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Capital

Em uma semana, 75 famílias trocam apenas endereço de barracos

Agora com água e luz, favela apenas mudou de local

Natalia Yahn e Aline Santos | 14/03/2016 12:39
Gabriel, 3 anos, viu um hidrômetro pela primeira vez. (Foto: Fernando Antunes)
Gabriel, 3 anos, viu um hidrômetro pela primeira vez. (Foto: Fernando Antunes)

Uma semana após o início da ação para desocupar a favela Cidade de Deus, na região do lixão de Campo Grande, apenas 75 famílias (de um total de 390) foram transferidas para duas áreas, 50 estão no Bairro Vespasiano Martins e outras 25 em um terreno vizinho ao local onde os moradores viviam até a semana passada.

Poucos passos separam o barraco da favela ao “novo” construído no espaço destinado pela Prefeitura para ser oficialmente de cada morador. Enquanto a esperança prevalece entre os que foram tirados da Cidade de Deus para a área com promessa de ser regularizada, os moradores ainda não receberam nenhum documento oficial, garantindo a posse do terreno.

Separados por cores – amarelo, azul, rosa, laranja e lilás – todos dividem dúvidas e sonhos, principalmente o da casa própria. Os moradores que tiveram o barraco marcado com a cor azul são removidos para a área ao lado da favela, se dizem satisfeitos com a mudança. A previsão é de que ainda hoje (14), outras 23 famílias sejam encaminhadas para o local.

Gabriel tem 3 anos e pela primeira vez viu um hidrômetro – aparelho que mede o consumo de água –, que apelidou de “roda roda”. “Ele quer arrancar pra ele. Ficou doidinho com o hidrômetro”, disse a mãe Carolina da Conceição, 34 anos, que se mudou para o terreno na sexta-feira (11), junto com o marido e outros dois filhos de 14 e 9 anos.

Ela é da “turma do azul” - como os moradores se referem a divisão de cores –, e precisou convencer uma assistente social da Prefeitura, para que a filha mais velha e já casada, que também vive na Cidade de Deus, ficasse no área considerada a melhor pelos moradores da favela.

Teresa de Araújo ainda aguarda remoção da Cidade Deus. (Foto: Fernando Antunes)
Teresa de Araújo ainda aguarda remoção da Cidade Deus. (Foto: Fernando Antunes)

“É porque é perto de onde a gente já morava. Não assinamos nenhum documento, mas estamos confiantes de que vamos ter um terreno. Minha filha ganhou bebê e teve depressão pós parto. Era melhor ela ficar perto de mim, mas falei com a assistente social e consegui”, afirmou Carolina.

A mudança de apenas poucas quadras, gerou alguns transtornos, ela reclama que os poucos pertences estragaram quando foram tirados do caminhão. “Estragou o pouco que eu tinha. Meu guarda roupas e as telhas. Fora isso ficamos até quase meia noite no sereno até construírem uma pecinha pra gente entrar. Meu filho de 14 anos é autista e só comeu na sexta-feira, porque um guarda deu uma marmita pra ele”, reclamou a moradora.

Ainda em dúvida sobre como fazer o banheiro da família, antes de receber orientação, decidiu fazer uma fossa. “Aqui já é melhor, porque é meu. Agora vamos erguer o banheiro, ficar sem não dá”, disse.

Outra moradora já instalada na área azul – ao lado da favela – é Aida Chaves, 43 anos, a primeira a se mudar para o local na sexta-feira (11). “Eu fui a primeira. No fim de semana meus sobrinhos vieram para ajudar a construir o barraco, que já é maior do que o anterior. A televisão está até funcionando”.

Ela comemora por agora ter energia elétrica e água, após quatro anos vivendo na favela e usando ligações clandestinas. “É uma benção. E o kit favela, com a lona eu usei para fazer uma cobertura na frente”. Mas o banheiro também é um problema para ela, que usa o da irmã – ainda instalada na favela. “Eu tenho que ir lá para usar. Não sei se pode ou não fazer fossa”.

No Vespasiano Martins, estacas marcam locais onde devem ser construídas casas. (Foto: Fernando Antunes)
No Vespasiano Martins, estacas marcam locais onde devem ser construídas casas. (Foto: Fernando Antunes)

A diretora-presidente da Agereg (Agência e Regulação dos Serviços Públicos Delegados), Ritva Viera, acompanhava a instalação dos hidrômetros na manhã desta segunda-feira na nova área ao lado da Cidade de Deus e explicou o que será feito. “Vai passar saneamento básico, mas por enquanto será fossa mesmo, até fazer a ligação”.

Incerteza - Enquanto está tudo azul na área vizinha a Cidade de Deus, para onde devem ser encaminhadas 48 famílias – 25 já estão no local – outros moradores ainda convivem com dúvidas, incertezas e preocupação.

“Estou aflita, não sei quando e para onde eu vou. Tem uma semana que estou com as minhas coisas arrumadas. Tenho medo de sair para ir no posto de saúde pegar meu remédio e não estar aqui na hora da mudança. Vou confiar em Deus, para que tudo dê certo”, disse a idosa Teresa de Araújo, 71 anos, que teve o barraco marcado com a cor amarela.

Mariana Jurubi, 34 anos, é da “turma do azul”, mas ainda não deixou a favela. “Estou com a roupa arrumada para mudar, mas ainda esperando. Acho que a prefeitura deveria dar pelo menos uma cesta básica, já que o lixão está fechado e a maioria das pessoas está sem trabalho. Ninguém tem dinheiro, a gente fica numa situação assim, que só Deus sabe”, afirmou.

No terreno do Vespasiano Martins na frente de alguns barracos já é possível ver marcações com estacas e barbantes. Alguns moradores afirmam que a Prefeitura fez a instalação que seria para iniciar a construção das casas no local.

“Não explicaram muito, disseram que era para a casa”, disse Amanda da Silva, 16 anos, que era da “turma do rosa” e se mudou para a área com a mãe, a irmão e uma sobrinha de 3 anos. “A gente tem esperança da obra parada da creche seja retomada, para colocar as crianças por perto”, disse ela.

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