnaval na Esplanada Ferroviária.
A família montou um bar na frente do portão para mostrar que o imóvel não é espaço público, tampouco banheiro ao ar livre. Como consequência, os atrativos para que os foliões entendam isso prejudica também quem mora no local.
Falando nisso, Eunice reside ali há 27 anos e se vê obrigada a continuar com o serviço, que no começo, até poderia ser bom - já que gera lucro - mas que com o passar do tempo virou um problema também.
No último dia de folia, a movimentação começa pouco antes das 18h. Meia hora depois, ela se convence em deixar a reportagem entrar para observar o que ela vê durante anos nesse período. É difícil de compreender o que a proprietária diz. O som chega a fazer estalo no ouvido. Para conseguir escutar é preciso correr para uma das partes laterais da estrutura antiga.
“Minha família é de ferroviários. Ninguém mais que eu e os vizinhos lutam para preservar o local. Me vi obrigada a trabalhar e lucrar um pouco pelo menos, pra não ter que abandonar minha casa na época porque no outro que teve ela foi depredada. Quando era só o bloco eu assistia, mas quando virou muvuca mesmo perdi a paz”.
Ela conta que a idade está cobrado um preço alto e que não tem mais condições de continuar. Embora familiares também façam parte do negócio é ela quem gere tudo. As coisas na parte de fora mostram que a família faz o que pode.
Com uma panela de alumínio eles pegam gelo. Maneira simples e criativa de se virar. A caixa de sapato velha vira um "cofrinho" para guardar as notas de dinheiro que chegam. No furo no meio é onde as cédulas são depositadas. Claro, também há máquinas de cartão.
No banco cedido por Eunice é possível ver as pessoas se aglomerarem. Não é o dia mais lotado na Esplanada. Do lado direito, há um fluxo infinito de quem transita pela Avenida Calógeras em direção ao palco do Cordão Valu ou vice versa.
Em 10 minutos o cenário na frente da casa muda. As pessoas vão perdendo o espaço. O número de pedidos de bebidas é intenso e o som continua estralando. Uma dos familiares senta na varanda e não se importa com o volume, mexe no celular normalmente.
Às 18h53 os foliões continuam a chegar e a dança começa a ganhar ritmo. Com copos na mão, eles se unem em roda e riem. Os muros da casa tem caixas térmicas pequenas para gelo e seis caixas grandes para as bebidas. Eunice fica na parte de fora.
O marido dela assiste a multidão da varanda e explica que não consegue dormir há dias, que é caminhoneiro e sempre vive o transtorno. Quando questiono em relação ao volume do som ele explica que se eles [os foliões] querem festa e barulho que assim seja.
Na parte de trás da casa a carroceria de uma Saveiro está cheia de lata de cerveja e refrigerantes. Quando o relógio marca 19h02 deixamos o local, mas o som, assim como o incômodo, fica.
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