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Capital

Falta de contraste é crônica em hospitais públicos há meses

Guerra da Ucrânia é principal alegação para ausência do medicamento

Lucia Morel | 23/02/2023 19:29
Uma das pacientes à espera de cateterismo no HRMS. (Foto: Arquivo pessoal)
Uma das pacientes à espera de cateterismo no HRMS. (Foto: Arquivo pessoal)

João Pinho de Oliveira, de 58 anos esperou 30 dias por um exame no no Humap (Hospital Universitário Maria Aparecida Pedrossian) devido à falta de contraste no final do ano passado. Acabou sendo transferido para a Santa Casa para poder passar pelo procedimento e foi novamente levado para o HU, onde passou por cirurgia para desobstruir artéria do pescoço e acabou não resistindo.

A família procurou o Campo Grande News na época em que João esperava pelo exame com contraste e segundo o filho dele, de mesmo nome, o Humap acabou encaminhando o paciente para outro hospital devido a insistência. “Se a gente soubesse que ia acabar dessa forma, acho que teria trazido ele pra casa”, lamentou Júnior, lembrando que o pai morreu ao ter uma parada cardíaca durante a cirurgia no pescoço.

Agora, esse tipo de reclamação voltou ao Campo Grande News e o caso de Mauro Augusto Moreira Medeiros, de 60 anos, está revoltando a esposa, Marilu Rodrigues da Cunha Medeiros, 58. Ele está desde a semana passada internado no Hospital Regional de Mato Grosso do Sul esperando por cateterismo, mas não pode realizar o procedimento porque não há estoque de contraste no hospital.

“Ele já teve três infartos e precisa fazer duas cirurgias: uma de vesícula e outra por causa de uma rendidura na barriga, mas só pode passar por elas se fizer o cateterismo”, conta Marilu. Ela diz ainda que já pediu a transferência dele para outra unidade hospitalar, mas nada foi feito. “E mesmo faltando tudo, também não liberam ele daqui”, lamentou, reforçando que “ele ficando aqui, vai acabar tendo outro infarto”. O marido já foi vítima de três.

Em contato com o HR, a reportagem não teve retorno até a publicação deste material. Entretanto, em material publicado antes de ontem de outra família reclamando da ausência de contrastes no local, o hospital informou que “o processo emergencial para compra de contrastes [para a realização de cateterismo] está em andamento. No momento, o HRMS possui seis frascos (contendo 50 ml cada) que estão em medida de contingenciamento, a serem autorizados pela diretoria técnica mediante a gravidade do caso”.

Apesar da unidade hospitalar ter informado que a aquisição está em andamento, a reportagem pesquisou tanto no Diário Oficial quanto no Portal da Transparência para verificar se após dezembro, quando compra dos medicamentos foi barrada por investigação do Ministério Público, houve nova abertura de processo. No entanto, nada foi encontrado.

No ano passado, devido principalmente à guerra na Ucrânia, a importação do medicamento começou a ficar deficitária. Em dezembro, foram seis meses de escassez do remédio. Apreensões de contrastes contrabandeados feitas pelas polícias foram repassadas aos hospitais e deram suporte temporário à demanda. Agora, no entanto, o problema vem novamente à tona, completando cerca de oito meses da dificuldade.

Outros hospitais – a reportagem entrou em contato com outros estabelecimentos de saúde que atendem pelo SUS (Sistema Único de Saúde) para saber se também há falta do medicamento. A Santa Casa informou que “assim como demais hospitais da cidade e do país, ainda encontra dificuldade na aquisição da substância química usada no exame de cateterismo (CAT), o contraste, que está em falta no mercado”.

Licitações da Fundação de Saúde de MS entre outubro do ano passado e março deste ano não prevêem compra de contraste. (Foto: Reprodução)
Licitações da Fundação de Saúde de MS entre outubro do ano passado e março deste ano não prevêem compra de contraste. (Foto: Reprodução)

O hospital disse que adotou esquema de contingência no uso do contraste, que tem sido usado de forma “racional para garantir que os exames de Urgência e Emergência e em pacientes internados sejam realizados de forma segura, conforme também sugeriu o Ministério da Saúde em junho de 2022, quando houve falta total do produto em todo o país”.

Por fim, informou que “mesmo com o mercado apresentando indícios da falta do produto desde o começo do ano de 2022, a quantidade que o hospital dispõe atualmente é suficiente para atender os pacientes internados. E vale ressaltar que essa garantia do abastecimento se deu por meio de contrato, porém, o montante entregue à Santa Casa, pela empresa, representa cerca de 40% a 50% do acordado, ocasionado pela falta do material nas indústrias”.

No Humap, a nota retorno divulgou que o problema é mundial e que a crise do abastecimento afeta hospitais de todo o Brasil. “As poucas fábricas de contraste iodado, na China – principal fornecedor para a indústria brasileira – na Índia e no Leste Europeu, não estão conseguindo suprir a demanda global”.

Também disse que houve aumento da demanda, “com o número de exames de imagem, com utilização de meio de contraste, em níveis bem acima daqueles observados no período pré-pandemia. Isto é explicado pela demanda reprimida durante a pandemia e pelos investimentos em saúde, feitos emergencialmente durante a COVID-19 (no caso, aquisição de tomógrafos)”.

O documento enviado ao Campo Grande News comenta ainda que há “no mundo, escassez do iodo, elemento químico essencial nas formulações dos meios de contraste usados em tomografia, além de ter havido interrupção, provisória, do fornecimento dos meios de contraste por uma das empresas com importante fatia deste mercado”.

Por fim, “na data de hoje (23/02/2023) o Humap recebeu frascos de contraste adquiridos através de compra emergencial (carona na Ata do Hospital Militar do Rio de Janeiro) que visa normalizar os atendimentos de seus pacientes. O Humap possui processo regular para aquisição de contraste que está na fase de pregão”.

A Sesau (Secretaria Municipal de Saúde) em Campo Grande, por sua vez, informou que “todos os serviços com uso de contraste que são ofertados pelo município são realizados por prestadores de serviço, e é de responsabilidade destes a disponibilização de insumos para a realização dos procedimentos”.

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