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Comportamento

De casa em casa, “mala brechó” serve de presente à distância

Pandemia fez com 18 mulheres inovassem na hora de "trocar presentes": desta vez, literalmente com a mala e cuia de brechó rotativo

Raul Delvizio | 29/12/2020 06:15
Mala do bem, "viajante" ou simplesmente brechó "caravana" (Foto: Arquivo Pessoal)
Mala do bem, "viajante" ou simplesmente brechó "caravana" (Foto: Arquivo Pessoal)

O último mês de 2020 chegou e, com ele, a marca de 1 ano sem se encontrarem. Antes, 18 mulheres faziam reuniões mensais como em um "Clube da Luluzinha" próprio, com direito à comida, bebida, boas conversas e muita troca de desapegos entre cada uma. Como na pandemia da covid-19 essas aglomerações não são aconselháveis, o jeito foi ter que inovar neste fim de ano: agora, uma mala-brechó bem que veio a calhar.

É assim que o grupo "Quintessência" – com a participação de mulheres quarentonas, cinquentonas e sexagenárias – organizou a "troca de presentes" no ano da covid, isto é, com a ajuda de uma mala com desapegos que viaja de forma rotativa na casa de cada uma delas.

Mariete e Jaqueline Rosa trocando a mala-brechó cheia de roupas (Foto: Arquivo Pessoal)
Mariete e Jaqueline Rosa trocando a mala-brechó cheia de roupas (Foto: Arquivo Pessoal)

Mas antes de rodar endereços, precisou que Icléia Vargas, a professora doutora em Geografia e "Luluzinha" de 61 anos do Quintessência, mudasse do seu antigo logradouro para o atual e assim ter o estalo da ideia.

"Quando mudei de casa, aproveitei e já fiz o meu próprio desapego do que não queria mais, tudo embalado em malas e caixas. Foi aí que pensei: 'porque não passar uma mala com itens para que cada uma escolhesse e ainda contribuisse com o que não quisesse mais?' Surgiu assim a mala do bem", relembra.

Mesmo que a organização tenha sido recente – questão de uns 10 dias atrás – a mala veio cheia: tem roupas, bolsas, lenços, cintos e até sapatos, tudo a ser trocado entre as participantes. Tanto é que foi necessário a inclusão de uma mochila daquelas esportivas, estilo "marinheiro".

Antes da pandemia, os encontros eram organizado pelo WhatsApp (Foto: Arquivo Pessoal)
Antes da pandemia, os encontros eram organizado pelo WhatsApp (Foto: Arquivo Pessoal)

No momento, a mala ainda se encontra na quinta participante, restando no momento outras 13 mulheres. E quando passar por todas, é muito provável que a mala volte mais uma vez a rodar, afinal, novos itens sempre são adicionados por cada uma.

Adriana Rocha, advogada de 58 anos, é uma das que já pode "cavucar" itens nesse brechó rotativo.

"É bem divertido e até mesmo engraçado. É quase que um voltar a ser criança, porque é tudo uma surpresa – você não sabe o que vem. A diversão está na hora de abrir a mala, mexer, procurar, descobrir, achar, testar, experimentar", considera.

Luciana Pacheco levando a mala para casa de outra amiga do grupo (Foto: Arquivo Pessoal)
Luciana Pacheco levando a mala para casa de outra amiga do grupo (Foto: Arquivo Pessoal)

Quem entregou a mala para Adriana foi a amiga Luciana Pacheco. "Foi o único encontro presencial super rapidinho que tivemos em 1 ano, só para receber, agradecer e dar tchau uma a outra. E assim vai indo, de duas em duas essa passagem da mala vai acontecendo", esclarece.

Quando chegou em sua casa, Adriana fez questão de limpar a alça com álcool líquido e deixar a mala aberta no sol. Algumas horas depois, já estava no modo "brechó" – na segurança e conforto de sua própria casa. "Fora o fato de não termos que gastar nada. É o 'ir às compras' sem dispor de nenhum centavo. Aqui, é pra doar quantas peças quiser e também ficar com quantas desejar".

Nesse registrou do ano passado, Icléia no meio junto de Claudia e Cléo Gardin – estavam todas a experimentando roupas (Foto: Arquivo Pessoal)
Nesse registrou do ano passado, Icléia no meio junto de Claudia e Cléo Gardin – estavam todas a experimentando roupas (Foto: Arquivo Pessoal)

Para Icléia, a união – mesmo que à distância – ainda sim faz a força. "É a forma que encontramos de manter acesa a chama dos vínculos, da nossa amizade. Mas também fazer o bem, reciclar aquilo que não temos mais interesse e poder trocar um 'presente' de forma simbólica. É o prazer de se desapegar para que o outro se apegue", afirma.

No ano da covid, as mulheres fizeram vários encontros virtuais, mas nenhum com o formato e propósito de agora. Anteriormente à pandemia, de 5 anos pra cá, elas já vinham organizando uma feira coletiva que acontecia mensalmente na casa de uma e outra.

Também de 1 ano atrás, outro encontro do grupo Quintessência (Foto: Arquivo Pessoal)
Também de 1 ano atrás, outro encontro do grupo Quintessência (Foto: Arquivo Pessoal)
Tudo era esquematizado na casa de uma participante, organizado em araras no melhor estilo brechó (Foto: Arquivo Pessoal)
Tudo era esquematizado na casa de uma participante, organizado em araras no melhor estilo brechó (Foto: Arquivo Pessoal)

"Cada uma levava sua própria 'malinha' de desapego: roupas, sapatos e acessórios. Às vezes tinha até objetos de decoração, tudo organizado em superfícies e araras para todo mundo expor e ter acesso aos artigos. E o que sobrava era sempre doado para uma instituição beneficente ou alguma comunidade carente", explica Icléia.

Seja no esquema presencial da feira coletiva ou no de mala-brechó, o importante é sempre estar compartilhando a afetividade – é o que confirma Adriana.

"Por mais que esteja tudo lavadinho, sempre que fazíamos o nosso brechózinho eu tinha aquela sensação de passado, de intimidade e pertencimento. É de ter sido de outro alguém mas também que agora é seu. É dar uma nova chance e utilidade à roupa que um dia foi usada, mas não por isso esteja velha", finaliza.

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Doguinho faz companhia na mala ao lado da árvore natalina (Foto: Arquivo Pessoal)
Doguinho faz companhia na mala ao lado da árvore natalina (Foto: Arquivo Pessoal)
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