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Reportagens Especiais

Na favela, o sonho é que a beleza da cidade um dia chegue para todos

Para quem vive em moradia improvisada e longe dos cartões postais, nem as oportunidade conseguem chegar

Guilherme Henri | 26/08/2017 08:00
Filha de Danielle Cavalheiro Matos, 20 anos (Foto: André Bittar)
Filha de Danielle Cavalheiro Matos, 20 anos (Foto: André Bittar)

Para muitos aniversários são sinônimos de festas e comemorações. Da cidade em que moram então o que já vêm a cabeça s palavras feriado, desfile, e a oportunidade de declarar amor à terra onde se vive. Para quem sobrevive distante da beleza dos parques, das avenidas largas, das ruas arborizadas, cheias de colorido das árvores nessa época, o 26 de agosto é mais um dia de poeira e moradia improvisada. Dia, também, de pedir que a beleza tão cantada um dia chegue para todos.

É assim na Favela do Linhão, no Jardim Noroeste. Ali, o sentimento comum é de que a Capital Morena tem pouco a oferecer a quem tem menos ainda. Mesmo assim, ninguém cogita querer trocar o lugar que oferece o “pouco” com para viver. Querem ficar aqui, mas que as coisas melhorem um dia.

Essa é a opinião de Danielle Cavalheiro Matos, 20 anos, que mora com o marido e duas filhas, em dois cômodos, erguidos separadamente. “Sou campo-grandense e não troco minha cidade por outra. Sou feliz aqui, mas não quero minhas filhas crescendo neste bairro. Não deste jeito. Isso aqui não é vida não. Acho que a cidade podia ser bonita aqui também”, afirma.

A jovem conta que está no bairro há um ano, pois ela e o marido não conseguiram pagar aluguel no Pioneiro, onde estavam. “Quando vamos para o centro até parece que moramos em outra cidade. Aqui não tem o que em outros bairros têm”, diz ela, ao se referir a escolas, creches ou mesmo um mercadinho para se trabalhar como empacotadora. “O que sobra é insegurança”, completa.

Danielle Cavalheiro Matos, 20 anos mora há um ano no bairro com marido e duas filhas (Foto: André Bittar)
Danielle Cavalheiro Matos, 20 anos mora há um ano no bairro com marido e duas filhas (Foto: André Bittar)
Moradia de Danielle é dividida em dois barracos (Foto: André Bittar)
Moradia de Danielle é dividida em dois barracos (Foto: André Bittar)

A opinião é compartilhada por Cleide da Silva, 55 anos, abordada pela reportagem andando de chinelos gastos, na terra, ali chamada de rua. A dona de casa está somente há alguns meses no bairro, morando com uma tia, tempo foi suficiente para encontrar uma outra Campo Grande. “Gostaria de parabenizar a cidade por conseguir garantir moradia digna a sua população que, assim como eu não tem para onde ir e aguarda há anos por uma casa própria”, ironiza.

De "bico em bico" – Sentada em uma cadeira de metal enferrujado, igual a de bares populares e olhando para as poucas pessoas que passam por sua rua, a faxineira Maria de Fátima dos Santos, 47 anos diz que a vida no bairro segue de “bico em bico”. “É assim que vou me virando. Aparece um bico ali e outro aqui e a gente faz. O que mais posso fazer?! Aqui é tão longe que nem as oportunidades chegam, não tava nem lembrando de aniversário nenhum”, comenta.

Ela é natural do interior de São Paulo, diz, que mora junto com uma filha no bairro e se considera “presa” na cidade aniversariante. “Não tenho condições de voltar de onde eu vim, porque se tivesse eu voltaria. Não tem nada para gente como nós aqui”, desabafa.

A faxineira Maria de Fátima dos Santos, 47 anos e sua filha (Foto: André Bittar)
A faxineira Maria de Fátima dos Santos, 47 anos e sua filha (Foto: André Bittar)
Ruas do bairro são de terra e moradores reclamam de "poeirão" (Foto: André Bittar)
Ruas do bairro são de terra e moradores reclamam de "poeirão" (Foto: André Bittar)

“Dizem que aqui é bonito” – O casal Adriana de Oliveira, 43 anos, e Adenilson Arnaldo de Alencar, 25 anos, relatam que o bairro só é lembrado em época de campanha, e o discurso chega a assustars. “Já ouvi que aqui é bonito. Onde barracos, pessoas sem emprego e tendo que andar quilômetros em busca de saúde e educação é bonito?”, diz.

O casal, que trabalha com reciclagem, afirma preferir não “assoprar as velinhas”. “Aqui a maioria das ruas não têm iluminação, o que favorece a marginalidade. Então preferimos as luzes acessas”, afirma Adenilson.

Sonhos – Sem emprego, porém com sorriso no rosto, o vendedor dsonhos de padaria Ramão Eloi, 48 anos, conta que de maneira literal ele leva os doces para quem já não “sonha” mais. “A realidade aqui é outra. É dura. Mas, Deus colocou isso no meu coração e de minha esposa. Então saio de porta e porta vendendo esses sonhos. Além de ajudar na renda, eles adoçam a dura realidade de quem vive aqui”, explica.

Querido por seu bom humoré, Ramão acredita que o bairro não pertença a Campo Grande. “Parece uma terra de ninguém”, completa.

Vendedor de sonhos Ramão Eloi, 48 anos (Foto: André Bittar)
Vendedor de sonhos Ramão Eloi, 48 anos (Foto: André Bittar)
Pacotes de "mini sonhos" que são vendidos por Ramão (Foto: André Bittar)
Pacotes de "mini sonhos" que são vendidos por Ramão (Foto: André Bittar)

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