Assédio moral e organizações
O presente texto versa sobre assédio moral nas organizações. Sendo a conduta abusiva seu componente central, o assédio moral, antes de tudo, é uma patologia da solidão, fruto destes tempos hipermodernos e de seus excessos, em que a competitividade e o individualismo se exacerbam, fragmentando-se a solidariedade, e impactando significativamente as relações sociais. E nas organizações, ao invés de buscarmos o fortalecimento dos laços sociais e dos mecanismos coletivos de resistência política, resolvemos, individualmente, pressões vinculadas à ideologia gerencialista e às relações socioprofissionais, em um divã de analista ou com remédios de tarja preta. Deste modo, os custos físicos e psíquicos da pressão no trabalho e as diversas modalidades de sofrimento se mostram mais proeminentes. E assim, a violência moral amplia sua presença nos espaços sociais e organizacionais.
E o assédio moral é uma das mais impactantes vivências de sofrimento no trabalho e muito perpassada pela solidão, especialmente quando o outro se omite frente à violência por nós vivenciada e à dor dela produzida. Nos sentimos sós, além de algumas vezes culpados, por estar sendo alvo de alguma forma de agressão psicológica no ambiente de trabalho.
Em um primeiro momento, tendemos a não compreender, que estamos sendo vítima de assédio. Pensamos: “deve ser algo da minha cabeça ou eu não devo estar fazendo algo direito”, mas, aos poucos, no momento em que o assédio se mantém, periódica e repetidamente, características singulares do referido fenômeno, eu começo a vivenciar angústias vinculadas à perda de dignidade e integridade. Encaminhar-me ao local de trabalho me causa medo, angústia e dor. O medo se soma à solidão, também fruto do abandono que, além de ser individual e grupal, também o é em nível institucional. Isto porque o tema continua sendo considerado de pouca importância em nível gestão, não recebendo a devida atenção dos tomadores de decisão no mundo organizacional.
E, repetida e frequentemente, vivencia-se o abuso psicológico, perseguições constantes, isolamento, humilhações, ofensas, colocação da pessoa em situações vexatórias, desqualificação, constrangimento, indução ao erro, recusa de comunicação direta, desprezo, zombaria, ameaças. E tudo vai ocorrendo lentamente, até que se torna algo avassalador e de difícil reação, especialmente quando não se conta com suportes, tanto psicológico, quanto institucional.
E não basta investir em práticas educacionais, sem que haja uma política de tolerância zero nos casos de assédio moral. O trabalho preventivo é fundamental, especialmente para prover informações sobre o assédio, para que o funcionário possa conhecer suas características e as estratégias que o agressor utiliza nesta conduta abusiva que mina as resistências psicológicas do indivíduo, e colocam em xeque sua integridade enquanto pessoa.
Denúncias devem ser averiguadas com celeridade e à luz de todos os direitos da defesa, situações de assédio moral devem ser punidas. E, ainda, é fundamental que os líderes organizacionais compreendam que a competência técnica de um assediador não o torna imune a responder por atos de violência moral. A ética na gestão deve prevalecer frente a outras categorias, tais como desempenho, produtividade e resultados organizacionais.
Por fim, não podemos ignorar o papel das incivilidades, de comportamentos rudes ou insensibilidades morais, estas microviolências que podem gerar um ambiente propício para outras formas de agressão, de violência, tais como o assédio moral. Assim, há necessidade de refletirmos continuamente a nossa relação com o outro, sob os auspícios da solidariedade, possibilitando a criação de ambiente de trabalho mais saudáveis e éticos.
(*) Marcus Vinícius Soares Siqueira é professor do Departamento de Administração da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade.