ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no X Campo Grande News no Instagram
NOVEMBRO, SÁBADO  02    CAMPO GRANDE 25º

Retrospectiva 2013

Confronto foi o "estopim" para a solução do conflito indígena em MS

Aliny Mary Dias | 29/12/2013 10:05
Fazendo foi ocupada dia 15 de maio deste ano (Foto: João Garrigó/Arquivo)
Fazendo foi ocupada dia 15 de maio deste ano (Foto: João Garrigó/Arquivo)
Confronto foi o "estopim"  para a solução do conflito indígena em MS

O conflito fundiário entre indígenas e produtores rurais é cenário antigo de mortes e disputas judiciais em Mato Grosso do Sul. Em 2013, a atenção das autoridades brasileiras, da imprensa nacional e até internacional se voltou para Sidrolândia, cidade a 70 quilômetros da Capital. O município protagonizou a ocupação da Fazenda Buriti, palco de dois confrontos de desocupação entre índios terena e Policiais Federais que culminou na morte de um índio e na paraplegia de outro, baleado por um tiro no ombro.

A Fazenda Buriti, propriedade do ex-deputado estadual e ex-secretário estadual de Fazenda Ricardo Bacha, foi ocupada por um grupo de 100 índios no dia 15 de maio deste ano. Apesar da ocupação de parte do campo de 300 hectares, a sede da propriedade ficou intacta até o dia 18, perto do prazo estipulado pela Justiça Federal para a saída dos terena.

A expansão da ocupação contou com 600 indígenas e representantes do MPF (Ministério Público Federal) foram até o local para tentar negociar com os terena, mas não houve sucesso. Policiais federais também permaneceram no local.

O clima ficou tenso e o caso chamou a atenção de todo o país no dia 30 de maio, quando a Polícia Federal, em conjunto com a Cigcoe (Companhia Independente de Gerenciamento de Crises e Operações Especiais), cumpriu um mandado de reintegração de posse que terminou em confronto violento.

Até hoje não se sabe de onde partiu a bala que matou Oziel Gabriel, de 35 anos, morador da Aldeia Córrego do Meio. No dia do confronto, indígenas acusaram os policiais de usarem armas de grosso calibre, no entanto, as corporações afirmaram que apenas balas de borracha foram usadas no dia.

Polícia Federal participou de confrontos (Foto: João Garrigó/Arquivo)
Polícia Federal participou de confrontos (Foto: João Garrigó/Arquivo)

Oziel chegou a ser socorrido até o Hospital Beneficente Dona Elmira Silvério Barbosa, mas não resistiu ao ferimento no peito e morreu no mesmo dia. Cinco dias depois, em 4 de de junho, um novo confronto ocorreu e Joziel Gabriel, de 34 anos, foi baleado na Fazenda Buriti.

Joziel é primo de Oziel e foi atingido no ombro, o projétil ficou alojado na coluna do terena que precisou ser transferido do Hospital de Sidrolândia para a Santa Casa da Capital. Depois de ter a paraplegia confirmada, Joziel foi levado para o hospital Sarah Kubitschek, localizado no Distrito Federal e referência em reabilitação. O índio permaneceu 51 dias em tratamento e voltou para Capital no dia 8 de agosto, no entanto, o movimento das pernas não foi recuperado.

Destaque nacional – Foi depois do segundo confronto que deixou Joziel paraplégico que o Governo Federal voltou as atenções para o Estado e ordenou que a Força Nacional viesse para Mato Grosso do Sul. Os 110 homens chegaram em Sidrolândia no dia 7 de junho e parte deles permanece até hoje no município.

Os policiais ficaram alojados no parque de exposições da cidade e se revezaram na segurança das estradas que dão acesso às aldeias e fazendas e dentro das aldeias. A princípio houve revolta dos terena, muitos diziam que não eram bandidos, mas depois que a atuação pacífica da Força Nacional foi estabelecida, a maioria dos índios aceitou a presença dos policiais.

Um dia antes da chegada do efetivo da Força Nacional, o major da corporação e representantes de entidades nacionais se reuniram em Sidrolândia para discutir os detalhes da atuação na cidade.

Jornalistas de vários veículos do país e do mundo acompanharam ocupação (Foto: Cleber Gellio)
Jornalistas de vários veículos do país e do mundo acompanharam ocupação (Foto: Cleber Gellio)

Para acompanhar todo o impasse, jornalistas de várias partes do país e até do mundo foram até a cidade. Pelo menos 50 jornalistas acompanharam a disputa de terra no município, além da imprensa local estiveram na região equipes da Press TV, Hispain TV, Agência de Notícias de Londres, Agência Irã, Profissão Repórter da TV Globo, EBC (Empresa Brasileira de Comunicação - Agência Brasil e TV Brasil), jornal O Globo e Folha de São Paulo.

Para especialistas e pessoas que viveram o episódio ocorrido há 30 anos em Antônio João, a repercussão da morte de Oziel Gabriel pode ser comparada a de Marçal de Souza, outra indígena morto durante conflitos fundiários em Mato Grosso do Sul.

Ocupações e ano decisivo – Índio terena natural da aldeia Ipegue em Aquidauana e advogado dos índios, Luiz Henrique Eloy, afirma que a ocupação da Fazenda Buriti só aconteceu depois de uma grande Assembleia do Povo Terena realizada no dia 10 de maio na Terra Buriti.

“Foi uma decisão tomada entre os caciques e que constava no documento final da assembleia. 2013 foi um ano que marcou pela retomada das terras e isso só aconteceu em razão do descaso da União”, relembra Luiz.

Apesar das ocupações terem sido iniciadas de responsabilidade dos índios, Eloy ressalta que os confrontos violentos não eram esperados. “Foi uma tragédia a morte do Oziel e o estado em que Joziel ficou, mas nós entendemos que a responsabilidade é toda da União que não resolveu o problema”, explica.

Força Nacional atuou na segurança das aldeias (Foto: Cleber Gellio)
Força Nacional atuou na segurança das aldeias (Foto: Cleber Gellio)

Para o próximo ano, o advogado espera que com as negociações e articulações do Governo Federal e Ministério da Justiça para indenizar os fazendeiros, pelo menos a situação da Fazenda Buriti seja resolvida.

“Nós sabemos que 2014 será um ano tumultuado por conta da Copa do Mundo e das eleições, mas a Buriti nós temos confiança que seja resolvido”, completa.

Sobre a possibilidade de novas invasões no Estado, Eloy afirma que uma nova assembleia geral dos terena está marcada para janeiro deste ano e que tudo depende de decisões da Justiça como a que bloqueou o valor arrecadado por ruralistas no Leilão da Resistência, realizado no dia 7 de dezembro e que teve arrecadação de R$ 1 milhão.

“Será uma reunião de toda a liderança, mas depende de muita coisa. O Leilão da Resistência é um exemplo, se houver decisão favorável para os produtores pode ser que aconteça”, diz.

Nos siga no Google Notícias