Na Ary Coelho desde 81, Mestre Mato Grosso é um show na venda de ervas
Antes ele chamava atenção com os pulos e saltos da capoeira para vender produtos, hoje ele se aquietou e decidiu assumir sabedoria milenar
Um verdadeiro showman, Mestre Mato Grosso, o Paulo Fialho de Souza, de 57 anos, chama atenção de quem passa pela praça Ary Coelho. Com uma infinidade de ervas a sua volta, é que um pilão de madeira imenso que ele amassa as ervas que se tornam remédios para todo e qualquer mal, dos físicos aos emocionantes, curando até olho gordo e inveja.
Mas os mais antigos na cidade reconhecem Mestre Mato Grosso de outras épocas. Mais jovem, é desde de 1981 que seu ponto de comércio é localizado na Afonso Pena. Junto aos passos da capoeira, luta ancestral na qual é meste e tem uma academia própria desde esse tempo, ele vendia produtos do qual era representante. Com saltos, pulos e muita ginga, ele atraia a atenção dos pedestres e, enquanto promovia um verdadeiro show gratuito, vendia os produtos.
"Vendia o sabão de Juá, que servia pra escovar os dentes, pra lavar o corpo, o cabelo", lembra ele, que demonstrava as mil e uma utilidades ao vivo para a galera.
Paulo diz ainda ter feito muito dinheiro com uma pomada, quando foi representante da flora Guarani, de Manaus. "Eu lembro que fazia a maior propaganda, dizia que era de banha de peixe elétrico mas era tipo um gelol de lá".
Bom de papo, é no gogó que hoje ele atrai a galera. "Eu estou com uma distensão na virilha que me dói muito então já não tenho mais o pique de antes, de ficar pulando alto do jeito que fazia".
Mato Grosso assume que no passado também sentia vergonha de assumir sua sabedoria com as ervas e plantas medicinais. "Não sei direito o porquê disso, mas sentia vergonha. Hoje eu estou em outra fase, sou bem sucedido no que faço", pontua.
Ele conta que aprendeu tudo que sabe com a mãe, a rezadeira dona Benedita, nascida no Gabão, na África. Aprendeu observando toda a sabedoria ancestral que ela possuia.
"Mamei em minha mãe até os sete anos de idade.Entrava no meio da pernas dela e pedia. Fomos muito próximos, então tive o privilégio de viver bem pertinho dela. Nessa eu aprendi e fui a primeiro a me alfabetizar, o povo me chamava do cara que tinha a letra", lembra ele.
O problema do cliente é dividido com Paulo no meio da praça e ele dá o remédio na hora, fala o preço e quanto tempo dura a mistura curativa que vai preparar.
O mestre vai pegando as ervas, dizendo o nome, e explicando pra que cada uma servirá no tratamento do que aflige o cliente. "Conheço 2800 qualidades das plantas do mato", completa.
Dessa forma ele também atrai os olhares curiosos, e mais e mais pessoas param para observar a mágica feita pelas mãos do showman da Ary Coelho.
"Isso daqui é coisa séria, tem que saber muito para não receitar nada de errado, afinal, a gente mexe com a saúde dos outros." A receita é escrita na embalagem de onde vai o remédio.
Mesmo sem os grandes saltos, ele diz que estar ali com as ervas é também representar a capoeira. "Afinal, faz parte de uma cultura, de um povo que nasceu sedento por liberdade. Assim como a capoeira vem da história do quilombo".
Nascido no Centro de Salvador, aprendeu os preceitos e a filosofia da luta com o pai, Francisco de Fialho Borges de Carvalho, estrangeiro. Mas formou-se em São Paulo com o mestre Ronaldo Luiz de Lima.
Apaixonado pelo que faz, continua dando aulas, hoje mais para as mulheres, na academia em que já formou muito capoeirista. "Trouxe para Mato Grosso do Sul o primeiro grupo Conceição da Praia da Capitães", lembra ele. Buscando a tranquilidade, ele quer trabalhar menos e curtir mais, ao lado de sua morena, Maíra, casado há 28 anos, e dos três filhos, Potira, Fabrício e Almir das Alreias.