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Meio Ambiente

Banhados desprotegidos são alerta de que Rio Perdido pode desaparecer

Patrimônio aquático de Bonito e da Serra da Bodoquena foi discutido em debate convocado pela OAB. Brejões abastecem rios da região

Izabela Sanchez | 07/05/2019 12:58
Rio Perdido serpenteia suas águas no Parque Nacional da Serra da Bodoquena, em Bonito (Foto: Divulgação/IHP)
Rio Perdido serpenteia suas águas no Parque Nacional da Serra da Bodoquena, em Bonito (Foto: Divulgação/IHP)

São focos úmidos que se espalham por toda a região da Serra da Bodoquena. Enchem-se de água, proliferam a biodiversidade e mantém vivos cursos d’água como o Rio da Prata e o Formoso. São os brejões ou banhados, que não têm, apesar da importância, proteção específica. O turvamento das águas cristalinas – principal atrativo turístico da região – provocou muita discussão, culminou em decreto estadual, mas ainda assim, a ameaça continua bem próxima nas águas de Bonito.

A situação no município a 257 km de Campo Grande e região foi novamente abordada em debate convocado pela OAB-MS (Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Mato Grosso do Sul). A discussão ocorreu ontem à noite, uniu promotores, empresários do turismo, produtores rurais, poder público e ambientalistas e mostrou que a proteção ambiental da Serra da Bodoquena ainda é horizonte a ser perseguido.

Advogada e integrante do Condema (Conselho Muncipal de Meio Ambiente de Bonito), Marla Diniz Brandão Dias acompanhou o debate e já havia alertado para legislação municipal que, se alterada, poderia configurar “ainda mais retrocesso”. Depois do alerta, projeto do executivo municipal que buscava revogar o Programa de Conservação de Solo e Água de 2015 foi deixado de lado.

Imagem mostra situação dos banhados do Rio Perdido nas propriedades de Bonito (Foto: Divulgação/IHP)
Imagem mostra situação dos banhados do Rio Perdido nas propriedades de Bonito (Foto: Divulgação/IHP)

Agora, afirma, a preocupação se volta para os banhados. Conforme relatou, a falta de fiscalização ambiental também foi destacada. Estradas vicinais e atividades rurais foram apontadas pelo promotor Luciano Loubet como as principais causadoras do turvamento das águas.

“Houve uma exposição das leis que existem, os promotores disseram que a grande dificuldade é fiscalizar. O estado que disponibiliza recursos para PMA [Polícia Militar Ambiental] e Imasul [Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Su], que está com trabalhos atrasados com relação aos brejões. Ficou muito claro que se não conter os drenos no brejão o rio da Prata vai acabar. Estamos aguardando uma posição do Imasul sobre os brejões, ele precisa se posicionar”, declarou.

Segundo a advogada, uma das hipóteses levantadas foi a reserva de parte dos vouchers dos passeios turísticos para proteção ambiental.

Um Rio que pode ser “perdido” – Perdido é o nome, mas também a ameaça do futuro de uma das belezas aquáticas da região de Bonito. O curso d’água que brota e depois “desaparece” é ainda pouco explorado pelo turismo, mas a supressão de APPs (Áreas de Preservação Permanente) em propriedades rurais que abrigam sua nascente e os drenos nos banhados já colocam o Perdido em risco.

Fiscalização do Instituto do Homem Pantaneiro no dia 11 de abril no banhado e nascente do Rio Perdido “constatou anormalidades”. Documento do Instituto indica irregularidades nas Fazendas Baia das Garças e Princezinha, com uso de drenos e retirada de vegetação da área de preservação.

Mapa do Rio Perdido dentro das fazendas (Foto: Reprodução)
Mapa do Rio Perdido dentro das fazendas (Foto: Reprodução)

“As iniciativas são tímidas diante do desafio e da oportunidade. Esse talvez seja o ponto mais crítico, você tem uma ineficácia com relação aos banhados. As águas nascem em uma região de brejão e pela inexistência de uma política local ela fragiliza e coloca em risco esses rios, é necessário uma decisão política do estado. São lugares extremamente importantes, o proprietário se tem restrição [da produção] deve ser compensado. O Rio Perdido ainda nem é explorado e tem um potencial imensurável dentro do Parque da Bodoquena”, comentou o presidente do Instituto, Angelo Rabelo.

Rabelo defende que se crie proteção específica para os banhados, além de micro zoneamentos. “O ponto principal [da discussão] foi a inexistência de um zoneamento que coloque restrições das atividades, hoje não existe, você tem um macrozoneamento, mas como Bonito. A região da Serra de Bodoquena não é só Bonito, é Jardim, Nioaque, e outros lugares que já tem atividades de turismo em plena expansão. É necessário que exista um pacto dos diferentes interesses”, pontuou.

Decreto editado pelo governo do estado estabelece uma rotina de apresentação e de aprovação do projeto técnico de manejo e de conservação de solo e água em propriedades rurais. O projeto visa a obtenção de declaração ambiental que ateste a conformidade para a realização de trabalhos de mecanização de solos (aração, gradagem, subsolagem) com vistas à renovação ou à recuperação de pastagens e à implantação de lavouras permanentes ou temporárias e de outras atividades de movimentação de solo na bacia de contribuição dos rios Formoso e da Prata.

Conforme a Semagro (Secretaria de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar), o objetivo é preservar a integridade dos recursos hídricos naquela região (principalmente os banhados e nascentes), reduzir o impacto do acarreamento de sedimentos aos rios e córregos, principalmente no período de chuvas, e evitar maiores prejuízos ao meio ambiente e atividades econômicas.

Corredeiras do Perdido em Bonito (Foto: Divulgação/IHP)
Corredeiras do Perdido em Bonito (Foto: Divulgação/IHP)
Rio Perdido exibe assoreamento (Foto: Divulgação/IHP)
Rio Perdido exibe assoreamento (Foto: Divulgação/IHP)

O presidente do Instituto acredita que o decreto “trate de novos casos”, mas que deixa para trás um imenso passivo. “Precisa ser resolvido e isso só vai acontecer com trabalho forte de micro bacias e efetivamente o trabalho permanente de manutenção de estradas vicinais”, comentou.

“No caso da propriedade, ela tem que ser beneficiada com mecanismos. Eu voei pessoalmente [sobre o Rio Perdido] e é impressionante, ele nasce na propriedade com atividade em plena expansão e se esconde dentro do Parque. Se decisões políticas não forem tomadas para proteger os interesses, corre o risco da gente guardar a fotografia”, disse, uma alusão ao desaparecimento do rio.

Sobre o Rio da Prata, Rabelo afirma que falta definição sobre os drenos que ameaçam os banhados. “O da Prata o mais grave é a questão dos banhados que vem sendo sacrificados, o estado não definiu uma norma que restrinja a questão dos drenos que são responsáveis pela redução dos banhados”, disse.

Exemplo do Taquari – Rabelo lembra que os rios de Bonito podem terminar da mesma forma que o Taquari, entupido e com sedimentação. Um processo que teve início com a rápida e desordenada expansão agrícola no Norte do Estado, na década de 1970.

Rio Perdido dentro do Parque Nacional da Serra da Bodoquena (Foto: Divulgação/IHP)
Rio Perdido dentro do Parque Nacional da Serra da Bodoquena (Foto: Divulgação/IHP)

“Enquanto os banhados não forem considerados uma área protegida, foram drenados, você tem um cenário preocupante que pode, em 10 anos, trazer uma irreversão de um processo que o Taquari é o melhor exemplo”, disse.

Dividir a responsabilidade – Vice-presidente da OAB-MS, Gervásio Alves de Oliveira Junior defende que além de conciliar interesses, resolver a questão implica dividir as responsabilidades para que o prejuízo – pela redução de atividades do agronegócio, por exemplo – não fique apenas para os proprietários rurais.

“O grande conflito é de ordem econômica, quem é proprietário quer resultados, quem não é acha que não pode ser explorado por questões fundamentais ambientais. Para a preservação se pretende que a responsabilidade, o prejuízo, seja exclusivo do proprietário. Essas reuniões servem para estabelecer que a responsabilidade seja de todos. Precisa de comprometimento, precisa que o proprietário rural tenha um comprometimento da utilização mais racional de acordo com as características regionais, mas que todos participem dos custos dessa manutenção”, declarou.

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