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Meio Ambiente

Capital já não é campeã em verde e precisa de mais 250 mil árvores nas calçadas

Mapa da arborização é liderado pela Vila Nasser, enquanto Jardim Paulista fica na “lanterna”

Por Aline dos Santos | 18/09/2024 14:10
Vila Nasser lidera no quesito arborização entre os bairros da Capital. (Foto: Marcos Maluf)
Vila Nasser lidera no quesito arborização entre os bairros da Capital. (Foto: Marcos Maluf)

O verde até aumentou pelas ruas de Campo Grande, onde a arborização nas calçadas cresceu 14% no comparativo entre 2010 e 2024, mas a cidade precisa de mais 250 mil árvores. A exigência é determinação da legislação municipal.

Apesar de a Capital ser famosa pelo verde, inclusive na lista de ‘Cidade Árvore do Mundo’, é notório que elas desaparecem da paisagem em muito bairros, situação bem perceptível para quem caminha na rua e não consegue achar uma sombra para se refugiar do Sol forte.

“A necessidade de plantio é de 250 mil árvores de acompanhamento viário. Só para atender a legislação de Campo Grande. São 111 indivíduos por quilômetro", afirma Eliane Guaraldo, professora da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) e coordenadora do estudo “Floresta Urbana de Campo Grande”, que vai subsidiar a revisão e monitoramento do Plano Diretor de Arborização Urbana.

Publicada em 9 de dezembro de 1983 pelo prefeito Lúdio Martins Coelho, a Lei nº2.178 previa o plantio de uma árvore a cada 10 metros, em frente a imóvel residencial. Já em 2011, a Lei Complementar nº184, de 23 de setembro, reduziu a metragem: o proprietário do imóvel urbano deve plantar uma árvore a cada nove metros de testada.

Com estimativa de 175 mil árvores pelas ruas, o reforço de 250 mil é para que a cidade cumpra a regra do 3: pelo menos três árvores devem ser vistas da janela da sua casa. O conceito todo é o 3/30/300, números simples, capazes de ser facilmente gravados na memória, principalmente dos gestores públicos.

Desta forma, cada bairro deve ter no mínimo 30% de cobertura vegetal arbórea e nenhum indivíduo deveria caminhar mais de 300 metros para encontrar a área verde pública mais próxima (praças e parques).

Eliane Guaraldo é professora da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. (Foto: Marcos Maluf)
Eliane Guaraldo é professora da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. (Foto: Marcos Maluf)

Essa regra tem norteado as políticas de arborização urbana. Mas é muito difícil chegar a essas metas. Nós mesmos, que somos uma cidade muito arborizada, uma das mais arborizadas do Brasil, não conseguimos cumprir. Nenhuma região cumpre como média. Alguns bairros cumprem os 30%. O nosso trabalho foi traçar estratégias buscando o cumprimento dessa meta”.

 Bairros opostos no mapa da arborização 

No mapa da arborização, a Vila Nasser é o destaque positivo pela quantidade de árvores nas calçadas, enquanto o Jardim Paulista fica na “lanterna”. Na manhã desta quarta-feira (18), o vento fresco e o céu nublado garantiam uma caminhada tranquila pela Rua Montes Claros, Vila Nasser. Mas, quando o Sol inclemente voltar, situação cada vez mais comum nas ondas de calor, Ângela Jard Conceição, de 44 anos, aconselha: é só caminhar pela sombra das árvores.

 “Eu fico pensando nessas queimadas. A gente depende do vento da árvore, o ar que a gente respira”, afirma Ângela, que mora no bairro há 34 anos. O avanço das construções reduziu o verde, mas as pessoas têm retomado o plantio. “As pessoas plantam bastante árvores. Tem as praças arborizadas também”, conta a moradora, que levava o neto de nove meses no carrinho, numa caminhada ao som do canto dos pássaros.

Adriana Bilo, 51 anos, mora na Nasser há quase duas décadas e destaca o esforço da vizinhança para a manutenção de áreas verdes. “Tem um lugar que as árvores foram replantadas, um terreno baldio. Mas não foi pela prefeitura, foram os próprios moradores que se organizaram e replantaram. Tem árvores, flores. O pessoal da Coophasul se juntou com o pessoal da Nasser”.

A frondosa árvore em frente de casa acompanha a vida de Jeferson. (Foto: Marcos Maluf)
A frondosa árvore em frente de casa acompanha a vida de Jeferson. (Foto: Marcos Maluf)

A frondosa árvore em frente de casa acompanha a vida de Jeferson Ornelas Viana, de 42 anos. Ele calcula que ela já tenha meio século. “Quando vim para cá, ela era pequenininha, deve ter mais de 50 anos. Eu era criança”, rememora.

Na manhã de hoje, ele varria a calçada, antes tomada pelo amarelo da folhagem. A árvore é garantia de sombra para os momentos de lazer, como o bate papo na calçada ou prender a rede de descanso. Ele conta que a árvore não lhe traz nenhum problema. “É a natureza, eu gosto. Sempre tenho uma sombrinha”, diz o morador. Do outro lado da rua, vê as árvores que foram plantadas por seu pai.

Já no Jardim Paulista, a paisagem mostra que as árvores não têm tido vida fácil. Há muitas podas radicais, que restam só os troncos, e algumas tentativas de aumentar o efetivo verde: pequenas mudas presas a estacas brancas.

Troncos de árvores com poda radical no Jardim Paulista. (Foto: Marcos Maluf)
Troncos de árvores com poda radical no Jardim Paulista. (Foto: Marcos Maluf)

Numa região essencialmente comercial, os galpões, garagens, oficinas e ferro-velho espalham odor forte pelo ar, misto de combustível e óleo. Ali a vida também passa apressada. Como a dos trabalhadores que vêm por caminho sem árvores desde a Avenida Costa e Silva e correm para bater o ponto no horário.

 A constatação é que as árvores rivalizam com os carros nas calçadas, apesar da modalidade de estacionamento ser irregular. Também há quem se preocupe se as mudas recém-chegadas vão ficar muito grandes ou deixar a rua suja.

“Infelizmente, a falta de consciência é muito grande", diz Sudária. (Foto: Marcos Maluf)
“Infelizmente, a falta de consciência é muito grande", diz Sudária. (Foto: Marcos Maluf)

 “Aqui, cortam tudo as árvores”, diz a moradora Sudária Saravi, 58 anos. Mas ela vai na contramão, tem árvores e flores em casa e acaba de fazer o plantio de três mudas de ipê branco. “Infelizmente, a falta de consciência é muito grande. Olha a situação que estamos vivendo agora, mas só vão entender quando não tiver água para beber e sombra para ficar”.

 Estresse da vida urbana

Exemplo do colo de árvore todo cercado por concreto em Campo Grande. (Foto: Reprodução)
Exemplo do colo de árvore todo cercado por concreto em Campo Grande. (Foto: Reprodução)

A rotina da vida urbana também impacta a vegetação. Árvore de cidade convive com plantio que sufoca as raízes, conflito com a fiação, podas que acabam com a saúde e a falta de água necessária para a hidratação.

“Tem muito conflito acontecendo. Conflito aéreo com rede, conflito no solo com área pavimentada. Geralmente, as pessoas pavimentam o colo das árvores e, como uma reação, ela vai tentar se ancorar corretamente. As raízes começam a quebrar os pisos. Então, o plano pede que a gente respeite uma coisa chamada espaço árvore”, diz a professora.


O termo define uma zona exclusiva para a expansão das raízes. A sugestão é que a área tenha um metro quadrado. “O espaço dela precisa ser exclusivo, sob pena de não se desenvolver bem e colocar em risco a segurança do morador, da propriedade, do veículo que está transitando na rua. Ela se torna uma árvore de risco”, afirma Eliane.

Outro fator que ameaça a árvore urbana é a poda sem conhecimento técnico, que pode transformar uma árvore boa e saudável em uma árvore de risco. É necessário considerar o equilíbrio mecânico da árvore.

“Por exemplo, onde há fiação, poda ali onde estão os fios e a árvore fica em desequilíbrio.  Começa formar reação na raiz para poder compensar esse desequilíbrio, por isso vai se tornando uma árvore de risco”.

Mudas de plantas sinalizadas por estacas no Jardim Paulista. (Foto: Marcos Maluf)
Mudas de plantas sinalizadas por estacas no Jardim Paulista. (Foto: Marcos Maluf)

As agressões também expõem a árvore ao ataque de patógenos: cupins, colônias de formigas, fungos apodrecedores. “Ela já está sob estresse: solo sem espaço para as raízes, conflito com a rede elétrica, poluição do ar, não tem a quantidade de água necessária para garantir a hidratação. Vive sob condições extremas. A vitalidade dela é comprometida. A gente depende da qualidade de vida da árvore para a nossa qualidade de vida”.

O estudo da UFMS vai subsidiar a revisão da Lei 184/2011, que instituiu o Plano Diretor de Arborização Urbana. O tema está em discussão no Comea (Comitê de Meio Ambiente). Após a manifestação, será enviado para apreciação do CMMA (Conselho Municipal de Meio Ambiente).

Por fim, após respeitado todo o procedimento legal e ouvidos todos os entes pertinentes, o Poder Executivo enviará o projeto de lei para a Câmara Municipal.

 O levantamento foi feito pela seguinte equipe: Eliane Guaraldo (coordenadora), Camila Aoki, Leandro Sauer, Arnildo Pott, Adriana Takahasi, Bruna Fina, Flávio Macedo Alves, Helen Rezende e mestrandos e alunos de graduação de Arquitetura, Paisagismo, Botânica, Engenharia Ambiental e Geografia.

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