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Meio Ambiente

Usineiros descartam cana no Pantanal, mas admitem plantar no Alto Paraguai

Possibilidade, porém, tem entraves reconhecidos pelo próprio setor e que vão de outras legislações à regras do Renovabio

Humberto Marques | 09/11/2019 08:56
Colheita mecanizada de cana; 86% da atividade em MS está no Conesul. (Foto: Arquivo)
Colheita mecanizada de cana; 86% da atividade em MS está no Conesul. (Foto: Arquivo)

Imediatamente após o presidente Jair Bolsonaro baixar decreto que suspendeu os efeitos do zoneamento agroeconômico da cana-de-açúcar no país, liberando em tese o cultivo em áreas de biomas sensíveis, entidades públicas e organizações não-governamentais em Mato Grosso do Sul se debruçaram sobre as demais leis para saber como o Pantanal e regiões vizinhas seriam atingidas. Setor que seria responsável pelos dois lados neste debate até então simplista –avanço sobre o meio ambiente versus desenvolvimento econômico–, a indústria sucroalcooleira é rápida ao afirma que não existe chance de plantações, usinas e destilarias chegaram ao Pantanal.

Já em relação à BAP (Bacia do Alto Paraguai, lindeira ao Pantanal e que se confunde com este), o discurso é de que, agora, há possibilidades legais de a região ser aproveitada para as culturas. Para isso, porém, seria necessária uma melhor conjuntura econômica para o setor –atingido pela crise mas que em 2020 contará com o Renovabio, projeto do governo federal aprovado em 2017 que visa a incentivar o setor de biocombustíveis, mas que também tem regras ambientais duras.

“Antes de falarmos sobre o que muda, é importante deixar claro o que não muda”, antecipa-se em dizer Roberto Hollanda Filho, presidente da Biosul (Associação dos Produtores de Bioenergia de Mato Grosso do Sul, que congrega as destilarias de álcool e usinas de açúcar). “Não vai ter cana no Pantanal”, prosseguiu, antecipando que, nesta região, barreiras legais se unem ao impedimento técnico para a própria cultura.

“A cana não se desenvolve ali. Então não vai ter cana-de-açúcar no Pantanal e não vai ter desmatamento de forma nenhuma”, destacou o representante das usinas. Segundo ele, a derrubada do zoneamento da cultura, em primeiro lugar, derruba questões ligadas ao financiamento do setor e que, ao ser baixado o decreto de 2009, previu regras mais rígidas que as previstas no zoneamento estadual, elaborado no ano anterior. “Mas, de lá para cá, surgiram instrumentos mais modernos para o controle, como o monitoramento via satélite, e também mais acessíveis”.

Hollanda Filho também destacou que o Código Florestal, de 2012, também apresenta mais restrições ambientais; enquanto a legislação estadual cobra uma série de monitoramentos para que as usinas e destilarias possam funcionar. Por fim, ele destacou que o Renovabio, junto com as vantagens para desenvolvimento do setor, impõe regras que incluem a exclusão de quem adotar práticas como o desmatamento para instalação da cultura.

Hollanda Filho reforça que cana-de-açúcar tem impedimentos legais e técnicos para cultivo no Pantanal e, na BAP, dependeria de conjuntura econômica. (Foto: Eliane Salomão/Biosul)
Hollanda Filho reforça que cana-de-açúcar tem impedimentos legais e técnicos para cultivo no Pantanal e, na BAP, dependeria de conjuntura econômica. (Foto: Eliane Salomão/Biosul)

“O plano para biocombustíveis estimula o setor e pretende fazer do Brasil uma potência ainda maior, mas em relação ao aspecto ‘verde’, é absolutamente restritivo com quem não adotar uma postura de sustentabilidade. Então, são três instâncias inibidoras de funcionamento: o Código Florestal, a lei estadual e o Renovabio”, explicou.

BAP – Embora a legislação ambiental estadual para a região indique veto à cana-de-açúcar na Bacia do Alto Paraguai, a Biosul interpreta que a derrubada do zoneamento federal abre caminho para a cultura na região. Isso, porém, dependeria de uma conjuntura econômica hoje distante, e que, mesmo às vésperas do Renovabio, não prevê novos investimentos no Estado –até mesmo pela possibilidade de restrição de financiamentos com desmatamentos.

Em 2005, debate nesse sentido conduzido na administração do ex-governador Zeca do PT culminou em protestos pelo Estado, com o ambientalista Francisco Anselmo Gomes de Barros (o Franselmo) ateando fogo contra o próprio corpo e morrendo em um ato na Rua Barão do Rio Branco.

“Quando se faz um investimento no setor, não é como comprar 200 hectares e plantar. Isso não existe mais. Ao se instalar, deve estar perto da indústria e não se pode usar pouca área. São investimentos de centenas de milhões de reais feitos com estudo, análise de impacto ambiental, aprovação do governo, audiência pública, enfim, uma série de etapas até o investidor ter o sinal verde. Considerando que há vários lugares para se instalar, ele vai optar por um local de terra ruim e próximo à natureza?”, considerou Hollanda Filho.

Ele ponderou, porém, que a BAP, hoje, comporta uma série de outras atividades agroindustriais, embora haja resistência à cultura da cana. “Isso porque há um monte de mitos, mas a cana tem papel importante quanto a erosão, segurando o solo, a microbiologia é quase a mesma da vegetação nativa, somos pouquíssimos invasivos quanto a intensivos agrícolas, pois os próprios resíduos são reaproveitados. Tudo isso faz do etanol sustentável”, destacou.

Pantanal não teria condições de suportar cultura, segundo a Biosul. (Foto: Arquivo)
Pantanal não teria condições de suportar cultura, segundo a Biosul. (Foto: Arquivo)

Por outro lado, o presidente da Biosul defende que o setor sucroalcooleiro também gera empregos com boa massa salarial e permite a transformação econômica de municípios, mantendo seu nível de produtividade mesmo durante a crise –resultando em safras próximas a 50 milhões de toneladas–, que freou sua expansão.

“O Renovabio é um programa de longo prazo que prevê dobrar a produção até 2030. Mas hoje, porém, nossas usinas investem na renovação dos canaviais e manter a qualidade da matéria-prima , com investimentos na melhoria da produção, e não em novas unidades. Atualmente 86% das usinas e destilarias está no Conesul”, afirmou. “Então, não temos projetos para aquela área (BAP)”.

Ele complementou reforçando que os investimentos no setor partem de R$ 300 milhões para pequenos projetos. “O investidor quer segurança, por isso consideramos que não haverá esse impacto”. A aposta é que outras regiões do país possam desenvolver a cultura, já que a derrubada do zoneamento libera práticas como a irrigação –aguardada por agricultores em outras regiões do país.

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