Há 50 anos vendendo pipoca, Baiano anda desiludido na porta do Auxiliadora
“Os alunos sabiam a hora de tocar o sino assim que subia o cheirinho da pipoca ali na janela”, descreve Osório Prado Cardoso, de 85 anos, conhecido como Baiano, o pipoqueiro que está há mais de 50 anos vendendo em frente ao colégio Auxiliadora, na Rua Pedro Celestino. Com os olhos cheios de tristeza, ele lamenta a falta de clientes e a possibilidade de aposentar o carrinho que há tanto tempo virou tradição naquele ponto.
Baiano sentiu que o movimento cai há 2 anos, mas nunca foi tão parado como em 2016. Com o pouquinho que vem ganhando, está difícil dar conta de pagar as despesas de casa. “A situação não está fácil, mora eu minha esposa e três filhos que até hoje não saíram de casa. A aposentaria quase não dá para comprar os remédios”, desabafa.
O problema, segundo ele, é pior quando não consegue vender nada. Tem dias que volta para casa com apenas R$ 3,00 no bolso, valor de um saquinho médio de pipoca salgada e queijinhos fritos por cima.
O preparo não tem segredo, mas o tempo de experiência e sabor foi o que sempre conquistou os alunos. "Já estava acostumado a fazer bastante, com muito queijo caipira. Tinha dias que esse carrinho ficava lotado de pipoca e eu vendia tudo. Hoje não faço nem meia panela senão sobra, fica fria e ninguém compra”, lamenta.
Apesar da tristeza, Baiano não desiste. Morando na Vila Albuquerque, atravessa a cidade para trabalhar diariamente. Não importa se faz sol ou chuva, lá está Baiano enfrentando ônibus lotado para pegar o carrinho que fica guardado em um estacionamento próximo à escola.
Trabalhando de 10h às 18h, só aos fins de semana ele tira tempo para ficar em casa ou lavar o carrinho para mais uma semana de trabalho.
Enquanto passa o dia esperando por clientes, observa a rua e volta no tempo lembrando as mudanças que presenciou. "O colégio era de freira e só estudava meninas. Usavam umas saias longas de tergal. Todo dia saiam da escola e compravam pipoca. Vi muito aluno entrar e sair dessa escola... A rua também era muito diferente, tinha crianças que jogavam bola e olha só hoje", diz mostrando a Pedro Celestino lotada de veículos.
Quando começou, ainda contava com a concorrência, mas nem dessa forma deixava de vender. "Eram dois pipoqueiros, eu comecei com o picolé e não demorou muito para fazer pipoca. Mas tinha movimento para todos mundo. Na hora da saída tinha fila, hoje quase não tem nada", reclama.
Ele não sabe ao certo o que levou as pessoas a deixarem de comprar a pipoca, mas acredita que a resposta esteja na crise. "Acho que é falta de dinheiro, ninguém tem mesmo. E criança não anda mais com dinheiro no bolso."
O jeito é contar com os clientes antigos que todo dia fazem questão de comprar, nem que seja para ajudar Baiano. Zilda Catarine tem 50 anos e considera o pipoqueiro um patrimônio para a escola. Ela estudou ali na infância e ele já estava no local.
"Baiano me viu crescer aqui e essa pipoca sempre foi maravilhosa, nunca me esqueci. Eu sinto muito porque ele sempre fez esse trabalho com muito orgulho, é uma pessoa honesta e não merece passar por isso. Já vi ele na chuva e no frio trabalhando, por isso compro sempre que posso...", comenta.
Hoje, é a filha de 11 anos que estuda ali, uma desculpa para Zilda aproveitar o horário da saída para um tempinho de conversa com o velho amigo. "Sempre que venho, tenho que conversar um pouco com ele. É muito querido, merece o melhor", declara.
Baiano diz que está cansado e vai esperar somente até o ano que vem para se despedir da escola. "Do jeito que está não sei se vai melhorar. Muitos falam que sou pessimista, mas eu enxergo muito bem como estão as coisas. Ano que vem acho que não vou aguentar se continuar assim, vou largar porque não compensa mais sair de casa para ficar aqui esperando", desabafa.