Membros de facção oferecem até dinheiro para matar rivais em Dourados
Funcionários relatam que ofertas para abrir e deixar celas desprotegidas chegam a até R$ 10 mil. "Dizem que vão até facilitar nossa vida pois não deixarão nenhum vivo", diz agente
Membros do Comando Vermelho que estão detidos no presídio de Dourados (a 233km de Campo Grande) ofereceram até dinheiro para que agentes penitenciários do local fizessem vista grossa e assim tivessem o caminho livre para matar integrantes do rival PCC (Primeiro Comando da Capital).
A revelação, feita por um funcionário do local que não quer se identificar, é mais uma amostra do nível de tensão que vive os presídios do Mato Grosso do Sul após o racha entre as duas principais facções criminosas do País, que motiva rebeliões e provocou até o momento a morte de 91 pessoas na região Norte só neste ano.
Na noite da última terça-feira (3), um princípio de motim no presídio foi registrado após um drone supostamente deixar armas, drogas e celulares em um dos pátios do local. Oficialmente, a Agepen (Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário) diz que nenhuma arma fora localizada vinda do aparelho, apreendido.
“Uma (facção) acha que a outra está armada e a situação é catastrófica. Estamos com medo. Não tem como segurar por muito tempo”, disse o funcionário ao Campo Grande News.
A PED (Penitenciária Estadual de Dourados) possui três pavilhões. PCC e Comando Vermelho dominam cada um o seu, enquanto o terceiro é ocupado por detentos que correm risco de morte ou precisam ficar isolados por terem rixas com os dois bandos.
Desde terça-feira, a rotina de agentes penitenciários ouvidos pela reportagem vem sendo a de acalmar os ânimo e tentar, em vão admitem, os ânimos.
“O tempo inteiro gritam palavras de horror uns aos outros, que vai estourar, vão pegar, estripar. Os caras do Comando Vermelho chegaram a oferecer R$ 10 mil para abrirmos as celas. Dizem que nosso trabalho seria facilitado até, pois muitos inimigos morreriam”, disse.
Mandante – Diferente do que apontavam as evidências, investigação preliminar da Sejusp (Secretaria Estadual de Justiça e Segurança Pública) aponta que o drone teria como destino os integrantes do Comando Vermelho e seria organizada por Fausto Xavier de Figueiredo, 36 anos, apontado como líder da oposição ao PCC no Estado, conforme revelou o campo Grande News.
Beneficiado com um alvará de soltura no final do ano passado, Figueiredo liderou rebeliões no Mato Grosso, foi espancado pelos rivais da facção criminosa paulista e transferido sete vezes no sistema prisional sul-mato-grossense por questões de segurança.
Condenado por latrocínio (morte em assalto) no estado vizinho, era um experiente ladrão de bancos que se aproximou do Comando Vermelho após desbravar a rota da cocaína e das armas do Paraguai para o Sudoeste sem passar pelo PCC, que o jurou de morte.
Áudios interceptados pelo setor de inteligência da Agepen mostram o acusado falando abertamente em guerra, matar os inimigos e traçando planos ousados, como atacar um ônibus de transferência de detentos rivais para o presídio da Gameleira a tiros e bombas.
Além de Dourados, a situação é considerada crítica depois de Makanaky Nobre dos Santos Nascimento, 26, ser encontrado morto por enforcamento na manhã desta sexta-feira (7) em uma cela do presídio de Segurança Máxima de Campo Grande.
Vídeo também interceptado pela Agepen mostra supostos integrantes do PCC festejando o assassinato do rival.
Instabilidade – Apesar da morte de Nascimento, os presídios do Mato Grosso do Sul ainda não registraram conflitos graves entre as facções. Situação diferente da região Norte do país.
A guerra entre duas facções, que já matou mais de 100 pessoas no país, teria explodido em setembro do ano passado, depois de um “comunicado” que uma das facções emitiu, o “Salve Geral do PCC”, decretando o fim da aliança com Comando Vermelho.
O texto foi escrito a mão, na Penitenciária de Presidente Venceslau, em São Paulo, onde fica a cúpula do PCC. Possivelmente foi transportada por algum advogado ou visitante e enviado às prisões brasileiras dominadas pela facção. O “salve” se espalhou.
Depois disso, de outubro até hoje, presos foram assassinados em presídios de Roraima, Rondônia, Amazonas, Ceará. Com destaque para a chacina ocorrida no dia 1º deste mês, em Manaus (AM), quando 60 presos foram mortos, e a segunda matança ocorrida nesta sexta-feira (06), em Roraima, com mais 31 mortos.
“Lugar de alemão (gíria para inimigo) é no inferno. Tem que matar cada um deles e na faca, como fizeram com os nossos”, disse um suposto detento aliado do Comando Vermelho que foi apreendido por agentes penitenciários no presídio de Dourados.
Alerta - Segundo o diretor-presidente da Agepen, Ailton Stropa, o Estado tem procurado proibir de todas as maneira o uso do celular, tanto impedindo a entrada quanto coibindo a permanência do aparelho com operações "pente-fino" rotineiras.
Sobre a guerra entre as facções, Stropa afirma que há um alerta. “Estamos preocupados, porém preparados. Não há indicativo para a ocorrência de chacina no nosso Estado, mas a Agepen trabalha a situação minuto a minuto com a gerência de inteligência para reverter possíveis ocorrências e tomar providências preventivas”, relata.
Conforme o diretor-presidente, também houve reforço na segurança nos presídios. “O Estado já tinha se antecipando a isso quando iniciou o concurso para contratação de novos agentes e esses agentes já estão fazendo estágio nas unidades, além disso, há reforço através da Polícia Militar, que aumentou o efetivo nas muralhas e mantém o Batalhão de Choque totalmente mobilizado para atender qualquer ocorrência”, afirma.
Ainda na sexta-feira, o Sindicato dos Servidores da Administração Penitenciária de Mato Grosso do Sul emitiu nota pedindo atenção aos agentes, cuidado no trabalho e nas ruas e cautela nos trabalhos neste final de semana.