Na favela, o sonho é que a beleza da cidade um dia chegue para todos
Para quem vive em moradia improvisada e longe dos cartões postais, nem as oportunidade conseguem chegar
Para muitos aniversários são sinônimos de festas e comemorações. Da cidade em que moram então o que já vêm a cabeça s palavras feriado, desfile, e a oportunidade de declarar amor à terra onde se vive. Para quem sobrevive distante da beleza dos parques, das avenidas largas, das ruas arborizadas, cheias de colorido das árvores nessa época, o 26 de agosto é mais um dia de poeira e moradia improvisada. Dia, também, de pedir que a beleza tão cantada um dia chegue para todos.
É assim na Favela do Linhão, no Jardim Noroeste. Ali, o sentimento comum é de que a Capital Morena tem pouco a oferecer a quem tem menos ainda. Mesmo assim, ninguém cogita querer trocar o lugar que oferece o “pouco” com para viver. Querem ficar aqui, mas que as coisas melhorem um dia.
Essa é a opinião de Danielle Cavalheiro Matos, 20 anos, que mora com o marido e duas filhas, em dois cômodos, erguidos separadamente. “Sou campo-grandense e não troco minha cidade por outra. Sou feliz aqui, mas não quero minhas filhas crescendo neste bairro. Não deste jeito. Isso aqui não é vida não. Acho que a cidade podia ser bonita aqui também”, afirma.
A jovem conta que está no bairro há um ano, pois ela e o marido não conseguiram pagar aluguel no Pioneiro, onde estavam. “Quando vamos para o centro até parece que moramos em outra cidade. Aqui não tem o que em outros bairros têm”, diz ela, ao se referir a escolas, creches ou mesmo um mercadinho para se trabalhar como empacotadora. “O que sobra é insegurança”, completa.
A opinião é compartilhada por Cleide da Silva, 55 anos, abordada pela reportagem andando de chinelos gastos, na terra, ali chamada de rua. A dona de casa está somente há alguns meses no bairro, morando com uma tia, tempo foi suficiente para encontrar uma outra Campo Grande. “Gostaria de parabenizar a cidade por conseguir garantir moradia digna a sua população que, assim como eu não tem para onde ir e aguarda há anos por uma casa própria”, ironiza.
De "bico em bico" – Sentada em uma cadeira de metal enferrujado, igual a de bares populares e olhando para as poucas pessoas que passam por sua rua, a faxineira Maria de Fátima dos Santos, 47 anos diz que a vida no bairro segue de “bico em bico”. “É assim que vou me virando. Aparece um bico ali e outro aqui e a gente faz. O que mais posso fazer?! Aqui é tão longe que nem as oportunidades chegam, não tava nem lembrando de aniversário nenhum”, comenta.
Ela é natural do interior de São Paulo, diz, que mora junto com uma filha no bairro e se considera “presa” na cidade aniversariante. “Não tenho condições de voltar de onde eu vim, porque se tivesse eu voltaria. Não tem nada para gente como nós aqui”, desabafa.
“Dizem que aqui é bonito” – O casal Adriana de Oliveira, 43 anos, e Adenilson Arnaldo de Alencar, 25 anos, relatam que o bairro só é lembrado em época de campanha, e o discurso chega a assustars. “Já ouvi que aqui é bonito. Onde barracos, pessoas sem emprego e tendo que andar quilômetros em busca de saúde e educação é bonito?”, diz.
O casal, que trabalha com reciclagem, afirma preferir não “assoprar as velinhas”. “Aqui a maioria das ruas não têm iluminação, o que favorece a marginalidade. Então preferimos as luzes acessas”, afirma Adenilson.
Sonhos – Sem emprego, porém com sorriso no rosto, o vendedor dsonhos de padaria Ramão Eloi, 48 anos, conta que de maneira literal ele leva os doces para quem já não “sonha” mais. “A realidade aqui é outra. É dura. Mas, Deus colocou isso no meu coração e de minha esposa. Então saio de porta e porta vendendo esses sonhos. Além de ajudar na renda, eles adoçam a dura realidade de quem vive aqui”, explica.
Querido por seu bom humoré, Ramão acredita que o bairro não pertença a Campo Grande. “Parece uma terra de ninguém”, completa.
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