MP vai investigar morte em hospital sem médico como homicídio
Supervisor das Promotorias de Justiça Criminais mandou apurar omissão no atendimento a acidentado morto domingo em Dourados
O Ministério Público de Mato Grosso do Sul vai investigar crime de homicídio decorrente da omissão de atendimento ao motociclista Roberto Gonçalves Braga, 34, que morreu após acidente de trânsito na noite de domingo (21) em Dourados, a 233 km de Campo Grande.
Socorrido pelo Samu (Serviço Móvel de Urgência) após bater na traseira de um carro na Avenida Marcelino Pires, Roberto foi levado para o Hospital da Vida, onde teve paradas cardíacas e morreu em decorrência dos ferimentos.
No momento, não havia médico plantonista no pronto-socorro do hospital, conforme citaram no prontuário de atendimento o médico intervencionista e o enfermeiro do Samu que socorreram o motociclista ao hospital. O caso foi mostrado pelo Campo Grande News na terça-feira (23).
Em despacho assinado ontem, o promotor Cláudio Rogério Ferreira Gomes, supervisor das Promotorias de Justiça Criminais de Dourados, determinou a remessa do caso para uma das promotorias criminais para análise e subsequente providências para apurar a responsabilidade de todos os envolvidos.
Cláudio Gomes também determinou encaminhamento de cópia da denúncia para a 16ª Promotoria de Justiça, para investigar eventual improbidade administrativa.
Por fim, mandou enviar cópia para a 10ª Promotoria, que tem atribuição de defender os direitos constitucionais dos cidadãos, “por tratar-se de questão que também afeta a vida e saúde dos cidadãos de Dourados”, conforme atesta o documento ao qual o Campo Grande News teve acesso.
O caso – Administrado pela prefeitura através da Funsaud (Fundação de Serviços de Saúde de Dourados), o Hospital da Vida é o único a fazer atendimento de urgência, emergência e traumatológico através do SUS (Sistema Único de Saúde) para 35 municípios onde moram pelo menos 800 mil pessoas. Desde o mês passado a fundação está sob intervenção do município.
Na sexta-feira (19), o Campo Grande News teve acesso à Comunicação Interna enviada pelo gerente do hospital Thiago Shindi Silva Tanaka relatando a falta de médico plantonista para trabalhar nos dias 20 e 21, mas o problema foi negado no mesmo dia pela secretária Berenice Machado, que também é a interventora da Funsaud.
Indagada sobre a CI do gerente, Berenice disse a informação não era procedente e que a Comunicação Interna tinha sido foi enviada sem seu conhecimento.
Entretanto, a falta de médicos plantonistas no hospital foi constatada pelo médico intervencionista do Samu que participou do socorro ao motociclista na noite de domingo. “Na chegada ao Hospital da Vida o mesmo estava sem médico na área vermelha e verde”, anotou o médico do Samu.
Em outro trecho do prontuário, o médico citou “Alfa [equipe do Samu] permaneceu por volta de 1 hora e 20 minutos no Hospital da Vida devido o mesmo estar sem médico. Entramos em contato com o diretor clínico e com o diretor técnico. Ambos não atenderam a ligação”.
O problema também foi relatado pelo chefe da equipe de enfermagem: “Paciente vítima de acidente moto x carro. TCE grave, fraturas múltiplas. Transportado até a área vermelha do HV, paciente veio a entrar em PCR [parada cardiorrespiratória], sendo realizado RCP [reanimação cardiopulmonar], sem sucesso: OBS: HV sem médico na área vermelha”.
Demissão em massa – O hospital enfrenta pedido de demissão em massa de médicos. Oito profissionais já entregaram a carta de demissão e outros pretendem seguir o mesmo caminho. Os principais motivos são falta de condições de trabalho e atraso nos salários.
A vereadores que estiveram ontem no hospital, liderados pelo presidente da Câmara Alan Guedes (DEM), os médicos relataram atrasos constantes no pagamento. Alguns estavam sem receber maio e ninguém recebeu o salário de junho.
A situação levou o diretor clínico Raul Espinosa a convocar assembleia para a noite de hoje. “Os problemas do Hospital da Vida vêm se avolumando com risco de morte para pacientes. Temos informado de forma insistente e persistente aos responsáveis pela administração. É necessária posição do corpo clínico”, afirma Raul Espinosa no ofício encaminhado aos demais médicos, convocando-os para a assembleia marcada para começar às 18h30.