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Cidades

Esquema de desvio teria “laranja do laranja” e até divórcio simulado

Repertório faria parte das estratégias para ocultar a origem do dinheiro

Aline dos Santos | 18/05/2016 13:04
Com foco na lavagem de dinheiro, operação foi realizada em 10 de maio(Foto: Fernando Antunes)
Com foco na lavagem de dinheiro, operação foi realizada em 10 de maio(Foto: Fernando Antunes)
Elza seria "laranja" de Amorim e Giroto. (Foto: Marcos Ermínio)
Elza seria "laranja" de Amorim e Giroto. (Foto: Marcos Ermínio)

A segunda fase da operação Lama Asfáltica, com investigação centrada no crime de lavagem de dinheiro, aponta simulação de divórcio, empréstimos, “laranja” em duplicidade (pessoa que empresta o nome para transações financeiras fraudulenta) e “laranja do laranja”. De acordo com o inquérito da PF (Polícia Federal), o repertório faz parte das estratégias para ocultar a origem do dinheiro, apontada como desvio de recursos.

A primeira fase, realizada em 9 de julho de 2015, trouxe à tona um suposto esquema de superfaturamento de obras envolvendo empresas, servidores públicos e integrantes da cúpula da ex-administração estadual. Passados dez meses, a etapa batizada de Fazendas da Lama aponta que integrantes do grupo recorreram a filhos, esposas, cunhado, terceiros e a simulacro de divórcio para ocultar bens.

Conforme consta na decisão de bloqueio de bens, são consistentes os elementos de que o empresário João Amorim, seus familiares e sua ex-secretária e atualmente sócia Elza Cristina Araújo dos Santos do Amaral tenham, em tese, praticado o delito de lavagem de dinheiro. A estratégia incluía a participação das empresas Idalina Patrimonial, Agropecuária Idalina Participações, Bosforo Participações, Raiz Participações, Agropecuária Baia Participações, Kamerof Participações, além da Proteco Construções e ASE Participações. Um dos caminhos recorrentes era a compra de fazendas.

Após análise e perícia nos documentos apreendidos na Lama Asfáltica (1ª fase), descobriu-se que algumas fazendas foram adquiridas em nome da empresa Idalina Patrimonial, que tem como sócias as três filhas de João Amorim: Ana Paula Amorim Dolzan, Ana Lúcia Amorim e Renata Amorim Agnoletto.

João Amorim (centro) é suspeito de ocultar bens em nome de filhas. (Foto: Marcos Ermínio)
João Amorim (centro) é suspeito de ocultar bens em nome de filhas. (Foto: Marcos Ermínio)
Giroto e Rachel foram presos na operação Fazendas de Lama.
Giroto e Rachel foram presos na operação Fazendas de Lama.

Elas foram presas em 10 de maio e somente Ana Paula continua presa, mas em regime domiciliar. Foram identificadas 11 propriedades relacionadas a pessoas e empresas da família Amorim. Ana Paula não tinha atividade econômica, mas assinava cheques a mando do pai. Para a a investigação, são indícios de que Ana Paula atuava como "laranja" de forma consciente.

Laranja do laranja – Apontada como “testa de ferro” em João Amorim, Elza Amaral é suspeita de ter recorrido à estratégia similar para ocultar bens. De três veículos encontrado em sua residência, ela relatou que dois eram do seu noivo. Para a investigação, há indício de que o noivo possa atuar como “laranja” de Elza, “tendo em vista a desproporção entre as renda por ele recebida e a propriedade de veículos automotores, sendo que um deles custa, aproximadamente, R$ 171 .000,00”.

Também é investigado se Elza atuou como “laranja” de Edson Giroto (ex-secretário de Obras e ex-deputado federal). Conforme material apreendido, em junho de 2012 Giroto e a esposa venderam apartamento no edifício Manoel de Barros para o sócio de uma empresa de engenharia. O valor da transação foi de R$ 1,5 milhão, parcelado em 15 vezes. Em novembro de 2014, Elza adquiriu o mesmo apartamento e pelo mesmo valor de venda em 2012. Ela afirmou que não sabia que o apartamento tinha sido de Giroto.

Para a operação, o fato indica possível simulação de alienação do apartamento para gerar renda na declaração de Giroto à Receita Federal, mas a propriedade do imóvel permaneceria com o grupo.

Cunhado, filhos e esposas – A operação suspeita que Giroto tenha feito o cunhado Flávio Henrique Garcia Scrocchio de “testa de ferro”. Flávio, que chegou a ser preso no dia 10, é sócio da Terrasat Engenharia e Agrimensura, empresa que firmou contratos de R$ 52 milhões com a Agesul (Agência Estadual de Gestão de Empreendimentos) entre 2013 e 2015. O contrato de compra e venda da Terrasat foi localizado na residência de Giroto, suspeito de ser o proprietário de fato.

Operação no dia 10 de maio apreendeu reais e dólares.  (Foto: Divulgação)
Operação no dia 10 de maio apreendeu reais e dólares. (Foto: Divulgação)

Rachel Rosa de Jesus Portela Giroto, esposa do ex-secretário, chamou a atenção da investigação por ser dona de uma salão de beleza apontado como responsável por distribuir lucros e justificar as origens de valores decorrentes de transações suspeitas. A empresa foi aberta em 2012 e baixada em 2015. Ela ainda teria sido responsável por fazer um empréstimo a Edson Giroto, valores cuja origem não foi declarada. 

Giroto também é apontado como sócio de Mariane Mariano de Oliveira em fazendas. Mariane é filha de Wilson Roberto Mariano de Oliveira, o Beto Mariano (servidor da Agesul, ex-deputado e ex-prefeito). Além de registro de fazendas, a movimentação financeira inclui doações do pai para a filha.

A distribuição de bens entre parente também foi apontada no caso do servidor público Hélio Yudi Komiyama, que era gerente de obras viárias da Agesul. O capital seria dissimulado por meio da esposa, filho e filha. Para a investigação, a movimentação é incompatível com a renda de funcionário público. Muitos pagamentos foram em espécie, o popular “dinheiro vivo”. Como R$ 16 mil de parte da aquisição de veículo BMW e R$ 197 mil como parte de prestações de apartamento. A remuneração líquida do servidor era em torno de R$ 11 mil.

Maria Vilma Casanova, ex-presidente da Agesul, é suspeita de direcionar bens para o marido. A evolução patrimonial se acentuou em 2010, quando passou a ocupar cargo estratégico.

Divórcio simulado - Conforme parecer do MPF (Ministério Público Federal), relatórios da Receita Federal demonstraram que André Luiz Cance (ex-secretário-adjunto da Secretaria Estadual de Fazenda) provavelmente oculta patrimônio em nome da ex-esposa Ana Cristina Pereira da Silva e em nome do “laranja” Evaldo Furrer Matos. 

Resultados da segunda etapa foi apresentado em coletiva com representantes da CGU, PF e Receita Federal. (Foto: Fernando Antunes)
Resultados da segunda etapa foi apresentado em coletiva com representantes da CGU, PF e Receita Federal. (Foto: Fernando Antunes)

Os três foram presos no dia 10 de maio, mas já estão em liberdade. Segundo o documento, o dolo em ocultar os ativos é tão evidente que o casal simulou divórcio para não levantar suspeita sobre o crescente patrimônio em nome de Ana Cristina. De R$ 1,1 milhão (2010) para R$ 16,2 milhões (2014). A separação foi em 2012, mas há indícios que vivem como casal na mesma residência.

Conforme a investigação, são os seguintes indícios de tentar ocultar bens: movimentações financeiras atípicas, transações imobiliárias suspeitas, possíveis criações de receitas e eventuais omissões de rendimentos. Já Evaldo é suspeito de ser “laranja” de Cance na compra de fazendas. A Justiça Federal determinou bloqueio de R$ 43,1 milhões dos investigados.

Dos 15 presos, oito tiveram a prisão temporária convertida em preventiva: Beto Mariano, Mariane Mariano de Oliveira, Edson Giroto, Rachel Giroto, João Amorim, Ana Paula Amorim Dolzan, Elza Amaral e Flávio Scrocchio.

Defesa – Na última segunda-feira (dia 16), a defesa de Beto Mariano e Mariane Mariano informou que o patrimônio não é irregular e que não há lavagem de dinheiro na aquisição de fazendas. De acordo com o advogado Hilário Carlos de Oliveira, Mariane recebeu doação lícita do pai, que vendeu gado. Formada médica, ela ampliou o patrimônio e tem a terça parte de três fazendas.

“Qualquer fazendeiro que não precisa da fazenda para sobreviver, aumenta o patrimônio violentamente, é normal”, diz.

Também no dia 16, a defesa de Hélio Komiyama informou que ainda não existe processo e que não se manifestaria na fase de inquérito. A reportagem não conseguiu contato com a defesa dos demais citados.

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