11 de fevereiro: Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência
Quem nunca se deparou com uma clássica pergunta ao entrar em uma loja de brinquedos para escolher um presente para uma criança: "É para menino, ou para menina?". De fato, as crianças se interessam por brinquedos e brincadeiras de maneiras distintas. Há predileção por personagens, cores e até brinquedos da moda. Porém, essa pergunta é mais preocupante do que parece.
Se observarmos os chamados "brinquedos de menina", notamos uma infinidade de miniaturas de eletrodomésticos ou qualquer equipamento relacionado ao cuidado e/ou beleza, a maioria deles em rosa ou lilás. Passeando pelas prateleiras de “brinquedos de menino", podemos encontrar jogos que estimulam o raciocínio, a competição, a força e a liderança. Brinquedos que os fazem sonhar em ser cientistas, astronautas, pilotar, dirigir ou construir qualquer coisa.
Estudos têm mostrado que esse rótulo sobre o que é "brinquedo de menino" e "brinquedo de menina" pode ter influência na forma como as crianças enxergam suas potencialidades, habilidades e lugar na sociedade, reforçando os tais estereótipos de gênero. Um estudo1 de 2017 da Universidade de Chicago investigou como um grupo de 96 crianças entre cinco e sete anos enxerga e classifica o brilhantismo intelectual de uma pessoa em relação ao gênero. Aos cinco anos de idade, as crianças não diferenciaram meninos e meninas como mais ou menos inteligentes.
A partir dos seis anos de idade, as meninas passaram a se considerar menos inteligentes, a evitar atividades descritas a elas como sendo "mais difíceis", preferindo atividades classificadas como sendo as que exigiam mais esforço e dedicação.
Concluiu-se que a noção do que significa "ser inteligente" é adquirida desde cedo, e afeta diretamente o interesse e as escolhas dessas crianças, principalmente das meninas, que passam a acreditar precocemente que seriam menos capazes de ter sucesso em atividades consideradas mais desafiadoras.
Para além dos estereótipos de gênero reforçados pela socialização, as meninas costumam ser responsabilizadas pelos afazeres domésticos e pelo cuidado de familiares bem mais que os meninos2, contribuindo para que elas tenham menos tempo livre para estudar e brincar.
Infelizmente, esses efeitos parecem se propagar para a vida adulta e profissional dessas meninas, contribuindo para que as jovens mulheres sequer almejem uma carreira científica. Outro estudo3, realizado em 2012 pela Universidade de Princeton, enviou currículos para 127 gerentes de pesquisas para candidatura a uma vaga de assistente de pesquisa em laboratório. Os currículos enviados, apesar de idênticos nas habilidades, eram distintos quanto ao nome dos candidatos: metade desses currículos receberam um nome feminino e a outra metade, um nome masculino.
Os resultados mostraram que as pessoas que avaliaram as candidaturas (incluindo avaliadoras do sexo feminino) consideraram o currículo com nome masculino mais apto do que o feminino, inclusive, oferecendo um salário inicial maior para o currículo masculino. As análises dos resultados mostraram que as mulheres são consideradas menos competentes quando estão disputando um cargo com um homem. Esse fato ajuda a explicar o porquê da participação feminina não superar 30% na ciência mundial.
Essa sub-representação das mulheres na ciência pode afetar, limitar e enviesar a procura por soluções para as questões que impactam a humanidade. Diante dessa triste realidade, a Organização das Nações Unidas (ONU), por meio da Agenda 2030, lançou os “Objetivos do Desenvolvimento Sustentável", cujo quinto objetivo é alcançar igualdade de gênero, inspirar e engajar mulheres e meninas na Ciência, como uma das formas de contribuir para a erradicação da pobreza e promover vida digna para as próximas gerações.
Com esse intuito, desde 2016, no dia 11 de fevereiro celebra-se o “Dia Internacional de Meninas e Mulheres na Ciência”, pois, segundo a Unesco, as mulheres têm menos acesso a investimentos, a redes de estudo e até mesmo a cargos "sênior" nas empresas, o que as coloca em profunda desvantagem4. Diversas ações têm sido coordenadas pela Unesco e pela ONU Mulheres, em todo o mundo, visando divulgar a participação feminina nos avanços científicos e tecnológicos.
Desde 2017, desenvolvemos na UFLA o projeto de extensão “Meninas nas Exatas”, com o objetivo de discutir sobre a equidade de gênero e a inserção das mulheres nas ciências exatas, computação e engenharias; estimular o envolvimento das meninas nas ciências exatas, computação e engenharias; promover uma educação inclusiva, equitativa e de qualidade para todas e todos. Em 2022, com o apoio do CNPq, esse projeto está sendo aprimorado e será levado para pelo menos uma escola da rede estadual da cidade de Lavras.
O impacto dessas ações pode inspirar meninas em idade escolar, encorajando-as a não limitarem suas escolhas aos destinos atribuídos socialmente a elas, quando não impostos pela situação de desigualdade social.
Além disso, essas ações encorajam mulheres em ascensão na carreira científica a superarem o "efeito tesoura", mantendo-se na luta por condições de trabalho que efetivamente ofereçam equidade, dentro e fora da carreira acadêmica. Essas mulheres alimentam a cultura do exemplo, fundamental para que meninas entendam que não há espaços que não possam ocupar.
Considerando todos esses fatores, é possível repensar algumas pequenas atitudes que levam a um novo olhar, inclusive para a loja de brinquedos. As profissões relacionadas ao cuidado podem sim ser realizadas por mulheres, assim como pelos homens. Mais do que nunca, precisamos de "brinquedos de casinha" em cores que sejam aceitáveis para qualquer criança, pois meninos também precisam ocupar os seus espaços no que diz respeito ao cuidado doméstico, de terceiros e ao autocuidado.
Da mesma forma, carrinhos, acessórios esportivos, jogos, brinquedos de raciocínio e ação devem ser incentivados também para meninas. Dessa forma, de brincadeira em brincadeira, um mundo melhor, cheio de possibilidades, vai se abrindo para as atuais e futuras gerações.
(*) Amanda Castro Oliveira é professora associada no Departamento de Educação em Ciências Físicas e Matemática da UFLA.
(*) Evelise Roman Corbalan Gois Freire possui licenciatura plena em matemática pela Unesp.