Antes da urna eletrônica, MS só soube quem era governador 3 dias após votação
Já na 1ª eleição com urna eletrônica no Estado, Capital soube quem era o novo prefeito em 3 horas e 10 minutos
Era 3 de outubro de 1994, quando eleitores sul-mato-grossenses foram, pela última vez, às urnas de lona, depositar o voto de papel. Dois anos depois, quem votou em Campo Grande, já experimentou digitar os números dos candidatos e ouvir o “ti-li-li-li”, após confirmar os votos para vereador e prefeito.
Agora, proposta em discussão é mudar de novo o processo, continuar com a urna eletrônica, no entanto, imprimir o comprovante de votação. A alegação é chance de fraude.
Mas como era a votação antes do modelo que agora, é colocado em xeque por seguidores do presidente Bolsonaro? Laureano Secundo, de 60 anos, lembra bem. Além de ser eleitor assíduo, que guarda todos os comprovantes de votação desde 1986, quando tinha apenas 25 anos, ele participou da transição do processo eleitoral como jornalista, inclusive, a mudança que segue desde 1996.
A primeira coisa que vem à mente de Laureano de antes da informatização do processo eleitoral, é a demora para votar e para saber o resultado das eleições. “Demorava muito, era um inferno”, comenta sobre a época do voto de papel e filas gigantescas nas sessões eleitorais.
Naquele 94, Mato Grosso do Sul levou três dias para saber que Wilson Barbosa Martins, do então, PMDB, voltava ao cargo de governador, eleito no 1º turno com 53,70% do votos válidos, conforme os registros do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Na disputa com Levy Dias (PPR), Pedro Luiz Teruel (PT) e Rita de Cassia Gomes Lima (Prona), Wilson conquistou 392.365 dos 947.159 votos apurados.
A votação aconteceu em 3 de outubro. No dia 6, o jornal Correio do Estado trouxe na capa o resultado. Segundo a notícia, o TRE (Tribunal Regional Eleitoral) havia divulgado a relação final da apuração de votos “nas primeiras horas” daquela manhã.
“Elegemos o Dr. Wilson e Fernando Henrique. A gente votava para presidente, governador e senador numa cédula e deputados federal e estadual em outra. Tinha de preencher duas cédulas”, puxa Laureano na memória.
Quem também não se esquece da trabalheira que dava a “festa da democracia”, é o professor Antônio Francisco Guedes, 58 anos, que desde a década de 1980, trabalha como mesário. “Era muito mais demorado o processo, muito mesmo. Da última vez que a votação foi ‘na lona’, eu estava lá na Escola Estadual Maria Constança de Barros Machado. Saímos às 17h e fomos até a União dos Sargentos para a escrutinação [contagem de votos em cada urna] e só consegui ir para casa às 23h30”.
A informatização do processo reduziu o tempo de apuração a horas. Em outubro de 1996, depois da estreia da urna eletrônica na Capital, o jornal Correio do Estado anunciou: “Prefeito será conhecido no mesmo dia da eleição”.
Dito e feito. A edição do dia 16 de novembro "manchetou" que André Puccinelli, do então PMDB, era o novo prefeito e havia ganhado de José Orcírio Miranda dos Santos, o Zeca do PT, por 411 votos. Já era “notícia velha”, porque o resultado oficial foi anunciado pelo TRE, às 20h10 do dia anterior.
Fraude – Não só o tempo de apuração, mas tanto o eleitor “de carteirinha”, quanto o mesário experiente concordam que havia mais fraude. “Os caras roubavam a eleição assim... Pegavam 1 ou 2 cabos eleitorais, que chegavam bem cedo no local de votação para serem os primeiros a votar. Mas, ao invés de depositar a cédula oficial, ele depositava qualquer outro papel e ficava com cédula. Ali, ele já preenchia em quem a pessoa ir votar e voltava pro fim da fila para comprar voto. Pagava para a pessoa pegar a cédula preenchida e voltar com a em branco e isso gerava uma corrente”, narra Laureano.
Para Antônio, a urna eletrônica é inviolável. “Tanto é que era muito mais pesada a boca de urna. Quando passou da lona para a eletrônica, diminuiu bastante. Eu sinto isso. Antes, tinha até o ‘cadeião’. Muita gente ia presa no dia da eleição, levavam lá pro Ginásio Dom Bosco”.
Voto impresso - O processo informatizado de votação passou a ser questionado há alguns anos, debate inflamado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que ataca a confiabilidade da urna eletrônica e chegou a dizer que “sem voto impresso, não teremos eleição” em 2022.
Desde que virou eletrônico, existe mecanismo para auditar a contagem, com a impressão do boletim de cada urna ao fim da votação o que, inclusive, possibilita a recontagem.
Mas neste ano, o assunto voltou a ser discutido na Câmara Federal. A PEC do Voto Impresso não prevê o fim da votação eletrônica, mas que o eleitor tenha segurança sobre em quem votou.
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), lembrou que "se a proposta for aprovada, será feita uma amostragem em alguns equipamentos para que algum mecanismo seja incorporado à urna eletrônica e que o voto seja impresso e verificado de forma individual".
Há quem defenda que o método viola o sigilo do voto. Na segunda-feira (2), manifesto, assinado por todos os ex-presidentes do Tribunal Superior Eleitoral desde a Constituição Federal de 1988, além do atual presidente, Luís Roberto Barroso, e dos futuros presidentes, os ministros Edson Fachin e Alexandre de Moraes, defendeu o atual sistema de votação. O documento afirma que desde 1996, "jamais se documentou qualquer episódio de fraude nas eleições", além de ressaltar que as urnas eletrônicas são auditáveis "em toda a etapa do processo, antes, durante e depois das eleições".
Na sexta-feira (6), Arthur Lira anunciou que a PEC será levada para votação no plenário da Casa – mesmo após reprovação do projeto em comissão especial.