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Cidades

Justiça do Trabalho libera juízes de MS para morarem em São Paulo e Paraná

Em alguns casos, é cobrado trabalho presencial 3 vezes por semana; noutros, comparecimento é virtual

Aline dos Santos | 03/08/2023 13:05
Prédio do Tribunal Regional do Trabalho, no Parque dos Poderes, na Capital (Foto: Divulgação)
Prédio do Tribunal Regional do Trabalho, no Parque dos Poderes, na Capital (Foto: Divulgação)

O TRT/MS (Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso do Sul) libera juiz para morar até em outros Estados, como São Paulo e Paraná. A situação chama a atenção porque são 11 magistrados com o “salvo-conduto” para não morarem no município de lotação, apesar de o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) determinar que as autorizações para que juízes residam em outras comarcas são excepcionais e devem ser regulamentadas pelos tribunais, de forma fundamentada.

Conforme a Loman (Lei Orgânica da Magistratura), é dever do juiz residir na sede da comarca “salvo autorização do órgão disciplinar a que estiver subordinado”. A regra foi pensada para que o juiz fique próximo e possa ser acionado a qualquer momento. Também cabe a análise de que um juiz, carreiras com muitas benesses, não é um cidadão comum, mas com vida privada condicionada pela função que exerce.

De acordo com denúncia recebida pelo Campo Grande News, as alegações dos magistrados do TRT incluem pais idosos, necessidade de ensino de melhor qualidade para os filhos, profissão de cônjuge e criança com diagnóstico de autismo.

Lotado em Bataguassu, a 335 km de Campo Grande, o juiz Antônio Arraes Branco Avelino mora em Prudente, cidade no interior de São Paulo distante 119 km do local de trabalho.

Conforme informações obtidas por telefone e na agenda dos magistrados, disponível no portal do Tribunal Regional do Trabalho, Antônio Avelino atende presencialmente na cidade de Bataguassu de terça a quinta-feira. Portanto, três dias da semana. Mas, nesta quinta-feira, participa de treinamento em Brasília. No ano de 2022, ele foi notícia no portal G1, no segmento “Prudente e Região”, pelo processo de perda de peso e correr na São Silvestre.

Em Coxim, o juiz Denilson Lima de Souza também faz comparecimento presencial de terça a quinta, conforme apurado pela reportagem na Vara do Trabalho de Coxim. Para que o fluxo de atendimento seja mantido, a unidade também disponibiliza, além do telefone fixo, um número de celular na internet, para dar encaminhamento aos pedidos de contato com o magistrados às segunda e sextas-feiras, dias em que não há atendimento presencial.

Na cidade de Chapadão do Sul, a informação na Vara do Trabalho é de que a juíza Keethlen Fontes Maranhão atende presencialmente três vezes na semana.

Lotada em Amambai, a juíza Fátima Regina de Saboya Salgado tem regime especial de trabalho. De acordo com consulta ao Portal da Transparência, a magistrada recebeu R$ 16.461,81 em diárias para participar do “I Encontro Hispano-Brasileiro Lebrón de Quiñones de Prática Jurídica: Tecnologia e Sistema Judiciário”, realizado de 27 de fevereiro a 4 de março deste ano na Espanha. O custo total da viagem foi de R$ 26.975,02, sendo R$ 10.513,21 com passagem aérea.

Com atual lotação em Jardim, a juíza Anna Paula da Silva Santos tem autorização ao menos desde 2021 para moradia fora da sede de jurisdição. Naquele ano, informou ao TRT que residia em Campo Grande.

A magistrada Lilian Carla Issa, lotada em Corumbá, também foi autorizada a morar fora do município. De acordo com ata de correição (fiscalização), divulgada no mês passado, a titular comparece de segunda a sexta-feira, mas na modalidade virtual.

“A magistrada está em regime especial de trabalho e lhe foi assegurada a prestação de serviços em Campo Grande/MS, por meio de exercício da atividade em regime de teletrabalho”, informa o documento, que também elogia a juíza.

“A juíza titular realiza todas as audiências sem auxílio de servidor (secretário), lavrando sozinha a ata da sessão e gerenciando o sistema de videoconferência (ZOOM) e realizando todos os lançamentos corretos (...). Tal medida mostrou-se extremamente eficaz na produtividade da Unidade, pois desonerou um servidor, que passou a dar apoio integral aos expedientes internos da Secretaria”, diz a nota em defesa da magistrada.

Contudo, nas recomendações à Vara do Trabalho de Corumbá, destaca que o juízo deve se abster de realizar audiências telepresenciais, “ressalvada as audiências a serem presididas pela Juíza Titular da unidade que possui condição especial de trabalho”.

A lista de autorizações ainda tem Izabela Ramos (lotada em São Gabriel do Oeste), Leonardo Ely (Fátima do Sul), Geraldo Araújo (substituto em Dourados), Hélio Duques (substituto em Dourados) e Vivian Oliveira (substituta em Três Lagoas).

O salário de um juiz do TRT/MS é de R$ 35.710,45. Mas, conforme o Portal da Transparência do CNJ, teve juíza que recebeu até R$ 81.303.37, resultado do salário, mais R$ 17.989,27 de indenizações e R$ 27.603,65 de direitos eventuais.

Motivos – De acordo com o Tribunal Regional do Trabalho, três magistradas estão autorizadas a ter condições especiais com amparo em resolução do CNJ. Lilian Carla Issa está autorizada a residir em Campo Grande porque sua filha sofre de TEA (Transtorno do Espectro Autista) e, conforme laudos periciais, não se adaptaria à mudança de residência e não teria o tratamento adequado em Corumbá.

Fátima Regina de Saboya Salgado está autorizada a residir em Campo Grande porque o neto, de quem obteve a guarda, sofre de Transtorno do Espectro Autista e, conforme laudos periciais, não se adaptaria à mudança de residência e não teria o tratamento adequado em Amambai.

Sobre a viagem para a Espanha da magistrada que não poderia residir em Amambai, o TRT informa não haver irregularidade. “A Dra. Fátima mora em Campo Grande/MS, mas, além das suas atividades jurisdicionais, é Vice-Diretora da Escola Judicial, e foi à Espanha como representante da escola, em evento histórico, pioneiro no intercâmbio do tribunal em parcerias institucionais com outros países”.

A juíza Vivian Oliveira (substituta em Três Lagoas) está autorizada a residir, temporariamente, em Apucarana/PR, por força de gestação de risco, que contraindica deslocamentos.

Conforme o tribunal, as demais autorizações são concedidas com base em permissão da Constituição Federal e pela Lei Complementar 35/1979, que rege a magistratura.

Internamente, resolução administrativa do TRT determina o preenchimento dos seguintes requisitos: ausência de processo administrativo disciplinar em curso; ausência de punição em processo administrativo disciplinar nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores à solicitação e, em caso de deferimento da autorização, durante todo o período em que ela vigorar; ausência de fundadas reclamações perante a Presidência, a Corregedoria ou a Ouvidoria acerca do deficit na prestação jurisdicional em decorrência da ausência do magistrado na unidade judiciária em que estiver lotado.

Além de ausência de processos aptos a julgamento cujo prazo para prolação de sentenças tenha sido extrapolado; cumprimento da carga horária mínima de horas-aula estipulada pela Escola Judicial do TRT da 24ª Região, nos 2 (dois) últimos semestres anteriores e, em caso de deferimento da autorização, durante todo o período em que ela vigorar; e comparecimento à unidade jurisdicional em pelo menos 3 (três) dias úteis na semana.

Qualidade – Ainda conforme o Tribunal Regional do Trabalho, as autorizações não afetam a qualidade do serviço prestado aos trabalhadores. “Os juízes trabalham todos os dias, sem exceção, mas são obrigados a comparecer, no mínimo, três vezes por semana à sede da Vara do Trabalho. Nos demais dias, são obrigados a trabalhar, igualmente, e expõem, no site do tribunal, os locais onde podem ser encontrados”, diz a nota enviada ao Campo Grande News.

O TRT destaca que foi o único do Brasil a cumprir todas as metas do Conselho Nacional de Justiça e vários dos juízes que residem foram da jurisdição são multipremiados pelas destacadas performances. “A Juíza Fátima, por exemplo, comanda a Vara do Trabalho de Amambai, que, invariavelmente, é apontada entre as 10 melhores das 1.507 do país, além de ter ganhado, por 4 anos consecutivos, o Prêmio Labor Et Honoris de melhor vara do TRT da 24ª Região. Outros magistrados, como Anna Paula, Antonio Arraes, Keethlen e Hélio Duque dos Santos já receberam o mesmo prêmio”.

Ainda de acordo com o tribunal, não há um registro sequer de queixas por parte da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Ministério Público, sindicatos, empresas ou cidadãos, na Corregedoria, Ouvidoria ou Presidência do tribunal acerca de falta ou queda da qualidade de atendimento por essa razão.

“Sempre que houver alguma justificativa ou prejuízo à jurisdição, o TRT prontamente revogará as autorizações”, diz o comunicado enviado à reportagem.

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