Parabéns virtuais, professor!
Num ano em que estamos tão próximos dos nossos limites, festejar o dia do professor (ontem, 15 de outubro) ganha um significado estranho. Talvez seja hora de lembrarmos o que temos, de fato, a comemorar sem o romantismo ingênuo da imagem heroica do mestre que tudo suporta e tudo contorna e sem o radicalismo amargo de quem só vê como saída a luta armada.
A pandemia mostrou que os professores são sim comprometidos com a profissão que escolheram e que estão longe de corresponder à desastrosa opinião do ministro da educação de que só segue essa carreira quem não tem outra opção. Quem escolhe ser professor por falta de opção, embora não lhe caiba, não aumenta seu plano de internet, pagando do próprio bolso, para não deixar seus alunos sem aulas. Quem está no magistério por não ter conseguido seguir outra carreira não se supera, aprendendo a manipular aplicativos e plataformas em tempo recorde. Quem é professor por acaso não encara seus fantasmas e medos e se dispõe a gravar vídeos e fazer lives, além de abrir quase publicamente suas aulas à avaliação (e crítica) de todos.
Precisamos comemorar sim o aumento de reconhecimento que estamos tendo por parte dos pais e da sociedade ao assistirem nossa superação enquanto pessoas e enquanto profissionais. As famílias sentiram na pele a dificuldade que é manter crianças e adolescentes concentrados e motivados para aprender e o quanto essa habilidade é digna de parabéns. A sociedade percebeu que ensinar não é habilidade de qualquer um, mas sim característica específica de uma profissão que requer formação contínua.
Vamos comemorar a nossa capacidade de adaptação e criatividade, comprovadas pelas fantásticas atividades propostas no ensino remoto, com destaque especial para nossa invenção dessa modalidade na educação infantil. Professores da educação infantil estão acumulando papéis de motivadores das crianças, curadores de atividades viáveis de desenvolvimento sob a mediação dos pais e treinadores dos pais e responsáveis das crianças para que possam mediar as atividades remotas em casa.
Enfim, sugiro que o dia do mestre em 2020 seja marcado pela consciência do quanto somos capazes de enfrentar adversidades e de superar nossas limitações, porém, é fundamental a consciência de que esse fato não pode ser usado como argumento para a omissão do poder público e dos donos de escolas. Parabéns virtuais, professor!
(*) Júlio Furtado é professor, consultor e escritor