Com 1 salário mínimo, trabalhador tem de escolher a dedo o que comprar
Segundo o Dieese, o salário ideal para sobreviver no mês é de R$ 6,6 mil
Viver com um salário mínimo é um desafio diário para muita gente. Por mais que o salário mínimo tenha tido reajuste de 1,38%, passando para R$ 1.320 em maio, os gastos do dia a dia aumentaram ainda mais. São custos com aluguel, luz, água, alimento e no final do mês a conta não fecha. Já a gasolina e internet acabam sendo luxo.
Para viver com esse valor, o trabalhador precisa escolher o que comprar ou o que pagar. Se gasta de um lado, falta do outro. Segundo o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), no mês passado, o salário mínimo necessário para sobreviver ficou em R$ 6.652,09, ou seja, 403,95% maior ou cinco vezes a mais que o vigente.
Esse é o valor para uma família conseguir suprir as necessidades como alimentação, moradia, saúde, educação, vestuário, higiene, transporte, lazer e previdência.
A equipe de reportagem foi em busca de famílias ou pessoas que moram sozinhas, que vivam com um salário mínimo. O cenário foi difícil de encontrar, sendo que todos buscam um jeito de complementar a renda para sobreviverem, enquanto outros arrumam um jeito de fugir do aluguel.
A dona de casa Cinalva Pereira dos Santos, de 51 anos, mora com o marido e as filhas de 21 e 14 anos. Ela recebe Bolsa Família e completa com o salário da filha, que é de R$ 1.500.
Os gastos mensais da família só com moradia, água, luz e mercado fica em torno de R$ 1.250, sobrando R$ 70 para conseguir passar o resto do mês.
Segundo ela, a prestação da casa custa R$ 120 por mês; a luz cerca de R$ 400; água, R$ 130; mercado, R$ 600.
“Tem mês que fica apertado, às vezes não dá para cobrir os gastos, mas a gente dá um jeito, vai remando contra a maré”, ressaltou.
Cinalva diz que quase não sai de casa para não ter gastos extras, mas quando sobra, gostam de sair para comer lanche e tomar açaí.
A diarista Nadir Cardoso Baez, de 55 anos, ganha R$ 300 por mês e tem um brechó na porta de casa para completar a renda. Somando as duas não chegam a um salário mínimo. Para conseguir sobreviver conta com a ajuda do filho, que já sustenta duas filhas, de 7 e 9 anos.
As compras no supermercado consomem boa parte do salário mensal. “O mercado está acabando com a gente, está tudo mais caro. Coisa de marca que a gente comprava, agora não compra mais, agora qualquer coisa serve”, diz Nadir, sobre ter perdido poder de compra e escolha das marcas, com o aumento do preço dos alimentos.
O açougueiro Maxander Baez, de 30 anos, ganha R$ 1,8 mil ao mês. Ele, as filhas, a esposa e a mãe não pagam aluguel, o que já ajuda a economizar.
Gastam R$ 600 com mercado; cerca de R$ 600 com água e luz; e R$ 100 com internet. “Nunca sobra para lazer, nosso lazer é a internet”, disse Maxander.
A dona de casa Gisele Porto Ventura, de 30 anos, recebe R$ 900 por mês, mas diz que não paga aluguel, água e nem luz, pois é uma área de ocupação. Com mercado, ela comenta que gasta R$ 300. O restante fica para gastos emergenciais, como remédios quando as filhas gripam ou sentem dor, e tratamento de uma delas, que é soropositivo.
A dona de casa Ester Luiza Silva, de 22 anos, se limitou a dizer que recebe R$ 500 por mês para sustentar a filha, de 5 anos.
Os gastos com água e energia são de R$ 200 e com mercado fica em R$ 300. “Vou parcelando, tento me virar”, lamentou.
Projeção - Na visão da economista do Dieese, Andreia Ferreira, na realidade, o trabalhador acaba recebendo R$ 1.221 ao mês, com o desconto de 7,5% da Previdência Social.
“É só moradia [aluguel, água, luz] e alimentação. Transporte, só se for o público, e considerando que o trabalhador só tenha o desconto que o empregador pode fazer no seu salário. Ou se, na moradia, existir mais de uma pessoa que tenha renda do trabalho, ou se for moto, que faz mais quilômetros por litro do que o carro, normalmente”, explicou.
A profissional lembra ainda da retomada dos programas sociais, como ampliação do Bolsa Família e Farmácia Popular. “A pessoa tem de controlar as finanças, sempre. O ponto é que mesmo quem é controlado está passando apuros”, completou.
O economista Eugênio Pavão tenta exemplificar alguns gastos, levando em consideração que, no ano, o trabalhador ganha R$ 17.160 contando com o 13° salário.
Ele contabiliza os gastos anuais para uma família com quatro pessoas. Com despesas de luz, em média, é R$ 140, o que resulta em R$ 1.680 por ano; a cesta básica, R$ 724,09, que em 12 meses, o gasto chega a R$ 8.917,08; água R$ 960 por ano (R$ 80 por mês). Ainda de acordo com o profissional, se tiver carro modelo 2013, o gasto é de R$ 7.940,04 por ano (R$ 661,67 por mês). Se tiver aluguel de R$ 800 por mês, por exemplo, o gasto anual é de R$ 9.600.
“Para equilibrar o orçamento se faz necessário reduzir as despesas como luz e água, além de buscar algum 'bico' para aumentar a renda. Mas empresas sempre vão tentar pagar o mínimo, dando maiores margens de lucro”, ressaltou.
Para diminuir as despesas, umas das alternativas também é não ter veículo. “No caso a opção é não ter o carro, pois é um ‘sanguessuga’ de dinheiro, e ainda tem a desvalorização anual. Exceto os que ganham a renda com o veículo, transportadores, mototáxi, aplicativos, taxistas. São as prioridades que determinam o equilíbrio financeiro”, finalizou Eugênio.