Dada a largada ao plantio de 72 milhões de hectares
Vamos às reflexões dos fatos e números do agro em setembro e a lista do que acompanhar em outubro. Na economia mundial e brasileira, a incidência da variante delta vem reduzindo o ritmo de recuperação da economia global. Nos Estados Unidos, o número de empregos gerados apresentou queda expressiva em agosto, atingindo o menor índice em sete meses. Na mesma onda, o setor de serviços na China apresentou retração, e outros países, como Alemanha, evidenciaram reduções na atividade industrial. Segue-se agora a corrida para uma terceira dose de imunizantes e nossa torcida para a reversão do atual cenário.
Outro problema em consequência da pandemia e que deve se alastrar até 2022 se refere ao congestionamento de portos. As filas para embarque e desembarque estão acarretando falta de contêineres e aumento dos custos do frete marítimo, o que pode trazer problemas no abastecimento global. A situação precisa ser monitorada de perto para criar alternativas de escoamento/armazenamento. Foi incrível o aumento do custo dos fretes, impactando as empresas.
Já com relação à economia brasileira, dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam para uma estabilização do Produto Interno Bruto (PIB) no segundo trimestre, com variação negativa de 0,1% frente ao trimestre passado. Em comparação ao mesmo período de 2020, o indicador é 12,4% superior. Já no acumulado do semestre, a economia avançou 6,4%, dando indícios de que deve fechar 2021 crescendo em torno de 5%. O Relatório Focus (Bacen) de 13 de setembro trouxe expectativas para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 2021 em 8,00%, e de 2022 em 4,03%. Já para o PIB, espera-se um crescimento de 5,04% neste ano e de 1,72% em 2022. Na taxa Selic, o mercado espera 8,00% nos dois fechamentos, enquanto no câmbio devemos ter R$ 5,20 ao final de 2021 e 2022.
No agro mundial e brasileiro, o relatório de setembro do USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos) revelou um aumento na produção de milho nos Estados Unidos na safra 2021/22, saindo de 374,7 milhões de toneladas no relatório de agosto para 380,9 milhões de toneladas neste (+1,6%). Para a Argentina, o órgão também indica uma alta na produção, de 51 para 53 milhões de toneladas no comparativo mensal (+3,9%). No Brasil, os números foram mantidos em 118 milhões de toneladas. A oferta global do cereal nesta safra deve ficar em 1.197 milhão de toneladas. Para a soja, o USDA elevou a produção mundial em 780 mil toneladas neste relatório, agora avaliada em 384,2 milhões de toneladas; o Brasil deve produzir 144,0 milhões de toneladas (mesmo valor do relatório anterior); Estados Unidos, 119,0 (+0,8%); e Argentina, 52,0 milhões de toneladas (mesmo valor). Os estoques da oleaginosa foram elevados em 2,8% neste mês, e devem ficar em 98,9 milhões de toneladas, 4,0% superior ao do ciclo 2020/21.
A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) revelou suas primeiras estimativas para a safra de grãos 2021/22. A produção total deve atingir 289,6 milhões de toneladas (+14%) em uma área de 71,4 milhões de hectares (+4%). Na soja, é esperada uma produção 141,26 milhões de toneladas (+3,9%) advindas de uma área de 39,91 milhões de hectares (+3,6%). Já para o milho, o volume está estimado em 115,96 milhões de toneladas (+33,8%) em uma área total de 20,6 milhões de hectares (+3,9%). Finalmente, no algodão, devemos produzir 2,71 milhões de toneladas (+15,8%) em uma área de 1,55 milhão de hectares (+13,4%).
Já no último levantamento sobre o ciclo 2020/21 de grãos, a Conab estima produção de 252,3 milhões de toneladas, 1,8% inferior ao da temporada anterior, totalizando 68,93 milhões de hectares cultivados (+4,6%). Na soja, com a colheita praticamente finalizada, um volume recorde de 135,9 milhões de toneladas (+8,9%) é esperado numa área de 38,53 milhões de hectares (+3,1%). No milho, considerando as três safras, a produção deve alcançar 85,75 milhões de toneladas (-16,4%), totalizando área semeada de 19,87 milhões de hectares (+7,2%). Apesar do aumento de área, a produção da safrinha foi altamente afetada pelo atraso em sua semeadura, complicando os efeitos das condições climáticas pouco favoráveis como estiagens e geadas, que derrubaram a produção em 20,8%, projetada em apenas 59,47 milhões de toneladas. Enquanto isso, no algodão é esperada uma produção de 2,36 milhões de toneladas (-21,5%), devido à redução de área plantada (-17,7%) para 1,37 milhão de hectares. Dentre as lavouras de inverno, destaque para o trigo que teve um incremento de área (+13,1%) e deve produzir 8,16 milhões de toneladas (+30,8%).
Produtores do Mato Grosso devem antecipar o plantio de soja neste ano, aproveitando-se das chuvas que estão previstas para o final de setembro. Dessa forma, busca-se evitar que a semeadura da safrinha de milho seja feita fora da janela ideal, conforme verificado na última safra, o que acarretou perdas de produtividade. Vamos torcer por isto.
As vendas de fertilizantes para o segundo semestre de 2021 já representam 80% das negociações previstas para o período, segundo levantamento da StoneX. A consultoria estima que 43,7 milhões de toneladas do insumo serão comercializadas ao longo do ano, representando um crescimento de 8% em comparação a 2020. Já para o primeiro semestre de 2022, a estimativa é que 39% dos negócios já estejam fechados. É importante ter cautela com o câmbio e fazer operações casadas, pois os preços estão sensivelmente mais altos.
Em mais um mês, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) revisou para cima o Valor Bruto da Produção Agropecuária (VBP). Na estimativa de agosto, o valor foi apontado em R$ 1,106 trilhão, crescimento de 9,7% em relação ao registrado em 2020. As cadeias de produção agrícola devem faturar cerca de R$ 750 bilhões (+11,9%), enquanto a pecuária responderá por R$ 256 bilhões (+5,4%).
O agronegócio brasileiro exportou cifra recorde em agosto de US$ 10,90 bilhões, crescimento de 26,7% em comparação ao mesmo mês de 2020, segundo dados do Mapa. Os preços, 27,1% superiores, continuam a sustentar o incremento de receita das vendas externas, já que o volume embarcado registrou queda de 2,9%. O complexo soja manteve a liderança na pauta de exportação com US$ 4,02 bilhões comercializados (+53,6%), sendo a soja em grãos responsável por 78% desse resultado. As vendas de carnes foram recordes para o mês, alcançando US$ 2,09 bilhões (+40,5%), sendo US$ 1,17 bilhão de carne bovina (+55,6%), US$ 663,55 milhões (+35,2%) de frango e US$ 208,23 milhões (-0,5%) de carne suína. Os produtos florestais aparecem em terceiro, vendendo US$ 1,25 bilhão (+40,5%), graças a uma forte elevação de preços (+31,2%). Na sequência, cereais, farinhas e preparações foram responsáveis pela exportação de US$ 932,5 milhões (-14,3%), com queda pela redução de embarques de milho diante da situação de oferta apertada. Na quinta colocação, o complexo sucroenergético exportou US$ 912,2 milhões (-9,0%). No outro lado da balança comercial, as importações do agronegócio somaram US$ 1,25 bilhão, incremento de 37,2%. Mesmo assim, o setor entregou um superávit de US$ 9,65 milhões, 25,5% superior àquele no mesmo mês de 2020.
Segundo as estimativas mais recentes do USDA, o Brasil deve produzir 6,9 bilhões de litros de biodiesel neste ano, crescimento de 7,8% em comparação com o anterior. Segundo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), entre janeiro e junho de 2021, a produção acumulada é de 3,35 bilhões de litros, mas vale lembrar que nossa capacidade produtiva é de cerca de 11,2 bilhões de litros por ano. A Fiagril, por exemplo, anunciou que está investindo R$ 5,5 milhões na sua fábrica de biodiesel para tornar possível o duplo refino de óleo de algodão e esterificação do óleo de milho, a fim de reduzir a dependência da soja como matéria-prima para produção. Vale lembrar que o governo reduziu a mistura de biodiesel ao diesel de 13% para 10% neste final de ano, em virtude da escassez de grãos.
O mês também teve a complicação de dois casos relatados de vaca louca atípica, que, mesmo já resolvidos, trarão impactos na exportação de carne bovina.
Para concluir a nossa análise geral do agro, os preços dos principais produtos no fechamento desta coluna eram: a soja para entrega em cooperativa de São Paulo estava em R$ 166,30/saca e R$ 151,60/saca para fevereiro de 2022. Há um ano estava em R$ 120/sc. No milho, a cotação atual está em R$ 91,00/saca e a entrega em maio de 2022 fechou em R$ 95/saca (B3). Há um ano estava em R$ 51,50/sc. O algodão fechou em R$ 179,84/arroba e estava em R$ 96/arroba há um ano; e o boi gordo em R$ 313/arroba, sensivelmente acima dos R$ 225 no mesmo período do ano passado.
Os cinco fatos do agro para acompanhar em outubro são:
• A evolução do clima e dos elevados custos para o plantio da megassafra 2021/22, e as decisões de compra, venda e plantio; a crise hídrica e as medidas a serem tomadas;
• Os impactos das restrições de exportação de carne bovina, torcendo para a rápida abertura da China;
• A finalização da colheita da safra brasileira, a performance de exportações e o abastecimento interno;
• A crise institucional (política), o câmbio e as perspectivas econômicas com a aceleração da vacinação,
• A finalização da safra americana em outubro. Acompanhar a performance da colheita e os novos números de produtividade e produção.
(*) Marcos Fava Neves é professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEA-RP) da USP
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