Minha cidade grande, Campo Grande.
No horizonte, vejo as veias se entrelaçarem, formando uma imensa teia cinza. São as ruas, vias e avenidas que compõem esse organismo vivo que chamamos de trânsito. Nelas, verdadeiro conglomerado de carros, motos, bicicletas, pedestres e todos os outros que compõe o trânsito, nesse grande campo, dançando uma coreografia caótica e, ao mesmo tempo, encantadora.
No caos aparente, onde engarrafamentos e buzinas fazem a trilha sonora, é possível vislumbrar a essência de uma cidade em movimento. O trânsito é o termômetro da sociedade, refletindo desde as dinâmicas econômicas, nos seus ferozes contrates, até as individualidades cotidiana, nas idas e vidas, encontramos histórias de vida, sonhos, frustrações e amores, que ficaram e que partiram, e que talvez partiram cedo demais, num trânsito que não nos dá uma segunda chance.
Em meio a uma sinfonia de motores, cada veículo é um protagonista nesse emaranhado de possibilidades, grandes ou pequenos, velozes ou lentos, cada um, carrega consigo a história do seu condutor ou passageiro.
Crianças maravilhadas com um trânsito colorido, jovens ansiosos pelo primeiro veículo, mães com pressa de chegar em casa, trabalhadores, que, como disse um dia o pensador, amargam a velha rotina de esperar o seu ônibus que passou e não parou.
O trânsito é palco de encontros e desencontros. Acontecimentos inesperados podem unir desconhecidos por um breve instante. No semáforo ou na faixa de pedestre, é possível trocar sorrisos e olhares com alguém ao lado.
Uma breve conexão que nos faz lembrar que, mesmo em meio ao caos, ainda somos humanos compartilhando o mesmo espaço. Mas há também as tensões do trânsito, o stresse diário, a pressa constante e a impaciência, que se misturam e se manifestam nas adversidades do percurso, batidas, engarrafamentos e longas esperas podem transformar a mera rotina numa batalha silenciosa contra o relógio, batalha que não sabemos quem vai vencer, a pressa ou a vida.
Porém, em meio a essa dança tumultuada, há também a oportunidade de apreciar a paisagem urbana, o trânsito proporciona um novo olhar sobre as construções, a arte nas paredes, a diversidade humana que transita pelas calçadas, pelo grande campo, Campo Grande. É a chance de observar o ritmo frenético da cidade, das buzinas, das sirenes, das freadas bruscas, que compõe uma sinfonia urbana.
O trânsito, mesmo com toda a sua complexidade e contradição, possui a sua própria poesia, onde, cada cidadão se torna um verso em meio a um livro em branco. E assim, nesse palco de apressados e sonhadores, podemos encontrar beleza no caos, enxergar a humanidade nos que tentam fazer do trânsito um lugar para todos, e apesar de todas as dificuldades, estamos juntos, clamando pela vida.
(*) Regina Silva de Abreu é gestora de educação de trânsito.