Ex-maridos da mesma mulher, um cedeu “mansão” para o outro morar
Sem casa, aposentado recomeçou a vida com ajuda de onde menos esperava, mas hoje os dois são amigos
Depois de 15 anos casado, Cezar de Barros Penteado ficou sem ter onde morar, mas foi acolhido de um jeito até complicado de entender. O primeiro ex-marido da sua esposa não pensou duas vezes e cedeu a casa onde morava ao novo ex-marido do pedaço. “Eu casei com a ex-mulher dele depois de 20 anos de separação deles. Quando me separei dela também, até tinha alugado um apartamento, mas aí ele falou 'vai lá para casa'”, resume sobre a história complicada.
No Jardim São Lourenço, o lugar parece uma mansão colonial, de tijolinhos à vista, janelas amplas e móveis originais, tudo cedido para que o ex-bancário recomeçasse a vida, sem mágoas por um ter assumido o lugar do outro na vida conjugal.
O exemplo de civilidade vem de muitos anos, porque as duas famílias são vizinhas. Quando o primeiro casamento acabou, a esposa e o ex continuaram morando um ao lado do outro. Cezar então entrou nessa história e, décadas depois, agora o vizinho da ex-mulher é ele.
Ali também funcionava o escritório de advocacia do primeiro marido que, quando soube da história se repetindo, resolveu ir morar na fazenda e deixar o imóvel para Cezar viver. Aos 66 anos, o aposentado conta que não tinha mais nada depois de dois casamentos fracassados. "Quando me separei pela primeira vez, deixei casas que eu tinha pra ela. Agora vivo de aposentadoria e de uma terrinha arrendada".
Na base da confiança, desde que se mudou, só uma vez o proprietário apareceu para visitar o amigo.
O aposentado começou a reconstruir sua história por ali, levando apenas as roupas e a imagem de Nossa Senhora Aparecida, herdada da mãe, em destaque hoje na sala de jantar. A mesa de madeira com as cadeiras almofadadas estavam no quintal e foram recuperadas.
“Quase tudo o que tem aqui é do proprietário, só a Santa na estante é minha. Ganhei da minha mãe, ficou com ela por 60 anos e quando ela faleceu ficou comigo. Foi a única coisa que fiquei dela”, explica o ex-bancário.
Em um dos quartos do imóvel, uma maca chama atenção. Ele detalha que assim como o pai, que começou a cursar Medicina aos 64 anos, ele também decidiu investir na faculdade: "Já velho, para realizar um sonho, eu tô cursando Fisioterapia. Era para ter começado antes, mas com a pandemia não foi possível. Nesse ano comecei, fui acolhido pelo pessoal e tô estudando”, diz, mostrando os livros sobre a escrivaninha do quarto.
Cezar nasceu em Aquidauana, foi para São Paulo aos 5 anos com a família e graças à mudança ele agora tem uma história rica a contar. "Conheci o Lula e todas as lideranças que criaram o PT quando ficamos 22 dias de greve. Juntava transporte, educação, metalúrgicos e bancários. Lembro até hoje que a gente pedia 7% de aumento”, explica o ex-bancário que ainda segue com a mania de colocar um lápis atrás das orelhas.
Quando os filhos nasceram, ele saiu de São Paulo, voltou para Mato Grosso do Sul, terra natal. "Lá não é lugar de criar criança não", justifica, dizendo que hoje todos estão formados e são orgulho do pai.
Com carinho pela casa, vem organizando a si mesmo em conjunto com os móveis e o verde ao redor. Ao mesmo tempo em que precisava se consertar, vem cultivando no quintal, cria galinhas e mostra uma turma de pintinhos que acabou de nascer em casa. Colher jabuticabas e acerolas também é parte do seu recomeço. Assim como ir à acadêmia "todo santo dia".
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