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Cidades

De roupa pet a banho e tosa, comércio animal ajuda na ressocializar presas

Em MS, cerca de 230 empresas que possuem parceria com o sistema penitenciário e empregam 6124 pessoas presas

Por Mylena Fraiha | 23/06/2024 09:35
Reeducandas do EPFIIZ durante expediente de trabalho (Foto: Mylena Fraiha)
Reeducandas do EPFIIZ durante expediente de trabalho (Foto: Mylena Fraiha)

Em uma sala ampla, com mesas grandes e máquinas de costura, quatro detentas transformam tecidos em laços para cães e gatos. O cenário, que lembra o interior de uma fábrica, fica dentro do EPFIIZ (Estabelecimento Penal Feminino “Irmã Irma Zorzi”), localizado no bairro Coronel Antonino, na Capital.

Atualmente, cerca de 104 detentas trabalham de segunda a sexta-feira no presídio feminino. Desse total, 42 são remuneradas. Em geral, elas trabalham seja pela remição de pena ou para aprender uma nova função, de olho em uma futura fonte de sustento fora das grades. Já as empresas e empresários, procuram os presídios para suprir a demanda por mão de obra.

Um desses trabalhos é a oficina de costura e confecção de adereços para pets, para uma das 230 empresas que possuem parceria com o sistema penitenciário de MS, para empregar mão de obra.

Foi uma oportunidade que vou levar para fora. Aprendemos várias coisas, desde o começo ao acabamento, da confecção de gravatas, bandanas e laços", explica a reeducanda do EPFIIZ, Cleo, de 40 anos, que trabalha com a empresa há um ano e 12 semanas.

Cleo é uma das pessoas que trabalha na fabricação de adereços. Ela explica que é a primeira vez que tem contato com esse tipo de trabalho manual e que possivelmente, será seu novo ofício após cumprir sua pena. "Eu aprendi tudo aqui. Tipos de laços, colagens, são coisas que não sabia antes. Agora é algo que vou levar para mim. Quando eu sair para o semiaberto, meu sonho é trabalhar com pet".

Funcionária do PantaPet, Regiane opera máquina de costura durante expediente de trabalho (Foto: Mylena Fraiha)
Funcionária do PantaPet, Regiane opera máquina de costura durante expediente de trabalho (Foto: Mylena Fraiha)

Há cinco anos detida, Regiane, de 40 anos, também é uma das reeducandas do Irma Zorzi que trabalha como costureira por quatro meses, e enxerga isso como uma chance de emprego após sair da prisão.

Eu tinha uma noção básica de costura, mas eu aprendi muito aqui. Hoje sei trabalhar com bordadeiras e outros tipos de máquinas de costura. Quem diria que eu, aos 40 anos, iria trabalhar de costureira. Agora isso será meu recomeço. Hoje os pets são muito bem cuidados, então é algo que quero levar", comenta Regiane.

Rosiane explica explica que sua empresa trabalha exclusivamente com venda de produtos para banho e tosa (Foto: Mylena Fraiha)
Rosiane explica explica que sua empresa trabalha exclusivamente com venda de produtos para banho e tosa (Foto: Mylena Fraiha)

Para a empresária e proprietária da PantaPet, Rosiane Abramo de Paulo, a parceria também tem sido benéfica. Ela explica que sua empresa trabalha exclusivamente com venda de produtos para banho e tosa, como adereços, xampus, sopradores, gaiolas e secadores. No presídio Irma Zorzi, funciona o setor de produção de adereços.

Rosiane recorreu à Agepen após uma recomendação de cliente, uma vez que não encontrava mão de obra interessada no ramo. “A busca desse trabalho foi pela falta de mão de obra dentro do nosso Estado e em Campo Grande. A partir disso, iniciamos com uma quantidade de pessoas, mas hoje a gente duplicou essa quantidade. A nossa ideia é continuar crescendo aqui dentro”, explica.

Hoje, ela explica que tem uma equipe comprometida e capacitada, que poderá atuar no ramo após o cumprimento da pena. “Para estar aqui é preciso estar livre de preconceito e julgamento. Se elas estão aqui, é porque já foram julgadas. Então tento ensinar algo para elas e fazer com que elas tenham uma profissão. Não temos esse medo de competição, porque o objetivo é ajudá-las a encontrar trabalho lá fora", comenta Rosiane.

Gravatas para pets confeccionadas por reeducandas do EPFIIZ (Foto: Mylena Fraiha)
Gravatas para pets confeccionadas por reeducandas do EPFIIZ (Foto: Mylena Fraiha)

Outro exemplo de empresa que recorreu à Agepen para encontrar funcionários foi a pet shop Pet Barber Sóter, da Capital. A loja trabalha com a venda de ração, consultório veterinário e banho e tosa.

De acordo com a proprietária da loja, Tainá de Souza Hoff, a empresa conta com duas funcionárias que atualmente cumprem pena em regime semiaberto. Elas trabalham especificamente no setor de banho e tosa desde dezembro de 2022.

Tainá explica que, após a contratação, ambas as funcionárias passaram por um treinamento com um especialista em estética animal. “Meu sogro trabalhou mais de 10 anos na Agepen, daí ele nos falou sobre esse projeto e nos interessamos. Depois que conheci as meninas, eu mordi minha língua, porque elas são muito responsáveis e aprenderam super rápido a fazer o serviço”, relata Tainá.

Cachorros após banho e tosa feito por reeducandas da Agepen (Foto: Arquivo pessoal)
Cachorros após banho e tosa feito por reeducandas da Agepen (Foto: Arquivo pessoal)

Após essa primeira experiência de contratação, Tainá entende que o projeto da Agepen é uma forma eficaz de ressocializar pessoas privadas de liberdade e oferecer um recomeço. “Acho importante dar esse espaço para elas se ressocializarem e terem uma oportunidade de recomeçar. Acredito que não vão querer voltar ao que eram antes. Elas pedem para continuar trabalhando aqui. A maioria tem família fora, então é uma forma delas ajudarem seus filhos e dependentes. E já tivemos uma menina que inicialmente cumpria pena e depois foi contratada por nós.”

Uma das funcionárias, chamada Marielli, de 37 anos, trabalha na Pet Barber Sóter desde agosto, quando foi transferida para o semiaberto. Ela explica que tem se identificado com o serviço de banho e tosa, além de se sentir bem no ambiente de trabalho. “Tem sido bom para mim, porque gosto de trabalhar com animais. Me identifiquei com o ramo, porque eu fazia Medicina Veterinária antes. Irei trabalhar aqui até cumprir minha pena”, explica.

Funcionária Marielli durante tosa de cachorro na Pet Barber Shop (Foto: Arquivo pessoal)
Funcionária Marielli durante tosa de cachorro na Pet Barber Shop (Foto: Arquivo pessoal)

Trabalho em números - De acordo com a Agepen, atualmente, 6124 pessoas encarceradas estão trabalhando, conforme último relatório do mês de abril de 2024. Desse total, 24,11% dos detentos estão inseridos em trabalhos remunerados.

A chefe da Divisão de Trabalho da Agepen, Elaine Alencar, explica que a remuneração funciona da seguinte forma: Internos do regime fechado recebem 3/4 de um salário mínimo das empresas contratantes, demais regimes 1 salário mínimo, o que equivale a R$ 1.412.

Além do salário, ela esclarece que o trabalho ajuda na redução da pena, pois cada três dias trabalhados diminuem um dia de pena. Importante mencionar que, assim como o trabalho regular, a jornada de trabalho dos encarcerados é de no mínimo 6 e no máximo 8h horas diárias não podendo ultrapassar as 44 semanais.

Fachada do EPFIIZ, no bairro Coronel Antonino, um dos estabelecimentos penais que fazem parceria com empresas (Foto: Mylena Fraiha)
Fachada do EPFIIZ, no bairro Coronel Antonino, um dos estabelecimentos penais que fazem parceria com empresas (Foto: Mylena Fraiha)

Elaine destaca que o trabalho nos presídios, além de fornecer remição de pena e remuneração, oferece aos detentos profissionalização e uma atividade durante o encarceramento. “É uma forma de combater o ócio. O trabalho é um elemento essencial para resistir e suportar a vida encarcerada, tanto pela possibilidade de viabilizar a remição de pena quanto de fazer o tempo passar mais rápido”, comenta.

De acordo com Elaine, para a participação das empresas é necessário apresentar os seguintes itens na Divisão de Trabalho da Agepen: dados pessoais do empregador, CNPJ, comprovantes de endereço residencial e comercial, alvará de funcionamento, requerimento de contratação (papelada fornecida pela Agepen).

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