Pesquisadores querem mais debates sobre limitação à pesca do dourado
As limitações à pesca do peixe dourado nos rios de Mato Grosso do Sul foi debatida em audiência pública na tarde desta quarta-feira (15), na Assembleia Legislativa. A proposta, que já tramita na Casa de Leis, vem dividindo opiniões entre pescadores, pesquisadores e representantes de órgãos ambientais.
O debate teve início com apresentação do deputado estadual Beto Pereira (PSDB), proponente da audiência e autor do projeto de lei.
"O objetivo principal é acabar com a pesca predatória e estimular o repovoamento do dourado, que está cada vez mais escasso em nossos rios. É comum hoje pescar apenas um ou dois exemplares. Se não tomarmos uma atitude, a situação vai se agravar e a espécie pode entrar em extinção", argumenta Pereira.
O parlamentar fez uma explanação com embasamento técnico para justificar a proposta e explicou que a pesca em si, para subsistência, poderá continuar. A limitação surge ao proibir o transporte da espécie, geralmente feito em grandes quantidades no estado.
"Na verdade, o que o projeto propõe é a proibição do transporte do dourado. As pessoas poderão pescar e comer o peixe na beira do rio, por exemplo. Proibido será, por exemplo, levar uns 5 kg para casa. Isso já é pesca predatória", explica o parlamentar.
Ele defende que haja um manejo pesqueiro que garanta manutenção dos estoques, geração de dados e informações com credibilidade para tomadas de decisão, desenvolvimento econômico, geração de trabalho e renda, fiscalização adequada e segurança jurídica.
"O despovoamento de espécies é um forte indicador dos efeitos da pesca predatória, que vem provocando instabilidade ambiental, redução econômica e prejuízos a quem depende da espécie", expôs o deputado.
"Hoje não temos informações sobre essa população. É fundamental realizar estudos que indiquem a quantidade, tamanho, comportamento em relação às espécies migradoras e predadoras e mecanismo para sua preservação", diz.
Segundo o projeto de lei, a proibição da pesca do dourado seguida do transporte do mesmo terá duração de 8 anos, período suficiente para reprodução e aumento da espécie nos rios. A proposta, de acordo com o texto, também não veta a modalidade pesque e solte.
Em meio ao debate, Beto Pereira relata que a diminuição de dourados nos rios é visível, o que vem prejudicando a renda dos pescadores "Antes era muito mais farto", frisa, comentando ainda que "os pescadores precisam de 200 kg de pescado por mês, mas por causa da escassez, são obrigados a burlar normas para fazer a pesca em áreas proibidas".
"Se houver exploração sem observar limites, não haverá descendentes", destaca, argumentando ainda que como o trabalho da pesca predatória prossegue, cada vez há peixes menores sendo capturados, fora da idade de reprodução, diminuindo ainda mais a espécie com o decorrer dos anos.
Opiniões - Desfavorável ao projeto, o presidente da Federação Estadual de Pecadores Profissionais, Pedro Jovem dos Santos, afirma que tal ação pode gerar um desequilíbrio ecológico.
"A proibição pode prejudicar muito os pescadores que dependem da espécie para sobreviver, sem contar o risco de provocar um grande desequilíbrio ambiental, porque o dourado é predador e pode fazer até com que outras espécies diminuam", conta Jovem, afirmando também que vai tentar articular com outros deputados para que o projeto não siga adiante.
Já o pesquisador da Embrapa, Agostinho Catella, defende a criação de um plano de gestão, adaptativo e compartilhado, e que defina objetivos claros para a pesca do dourado. "compartilhado por considerar os diferentes atores, no caso os pescadores, e adaptativo conforme as particularidades de cada bacia e sub-bacia".
Agostinho também acredita que uma lei com tal grau de importância e complexidade exige um debate mais amplo e embasado em mais pesquisas. "Uma decisão equivocada pode provocar prejuízos aos pescadores", comenta.
Outro pesquisador que participou do evento e que tem opinião similar, foi José Sabino, biólogo da Uniderp. "Antes de tomar uma decisão, é preciso ter qualidade na informação. Já se tem pesquisas que a proibição da pesca foi responsável pelo aumento de uma espécie, mas essa prática tem que ser contextualizada com a região. Mais que proibir, é importante investir no plano de manejo"
Porém, há opiniões também favoráveis ao projeto. Uma delas é do produtor rural e praticante do pesque e solte, Paulo Okishima, de 52 anos. "Sou a favor porque percebo essa escassez de dourado nos rios. Permitir o pesque e solte é o mais sensato. Acredito os pescadores é que são os verdadeiros agentes predatórios do peixe", comenta.
Linha de pensamento semelhante é seguida pelo pescador profissional Enoque Pereira Durães, que tem 57 anos e trabalha neste setor ha mais de 30. "Nos últimos 10 anos houve uma queda do dourado nos rios. Eu estimo que uns 30%", crê Enoque, que ainda indica o que poderia ter causado tal situação.
"Isso aconteceu pelo aumento de pescadores amadores, turistas. Essa pesca acaba acontecendo sem nenhum controle", acredita. Sobre a proibição da pesca e transporte da espécie, ele diz que não haverá grandes mudanças. "Já não tem dourado mesmo para a gente pegar, então proibir ou limitar a pesca não vai fazer tanta diferença. Se é para aumentar a quantidade, sou totalmente a favor", diz.
Debate - Participaram da audiência representantes do Instituto Homem Pantaneiro, Imasul, Polícia Militar Ambiental,, Associação de Pesca Esportiva do Pantanal, Federação de Pescadores Profissionais de MS, Embrapa, Coordenadoria de Aquicultura e Pesca do Ministério da Agricultura no MS, Ibama/MS e Fundação de Turismo de Corumbá.
Atualmente já existem leis que proíbem a pesca do dourado no Paraná, Mato Grosso e Goiás, e em países como a Argentina. No Estado, os municípios de Aquidauana e Corumbá já possuem legislações próprias coibindo a pesca da espécie.