No ano de nascimento do Estado, o futebol do Operário surpreendia o País
Há 40 anos, a surpreendente campanha do Operário de Campo Grande com o terceiro lugar no Campeonato Brasileiro de 1977, mesmo ano da criação do Estado de Mato Grosso do Sul, marcou uma época de efervescência política e esportiva neste lado do Centro-Oeste. O lugar alcançado pelo Operário de então é, até hoje, a maior conquista do futebol sul-mato-grossense.
São dois fatos marcantes que se confundem, ambos de grande significado na história de Mato Grosso do Sul. O novo Estado se desenvolveu, se não como todos da época sonhavam, mas segue seu caminho como uma unidade importante da Federação, enquanto o Operário Futebol Clube se dissolveu a exemplo do restante do futebol local. De qualquer forma, os dois acontecimentos há 40 anos jamais serão esquecidos.
O Operário foi o terceiro na hierarquia do futebol brasileiro, atrás apenas do São Paulo, o campeão, e do Atlético Mineiro, o vice. O Campeonato Brasileiro de 1977 teve 66 clubes: os campeões estaduais, mais os times convidados da então CBD (Confederação Brasileira de Desportos), e só terminou em março de 1978.
Bem diferente do formato atual de pontos corridos com 20 clubes de apenas oito estados, o Brasileirão de 1977 teve 485 jogos de norte a sul, leste e oeste do país. Nos 20 jogos que disputou, desde o empate de 0 a 0 na estreia diante do Internacional de Porto Alegre até a vitória por 1 a 0 frente ao São Paulo, na fase semifinal, o Operário fez 28 gols e sofreu 16, saldo positivo de 12 gols. Foram 10 vitórias, seis empates e quatro derrotas.
Em meio aos acontecimentos políticos em Campo Grande e Brasília em torno da criação de Mato Grosso do Sul, a campanha do Operário Futebol Clube dividia o foco das manchetes dos jornais da época, e não foram raras as vezes em que foi destacada em primeiro plano.
“Tive a felicidade de fazer parte daqueles momentos inesquecíveis. Nunca, jamais vou esquecer”, disse o ex-goleiro Rui, uma espécie de reserva de luxo do lendário Manga, um ídolo dele próprio e de várias gerações de goleiros no Brasil e no mundo, que foi contratado junto ao Internacional de Porto Alegre com doações dos torcedores depositadas em urnas espalhadas pela cidade.
O volante Edson lembrou que o Operário evoluiu tanto dentro do campeonato que a impressão até entre os jogadores era de que aquilo não passava de um sonho. “Nosso time foi amadurecendo, se tornando compacto, ganhou confiança e chegou um momento que a gente se convenceu de que era verdade e que poderia ser campeão”, comentou o ex-jogador.
A SEMIFINAL - O duelo diante do São Paulo na semifinal mexeu não apenas com o sentimento do povo do novo Estado, mas de todo um país. Dos 66 clubes que iniciaram a competição só restavam quatro na briga pelo título, e o Operário de Campo Grande era um deles ao lado do Londrina, São Paulo e Atlético Mineiro.
Com melhor campanha em relação ao rival, o Operário foi para a semifinal com a vantagem de decidir a vaga em casa. No jogo de ida, no Estádio do Morumbi, perdeu de 3 a 0, com todos os gols nos 15 minutos finais do segundo tempo, diante de um público de 103.92 torcedores pagantes, e no confronto de volta, no Estádio do Morenão, em Campo Grande, venceu por 1 a 0, gol do saudoso atacante Tadeu Santos.
O campeonato teve 408.191 torcedores pagantes, com média de 20.409 torcedores por jogo, e o recorde de público foi registrado no jogo da semifinal do Operário com o São Paulo, no Morumbi, dia 26 de fevereiro de 1978. O confronto da final no Estádio Mineirão, em Belo Horizonte, entre São Paulo e Atlético Mineiro, vencido pelo time paulista nas cobranças de pênaltis, registrou 102.161 pagantes.
“Foi um privilégio vivenciar tudo aquilo de perto. Foram momentos de muita alegria, muita felicidade, e poderíamos ter chegado na final”, lembra o radialista Gilberto Pereira Guedes, narrador titular da extinta Rádio Educação Rural de Campo Grande, que acompanhou toda a trajetória do Operário na competição nacional.
Segundo ele, antes do primeiro jogo da semifinal o presidente da então CBD, Otávio Pinto Guimarães, garantiu ao presidente do Operário, o coronel Paulo Américo dos Reis, que o time campo-grandense não iria para a final, e até propôs uma excursão ao exterior para facilitar a classificação do São Paulo.
“O Otávio Pinto Guimarães argumentou que o Operário não tinha condição de representar o Brasil na Taça Libertadores. Pena que o coronel Paulo Américo só fez essa revelação muitos anos depois. Se tivesse revelado isso na época o desfecho poderia ter sido bem diferente”, contou Guedes.
No jogo da semifinal no Morumbi, ressaltou o radialista, o Operário foi garfado pelo árbitro José Roberto Wright. “Ele interferiu diretamente nos três gols do São Paulo e ainda expulsou o Biluca (zagueiro), Escurinho (lateral-esquerdo) e Peri (atacante), três jogadores fundamentais. O Operário perdeu muito da sua força na partida de volta e mesmo assim vencemos de 1 a 0, mas pelos três gols sofridos em São Paulo teria que fazer quatro para chegar na final”, contou Guedes.
Comandado pelo saudoso técnico Carlos José Castilho, o Operário Futebol Clube teve a seguinte formação titular: Manga; Paulinho, Biluca, Silveira e Escurinho; Edson Soares, Marinho e Roberto César; Tadeu Santos, Everaldo e Peri. Os goleadores do time no campeonato foram Roberto César (8 gols), Everaldo (7), Tadeu Santos (6), Peri (3), Cuca e Marinho, dois gols cada.