Pastel do Mercadão é estrela injustiçada, sem status de prato típico da Capital
Lanchonetes viram “point” no período eleitoral. Afinal, político “bom” é o que mostra ser "gente como a gente"
Quando a Prefeitura de Campo Grande lançou concurso para eleger o prato típico de Campo Grande, ele nem entrou na disputa. O sobá, receita trazida e adaptada pela colônia japonesa da Capital, com 41% dos votos, ganhou o título. É verdade que pastel tem em tudo que é lugar, mas no 26 de Agosto, é a massa frita e recheada lá do Mercadão Municipal que vai parar nas redes sociais de quem quer mostrar ser campo-grandense com orgulho ou homenagear a Capital Morena. No período eleitoral, as lanchonetes também viram “point” dos políticos que visitam o mercado popular para provar que são “gente como a gente”.
Quem não está nem aí para título, é quem vende o bom e velho pastel. Renan Kanashiro, 34, está há 20 anos trabalhando na lanchonete que o pai fundou. Nestas duas décadas, já viu de tudo na porta do Mercadão e gosta mesmo é de casa cheia. “Amanhã, isso aqui vai estar cheio de gente. O povo come até em pé”, revelou na tarde de ontem, véspera dos 123 anos de Campo Grande.
Embora seja feriado para poucos na Capital, ele aguardava movimento dobrado em relação aos dias da semana. E não é só pelo dinheiro no caixa não. É por gostar de ver as criações culinárias dos pais fazendo sucesso. “Massa e recheios. Eles fazem tudo em casa. Hoje, além dos tradicionais, carne e queijo, um dos nossos sucessos é o de paleta suína. Ela é marinada, assada na brasa, desfiada e a gente ainda acrescenta molho barbecue”, conta, sem revelar detalhes das receitas de família.
Cardápio variado – A variedade dos cardápios das quatro lanchonetes tem motivo. Até 2019, o Mercadão tinha o “Festival do Pastel” e a cada ano um novo recheio era acrescentado à lista. Foi a pandemia que botou freio nas aglomerações e fez o evento ser colocado em stand by. Mas, 2023 promete, segundo o administrador do mercado, Daniel Amaral. “Vamos voltar a fazer. É importante, para movimentar e para ativar a criatividade do pessoal. Hoje, temos aqui recheios exclusivos, como o pastel pantaneiro, de sarravulho”, revela.
Receitas exótica como a do pastel de jacaré já fizeram sucesso por lá. Mas, também foi a pandemia que tirou a receita do cardápio, conta Maria da Silva, 55, que trabalha há 25 anos fritando pastel. “Não conseguimos mais encontrar carne de jacaré para comprar. O preferido agora é o de avestruz com queijo”, conta, sorrindo. Os sabores pintado ao molho branco e pacu com queijo também estão entre os diferentões mais pedidos.
Por que o Mercadão? – “Amo esse lugar. Cresci aqui e venho sempre que posso”. A dona de casa Cecília Eliane Antônio, de 65 anos, define o Mercadão como o melhor local para um lanchinho quando sai do bairro para resolver assuntos “na cidade”.
Nesta quinta-feira (25), quando a equipe do Campo Grande News visitou o ponto turístico, ela havia optado por uma opção tradicional, pastel de carne com suco de laranja. Cecília diz que nem se preocupa com a mudança nas taxas de colesterol com a ingestão da fritura. “Faço regime para isso”, brinca.
Já o operador de máquinas Axell Almeida Furtado, de 29 anos, preferiu um recheio mais encorpado, carne com queijo. Depois de viajar 137 km de São Gabriel do Oeste a Campo Grande, escolheu o Mercadão para recuperar as energias. “Por que é muito bom e é tradição”, explicou.
Mas, antes da primeira mordida, não faltou uma foto para as redes sociais. “Coisa boa a gente mostra”, justificou.
Palanque – O pastel do Mercadão também faz sucesso entre os políticos. Em dezembro do ano passado, uma das pastelarias mais tradicionais recebeu a comitiva do presidente Jair Bolsonaro.
Durante a campanha eleitoral então, nem se fala. “Hoje, recebi quatro candidatos”, afirma o administrador do mercado. Daniel só pede que as visitas sejam previamente agendadas para evitar que o espaço não vire um palanque só e que os candidatos evitem espalhar cabos eleitorais pelos corredores e portas. “Se quiser vir, conversar com as pessoas, tudo bem, mas não dá pra atrapalhar o fluxo”.
Político pode até usar o pastel com tubaína pra parecer mais popular. Mas, está aí outra coisa que dono de pastelaria nem liga também. Afinal, o importante é a divulgação. “Muitos querem mostrar que são do povão, aparece só em campanha mesmo. Mas, tem quem goste de vir pelo pastel mesmo”, diz Renan, contando o milagre sem revelar o santo.