Zoológico para quê? Na Capital Morena, os bichos andam soltos
Eles são animais silvestres vivendo em áreas urbanas que, sem escolha, passaram a conviver e dividir espaço com o homem
Sim, em Campo Grande, jacarés "passeiam pelas ruas" e não se intimidam com as pessoas ao redor e muito menos com o movimentado trânsito da cidade. Há também capivaras que atravessam na faixa de pedestre, quatis, cutias, araras para todo lado, macacos-prego, saguis, bugios, várias espécies de pássaros e animais silvestres, encantadores, em meio a uma cidade de 830 mil habitantes. Morar na Capital Morena, que completa neste mês 115 anos, é, também, correr o agradável risco de se encontrar com um bicho a caminho do trabalho.
Há quem diga que a Capital nem precisa ter zoológico, pois basta ir aos parques e lagos para observar os animais de perto, e o que é melhor, soltos na natureza, andando livremente de um lado para outro. Eles são animais silvestres vivendo em áreas urbanas que, sem escolha, passaram a conviver e dividir espaço com o homem.
Para que essa convivência seja harmoniosa, a regra é simples: quanto menos eles forem incomodados pelos humanos, menos os humanos serão incomodados por eles. Dar comida aos bichos, por exemplo, é um comportamento reprovado e que pode prejudicar as espécies. No mais, o campo-grandense tem, como poucos, a chance de aproveitar no dia a dia a reserva natural a céu aberto.
No Centro de Educação Ambiental Imbirussu, por exemplo, na região do bairro Zé Pereira, os animais vivem no Parque Linear protegido pelo Poder Público. Segundo o gestor do espaço e professor de Engenharia Ambiental, Carlos Silva Sampaio, a área tem oito quilômetros de extensão, que começa na Duque de Caxias e vai até a avenida Dom Antônio Barbosa, saída para Rochedo.
O local já foi invadido e serviu de moradia para centenas de famílias. Há três anos, o município tenta recuperar o espaço ligado aos cursos d’ água para controlar as enchentes e manter a área verde para centenas de animais que vivem ali. “O nosso desafio é conscientizar a população para preservação, pois tudo aqui tem a sua função no meio ambiente”, destaca o professor.
Na área há até tamanduá-mirim que, quando dá o ar da graça, encanta quem mora próximo da reserva. “Nós somos abençoados. Infelizmente tem algumas pessoas que não sabem da importância de morar perto de um lugar como esse”, diz a professora Noemi Sanches, 50 anos. Ela costuma caminhar todos os dias às margens do parque.
Perto dali, na região do bairro Sayonara, o comerciante Nailton Menanis de Oliveira, 43 anos, relembra ao ouvir o canto dos pássaros a época quando morava no sítio. “Não tem coisa melhor do que conviver com os animais e viver em harmonia com a natureza”, diz.
Parque dos Poderes e dos animais - Na região onde se concentra o centro de poder estadual, no Parque Estadual do Prosa, parte das histórias de quem mora ou trabalha por ali está relacionada com os bichos.
Há 34 anos trabalhando no mesmo lugar, o encarregado da segurança da Assembleia Legislativa, Waldoraci Tobias Neto, 54 anos, conta da satisfação em conviver diariamente com diferentes animais “Até jiboia tem aqui e tem gente que vem só para tirar foto, filmar e mandar para parentes que moram em outro Estado. Já quem não é daqui fica deslumbrado com a nossa natureza”, destaca.
Histórias Waldoraci têm de monte, mas uma delas ele faz questão de contar toda vez que alguém pergunta sobre os animais. “Dias desses, um quati estava atravessando a rua, quando percebeu que seu filhote não queria ir de medo, pois não parava de passar veículos. Ela andava um pouco e olhava para trás, quando percebeu que o filhote não ia de jeito nenhum, voltou para buscar e com o bichinho na boca atravessou correndo as duas faixas até chegar do outro lado da mata”, conta admirado.
Do outro lado da cidade, na região da UFMS (Universidade Federal do Mato Grosso do Sul), as capivaras, os jacarés e as tartarugas parecem não se importar com a presença do homem. O jacaré, por exemplo, vive no Lago do Amor e quando quer dar uma voltinha ou tomar sol, ignora quem está por perto e simplesmente atravessa a rua. Claro que ele corre o risco de ser atropelado, mas a capivara não: é comum elas atravessarem na faixa de pedestre e não há quem não pare o veículo para elas passarem com a família.
Na saída para São Paulo, em uma área verde no prolongamento da avenida Vitor Meireles, macacos-prego e saguis brotam das árvores. Inteligentes e ativos, os primatas dão show de simpatia, principalmente, se a pessoa tiver nas mãos uma banana.
O major da PMA (Polícia Militar Ambiental) Ednilson Queiroz explica que esses animais são sinantrópicos, ou seja, se adaptaram e acostumaram a viver junto com o homem depois de ter o espaço invadido. “Campo Grande está expandido o território urbano e, para isso precisa entrar no espaço de vegetação, invadindo assim, o habitat natural dos animais silvestres”, explica.
Exemplo disso é a avenida Três Barras, local onde havia muita vegetação e que agora foi tomado por avenidas e está lotado de capivaras. No entanto, para o professor Carlos Silva, mesmo com o crescimento a cidade vai continuar a manter belas paisagens, pois a Capital abriga vários parques lineares.
A advogada Graziela Pelizer, 33 anos, conta que todo o dia chega para trabalhar em um escritório de advocacia na rua Alagoas e encontra duas araras no pé de coqueiro, usado por elas para fazerem ninho. "Não tem preço", diz, resumindo um sentimento comum a quem nasceu ou escolheu Campo Grande para viver.
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