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Arquitetura

Depois de pagar as contas, família pensa em como reabrir Hotel Campo Grande

Ângela Kempfer | 16/03/2012 16:23
Fachada do Hotel Campo Grande hoje. (Fotos: João Garrigó)
Fachada do Hotel Campo Grande hoje. (Fotos: João Garrigó)
Coluna de concreto, design arrojado para os anos 70.
Coluna de concreto, design arrojado para os anos 70.

O mérito está nos registros históricos: o primeiro hotel de grande porte levantado em uma cidade que ainda tinha ares de província, com apenas 138 mil habitantes. Por 30 anos, o prédio foi um dos mais conhecidos da cidade, hospedagem certa de todos os artistas que passavam por aqui. Hoje, ao perguntar pelas ruas, há quem nunca tenha ouvido falar. Mas quem vive pelo Centro sabe de detalhes.

Elenir Ferreira é taxista há mais de 20 anos, no ponto da rua Marechal Rondon. “Já carreguei muito passageiro para o hotel, era o melhor de Campo Grande. Quando já estava para fechar, o povo reclamava do abandono”, lembra.

Depois do fechamento em 2001, a família passou a reunir dinheiro para acabar com as dívidas da empresa. Com todos as pendências quitadas, agora a próxima fase é colocar o Hotel Campo Grande para funcionar de novo.

“Não sabemos ainda como, mas queremos que seja hotel porque foi construído para isso”, conta a herdeira Maria Adelaide Noronha, hoje administradora do Restaurante Yoted.

Existe a ideia de buscar investidores, arrendar ou vender o imóvel para grupo hoteleiro. A única condição é que continue no ramo.

Essa história começou com o pecuarista Laucidio Martins Coelho, de família tradicional que lucrava horrores com a pecuária e decidiu retribuir, diz a neta de Laucídio.

“Meu avô foi um visionário, criou o hotel quando Campo Grande ainda nem precisava disso. Foi para retribuir pelas conquistas que teve aqui no Estado”.

Em 1969, antes da construção, uma consultoria foi contratada para avaliar o investimento. O conselho foi para abertura em São Paulo, mas isso não convenceu o proprietário, que fincou pé em Campo Grande.

O escritório Botti & Rubin, dos arquitetos Alberto Rubens Botti e Marc Bores Rubin, assinou o projeto arrojado, de 13 andares, e a cidade parou para acompanhar a abertura em 1971. “Eu tinha só nove anos, mas lembro que foi maravilhoso”, conta Maria Adelaide.

Anos depois, ela assumiu a administração do negócio e começou a conviver com artistas famosos. “Conheci Roberto Carlos, Xuxa, Menudos, até os meninos do Mamonas Assassinas”.

Mas a neta do idealizador demonstra real animação quando lembra do burburinho com a chegada da seleção de vôlei. “Recebemos os jogadores quando eles começaram a fazer sucesso, quando ganharam o primeiro mundial. Uma multidão se aglomerava lá em frente. O hotel parava.”

Recepção do Hotel Campo Grande, há mais de 20 anos. (Foto: Roberto Higa)
Recepção do Hotel Campo Grande, há mais de 20 anos. (Foto: Roberto Higa)

Crise - Na época do fechamento, os elevadores e a parte de refrigeração dependiam de um investimento alto para continuar funcionando. Não havia dinheiro, diante do compromisso com uma manutenção dos serviços também considerada alta.

As dificuldades financeiras impediram a reforma e os impostos acumulados foram a gota d’água para o Hotel Campo Grande.

“Na época essa foi a nossa conclusão. Não podíamos deixar que as dívidas crescessem mais. A família também tinha problemas. Tivemos uma visão estratégica. Só depois de tudo ser pago é que começamos a ter olhos para a reabertura”, confirma Maria Adelaide.

Toda arquitetura continua preservada nos quase 9 mil metros quadrados de área construída. Mas os móveis, incluindo as camas, e equipamentos foram leiloados há alguns anos. Na estrutura ficaram esquadrias, portas originais e o piso de tacos. Para conservação, periodicamente empresa contratada faz a limpeza e a dedetização.

“O encanamento sem funcionar se deteriora e a instalação elétrica também. Isso é um dos pontos que vai precisar de investimento para a reabertura”.

Na época da construção, o investimento foi de 20 mil cabeças de gado, segundo o arquiteto Ângelo Arruda, em livro sobre a arquitetura de Campo Grande. “Mostra a trajetória da arquitetura moderna brasileira fora do eixo Rio – São Paulo”, avalia na obra onde comenta. "A elegância da torre sobre o embasamento e a discrição dos recursos plásticos faz com que o edifício ainda se destaque na paisagem do centro da cidade e permaneça como referência visual".

Eram tempos que ninguém ainda falava de terceirização, o que tornava o trabalho ainda mais complexo, diz Maria Adelaide. “A gente tinha de ser especializado em tudo. Vivemos a época em que tudo era gerido pela própria empresa”.

No saguão, por onde desfilavam artistas e autoridades, já funcionou até uma boate, preservando o lustre que sempre foi marca do local. Hoje, só uma loja de artigos populares funciona por ali. Entre os funcionários, a história do hotel é bastante presente.

Luis Quintino, de 37 anos, conta que o sogro do cunhado foi porteiro do hotel por 25 anos e adora falar sobre o que viveu.

“Ele fala que já se hospedaram ali o presidente Castelo Branco, o João Avelange da Fifa. Hoje me pergunto porque está abandonado”.

Já a colega Leila acha que o lugar é mal assombrado. “Já escutei barulhos”.

American Bar nos anos 80. (Foto: Roberto Higa)
American Bar nos anos 80. (Foto: Roberto Higa)
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