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A Universidade sob ataque

Pedro de Almeida Costa (*) | 16/03/2021 13:13

No dia 2 de março passado, os professores da Ufpel Pedro Hallal e Eraldo dos Santos, por “manifestarem desapreço” ao presidente, foram compelidos a assinar um Termo de Ajustamento de Conduta para, assim, encerrar investigação da CGU. Esse episódio é ilustrativo de como a universidade está sob ataque, e o propósito é silenciá-la, porque nela se produz conhecimento que tem potência para libertar o povo do jugo da opressão e da desigualdade.

Não por acaso Pedro Hallal é epidemiologista e coordenador do maior estudo epidemiológico brasileiro sobre a covid-19, o Epicovid, cujo financiamento foi cortado logo que suas conclusões começaram a ser publicizadas. Elas mostravam a trágica condução das políticas governamentais no combate à pandemia e o seu caráter genocida no tocante aos povos indígenas. Estamos de novo em período de silenciamento.

Revivemos agora um tempo de perseguição à universidade. Tempo como o que enfrentaram os colegas expurgados da Universidade durante a ditadura civil-militar iniciada em 1964 em julgamentos sumários recheados de falsas acusações e ausência de sentido. Em novembro de 2019, nós, um grupo de docentes da UFRGS, prestamos-lhes, então, a devida homenagem.

A reportagem Lições de um período de silenciamento, de Emerson Trindade Acosta, retratou esse episódio. Publicada no JU em março de 2020, obteve o Prêmio da Associação Riograndense de Imprensa 2020 na categoria universitária de jornal impresso. Emerson soube captar o elemento fundamental dos processos dos expurgos: o silenciamento. Aquelas dezenas de professores precisavam ser silenciados para que a ditadura se consolidasse. Não se podia permitir a existência de espaço de pensamento crítico, porque dele emerge a tomada de consciência e a resistência ao injusto.

No esteio da tentativa de calar dois professores, o MEC emite um ofício no qual pede que sejam tomadas providências para “prevenir e punir atos político-partidários nas instituições públicas federais de ensino”. A universidade precisa “ensinar matéria”, formar gente dócil para o mercado de trabalho e se exaurir de atividades de modo a não lhe sobrar energia para pensar na política.

Esse foi apenas mais um passo no eterno esforço dos que representam a classe dominante de silenciar a universidade, porque é dela, e sobretudo da juventude inquieta que estuda e descobre a história da humanidade na luta pela sua emancipação, que brotam formas articuladas de denúncia, resistência e transformação.

A indecente interferência da presidência da república na autonomia da universidade pública brasileira ao indicar para reitor professores que não foram escolhidos pelas suas comunidades é outro elemento da ofensiva para esse silenciamento amestrado.

A sociedade civil, na trincheira da democracia, se reorganiza e se articula na defesa do pensamento livre, e associações nacionais das diversas áreas da ciência, a SBPC, o Conselho de Reitores das Universidades Estaduais Paulistas ou o Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes), entre muitas outras, manifestam-se, protestam e lutam contra o obscurantismo que bate à porta.

Mas a ofensiva de silenciamento contra a universidade é uma prova de que ela não foi completamente subjugada pela lógica neoliberal que lhe foi imposta a partir dos anos 1990. Se assim fosse, não meteria medo ao obscurantismo atual; precisamos, entretanto, fortalecê-la, nos compreendendo como uma comunidade de professores, técnicos e estudantes em luta comum por uma sociedade mais justa.


(*) Pedro de Almeida Costa é professor do Departamento de Ciências Administrativas da UFRGS.

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