A dor na face é igual para todos?
Ao pensarmos em nossas experiências com a dor física, seja ela em qualquer parte do corpo, chegaremos a uma conclusão que parece óbvia: não sentimos a dor sempre da mesma maneira. Mais ainda: entre as pessoas a dor é sentida de forma diferente, ainda que aparentemente pela mesma causa.
A dor, portanto, não é um simples mecanismo de percepção-reação. Envolve muito mais do que podemos imaginar, motivo pelo qual a sentimos de formas diferentes. E a este “muito mais” damos o nome de dimensões da dor.
Você sabia que seu estado psicológico pode estar influenciando na sensação de dor? É fato! Isso porque fatores como ansiedade, melancolia e estresse tornam as pessoas menos capazes de controlar os processos de dor. Assim, duas pessoas submetidas ao mesmo estímulo doloroso vão ter sua experiência dolorosa baseada não só na dimensão sensorial da dor (ou a dor tecidual por si só), mas numa dimensão afetiva-motivacional, que trata justamente das emoções, sentimentos e motivações envolvidas quando sentimos dor. E todos nós podemos pensar como ficamos diante da dor: mais sensíveis ou durões?, nos vitimizamos ou corremos atrás da solução?
Face ao exposto, você sabia que seu comportamento em relação a sua dor tem grande influência na evolução do seu problema? Sim, é verdade! Nos motivamos a agir para solucionar o problema ou esperamos passivamente que ele seja resolvido por alguém ou até mesmo espontaneamente?
Ao mesmo tempo que a dor mexe com nossos sentimentos e emoções, direciona nossa motivação para agir ou esperar, cuidar ou ser cuidado, o que está intimamente ligado às próprias habilidades em lidar com a dor. Será que muitas vezes não temos um “ganho secundário” com a dor persistente?
Também há a dimensão cognitivo-avaliativa, que nada mais é do que a maneira como a pessoa avalia a sua dor. São os aspectos relacionados à compreensão da experiência dolorosa por meio das características inerentes à própria sensação dolorosa, das características afetivas, das experiências passadas e do significado da situação para o indivíduo.
E essas três dimensões da dor, quais sejam, sensorial, afetivo-motivacional e cognitivo-avaliativa, são sustentadas por mecanismos especializados no nosso Sistema Nervoso Central. Sim, é coisa séria, embasando cientificamente o fato de indivíduos com lesões dolorosas semelhantes terem desfechos diferentes nos seus tratamentos.
E por que chamamos atenção para a dor na face? Ela é diferente das demais? A resposta poderia ser não, entretanto, a preocupação que a dor nessa região gera é bem diferente de quando a dor ocorre em outras partes do corpo, especialmente quando a cronicidade se instala. Isso fica claro quando observamos pacientes com dores persistentes na face preocupados com a possibilidade de um tumor, o que mais raramente acontece quando a dor é num membro. A atmosfera de preocupação que as dores na face estabelecem contribui para a sua dificuldade de resolução.
A maior parte das dores crônicas da face necessita de tratamento multidisciplinar, justamente para que se tenha um olhar mais acurado a todas as dimensões da dor. Outrossim, há muitas estruturas nervosas nessa região, o que corrobora para a complexidade do diagnóstico.
Sendo assim, não raro cirurgiões-dentistas, fonoaudiólogos, fisioterapeutas e profissionais da área de comportamento, como psicólogos e psiquiatras, trabalham como um verdadeiro time em busca da solução do problema de dor facial do paciente.
Entendeu que a dor na face não é simplesmente uma sensação, mas sim uma experiência que pode estar amplificada pelo seu estado emocional? Fique atento! Se as experiências são diferentes, os tratamentos também são.
(*) Karen Dantur Batista Chaves é professora do Departamento de Odontologia Conservadora da Faculdade de Odontologia da UFRGS.