Praças abandonadas deixam crianças da periferia sem direitos básicos
Conforme o Centro fica distante, somem as opções de lazer e outros direitos básicos da garotada
A data comemorativa avisa que o dia é dos pequenos. Em Campo Grande, contudo, alguns deles têm que brincar na rua, nos campinhos de futebol com traves enferrujadas ou no quintal dos amigos.
“Aquilo ali está uma nojeira, os adultos vêm, se penduram, as crianças nem conseguem usar”, conta Matheus Lima da Silva, 14, apontando o parquinho da Praça Marcelo Rodrigues de Araújo. O estudante cresceu no bairro Universitário, região urbana do Bandeira. No cantinho de areia com os brinquedos, um forte odor de urina e lixo jogado denunciam o abandono.
“Eu estava com meus primos jogando bola aqui, tem que ser futebol, porque basquete não dá”, continua ele. A tabela com a cesta não está mais na quadra da praça, que é a única opção de lazer do bairro com 6.930 habitantes menores de 18 anos. O adolescente contou ainda que de noite usuários de droga tomam conta do local. “Família mesmo só pode vir até as 16h”.
A situação não é exceção. No Vespasiano Martins, região Sul da Capital, nem praça abandonada tem. O local de lazer é um campinho de terra batida. “Só brinco aqui e na beira daquela árvore, de tocar bola”, explica Luiz Vinícius, de 11 anos, avisando que quer ser atacante.
E não ter lugar para brincar é uma realidade que pode atrapalhar no desenvolvimento e formação das crianças, tanto é que é um direito garantido por lei. O Estatuto da Criança e do Adolescente, criado em 1990, diz que municípios, com ajuda da União, “estimularão e facilitarão a destinação de recursos e espaços para programações culturais, esportivas e de lazer voltadas para a infância e a juventude.”
Já o artigo 227 da Constituição aponta o dever do Estado e da sociedade garantir acesso ao lazer tanto quanto à saúde, educação.
Direitos básicos - Falando nisso, saúde e educação também faltam no Vespasiano Martins. “Aqui não tem nada. Tive que esperar um mês para passar minha filha no médico lá na Cidade Morena, porque ficou sem pediatra, só agora que voltou”, conta Dayene Reis, 22 anos, desempregada, com o filho de oito meses, Cauan, no colo.
“Sempre escutamos que tem uma creche que nunca fica pronta e aqui perto não tem nem postinho, só no Los Angeles”, relata Bruno Alberto, 27, que trabalha em uma fábrica de ração e acaba de se mudar para o bairro com seus três filhos. “Começaram a construir, mas pararam”, complementa Dayene.
Na área da saúde, a Prefeitura enfrenta um déficit de pediatras para atender tanto as UPAs (Unidades de Pronto Atendimento) quanto as UBS (Unidades Básicas de Saúde), onde as crianças deveriam ter seu crescimento acompanhado por um médico.
Segundo o órgão, o problema está na falta de profissionais. Primeiro, haveriam poucos pediatras disponíveis para contratação e para o expediente diurno porque eles se concentrariam especialmente em clínicas particulares e consultórios próprios durante o dia. Outra justificativa apontada para a baixa é o alto número de demissões dos profissionais durante a gestão de Gilmar Olarte (PROS). Foram 320, segundo a Sesau (Secretaria Municipal de Saúde).
Já as creches são outro problema. São 18 sendo construídas, algumas delas aguardadas há anos pela população. A do Jardim Noroeste, por exemplo, é prometida desde 2012, mas ainda está só no esqueleto. Enquanto isso, a fila da Capital acumula 10 mil crianças a espera de uma vaga na creche.
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