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Dourados 80 Anos

Marcelino Pires como fundador é questionado por historiadores

Helio de Freitas, de Dourados | 08/12/2015 07:38
Marcelino Pires como fundador é questionado por historiadores
Marcelino Pires, principal avenida de Dourados, recebeu nome de fundador questionado por historiadores (Foto: Divulgação)
Marcelino Pires, principal avenida de Dourados, recebeu nome de fundador questionado por historiadores (Foto: Divulgação)

A cidade de Dourados, que no dia 20 deste mês comemora 80 anos de emancipação, tem sua trajetória marcada por fatos questionáveis e de pouca ou quase nenhuma consistência histórica. A “Terra de Antônio João” nunca foi terra do tenente Antônio João Ribeiro, que morreu antes do surgimento do povoado, e há quem duvide até mesmo do papel de Marcelino Pires na fundação da cidade.

O homem que dá nome à principal avenida da segunda maior cidade de Mato Grosso do Sul se chamava Marcelino José Pires Martins, era natural de Jataizinho (PR) e nasceu no dia 18 de outubro de 1859. Era filho de José Francisco Martins. Os questionamentos sobre seu real papel na história de Dourados costumam causar muita polêmica, já que vários descendentes moram na cidade.

O historiador Rozemar Mattos de Souza é um dos que apontam “incoerências” na história oficial de Marcelino Pires. “Alguns historiadores sugerem que o pioneiro Marcelino denominou esta localidade de São João batista de Dourados, no entanto, nenhum documento neste sentido foi encontrado”, afirma.

Marcelino e Dourados – De acordo com Rozemar, Marcelino Pires veio para o então Mato Grosso entre 1882 e 1885 e casou-se em 1886 Eulália Ferreira Garcia, que também é nome de rua em Dourados (Eulália Pires).

Marcelino morou com a família na região de Santa Terezinha, atual município de Itaporã, onde plantou café, mas não teve sucesso devido as fortes geadas. Em Dourados teria chegado em 1903, onde nasceram os outros cinco filhos. Ele já tinha sete, que nasceram antes de sua chegada ao povoado.

Em Dourados, segundo Rozemar Mattos, Marcelino tomou posse de uma grande área de terras denominada Fazenda Alvorada. “A área reservada à povoação de Dourados foi extraída de parte das posses de Marcelino Pires e Joaquim Teixeira Alves, posses estas que não tinham sido legalizadas, sendo para o Estado, áreas devolutas”.

Em 1909, Marcelino foi fiscal do prefeito de Bela Vista no então povoado de Dourados. “Alguns historiadores sugerem que o pioneiro Marcelino denominou esta localidade de São João batista de Dourados, no entanto, nenhum documento neste sentido foi encontrado”, afirma Rozemar.

Marcelino Pires morreu aos 56 anos de idade, 6 de julho de 1915, quatro meses após a instalação do Distrito de Paz. Sua morte foi a primeira a ser registrada no Cartório de Paz de Dourados. Entre os parentes famosos, o ex-governador Vespasiano Martins, seu sobrinho.

Mascate na Serra da Bodoquena – O advogado e jornalista Isaac Duarte de Barros Junior, morto em dezembro de 2013, era ainda mais ácido sobre Marcelino Pires. Em artigos publicados nos jornais douradenses, dizia que Marcelino foi um vaqueiro e amansador de cavalos, que veio trabalhar para o fazendeiro Joaquim Tenório Barbosa. Primeiro morou em Maracaju, em 1881.

“Esse antigo proprietário rural, abastado de posses, era também o tutor da moçoila Eulália Garcia. Com ela o rapaz se casou em 1884 aos 25 anos de idade, a moça tinha 13. Após o nascimento dos sete filhos desse matrimonio, Marcelino Pires se mudou para a Colônia Santa Terezinha”, escreveu Isaac.

Depois de vender as terras, Marcelino comprou uma carreta e foi mascatear a domicilio na Serra da Bodoquena, ainda de acordo com o advogado.

“Sabendo da existência de um povoado denominado São João dos Dourados, adquiriu algumas terras devolutas em 1901 numa área onde hoje está localizado o Parque Alvorada. Daí, a encrenca com o fazendeiro Joaquim Teixeira Alves, que entendia ser área da sua fazenda Cabeceira Alta, adquiridas em 1903, as divisas que começavam no Distrito Industrial e se estendiam até a atual Praça Antonio João. Nesse tempo, Marcelino Pires montou um alambique e vendeu muita cachaça caprichada, na companhia do genro Albino Torraca”, relatou Isaac de Barros, que era neto de Izidro Pedroso, outro fundador de Dourados.

“Marcelino Pires, fundou o que? Se as terras eram devolutas, elas pertenciam ao estado de Mato Grosso em 1935, inclusive a área do rocio, isto na fundação do município que foi doado documentalmente pelo interventor Mário Correa da Costa. Portanto, não existe e nunca existiu nenhum documento de Marcelino Pires e Joaquim Teixeira doando intencionalmente absolutamente nada para neste fértil solo douradense erguer-se um povoado”, questionava o advogado e jornalista, conhecido pelo poder da oratória em sessões do Tribunal do Júri Popular.

“Afinal, quem fundou o município de Dourados? Teria sido o gaúcho Izidro Pedroso, o primeiro se fixar com animus domini na zona rural em 1894 na fazenda Lageadinho, proximidades da faculdade de agronomia? Ou seria Januário Pereira de Araújo, ao construir as primeiras cinco casas de alvenaria na zona urbana? Perguntamos agora: foi à família Mattos, ao liderar o movimento pró-emancipação?”, eram outros questionamentos feitos por “Isaaquinho”.

Terras eram públicas – De acordo com o historiador e presidente da Comissão de Revisão Histórica de Dourados, Carlos Magno Mieres Amarilha, até agora não foram encontrados documentos comprovando que Marcelino Pires doou terras para a fundação do patrimônio.

“Não há provas documentais que comprovem tal fato. Importante ressaltar que o Decreto n.º 402, de 3 de setembro de 1915, do governo do Estado de Mato Grosso, assegura uma reserva de terras por meio de lei para a criação do Patrimônio de Dourados e não por meio de doações. O artigo primeiro é categórico em garantir 3.600 hectares de terras para patrimônio da povoação de Dourados e também no mesmo decreto deixa bem explícito a localização e os limites, assim constituído”, afirma Carlos Amarilha.

Segundo ele, o decreto determinou que as terras reservadas para a formação do patrimônio de Dourados para povoação (não índia) foram delimitadas com as terras do fazendeiro Joaquim Teixeira Alves, da Companhia Mate Laranjeira, da Colônia de Índios de Dourados e do fazendeiro Marcelino Pires. “Ou seja, no Decreto 402 é citado o nome de Marcelino Pires, não como doador das terras para a formação do povoado, mas que a sua fazenda, ou melhor, as suas terras, faziam divisas com as terras do recente criado Patrimônio de Dourados”.

Segundo ele, equivocadamente, várias fontes (principalmente matérias de jornais, livros e memórias) apresentam o fazendeiro Marcelino Pires como o doador das terras para a efetivação do patrimônio de Dourados. “É possível deixar bem claro e evidente que nos estudos aqui pesquisados, até este momento, não foram encontrados fontes desta época, documentos oficiais ou jornais, livros, atas, cartas ou o ‘pedido’ de Marcelino Pires para o governador que comprovem a doação de terras para a constituição de um povoado em Dourados”.

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