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Política

Direita e esquerda se unem na Assembleia contra livro sobre sexo e racismo

Vencedor do Prêmio Jabuti em 2021, "O Avesso da Pele" virou polêmica por ser distribuído pelo MEC

Por Ângela Kempfer | 05/03/2024 11:36
Capa do livro O Avesso da Pele, de Jeferson Tenório. (Foto: Divulgação)
Capa do livro O Avesso da Pele, de Jeferson Tenório. (Foto: Divulgação)

Romance que vem levantando os ânimos em discussões Brasil afora chegou à Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul. Vencedor do Prêmio Jabuti em 2021, "O Avesso da Pele" fala de racismo e sexo. Na opinião da turma contrária, não poderia estar à disposição dos alunos porque usa palavras de baixo calão e, na opinião de alguns deputados estaduais, “é nojento”.

O assunto foi apresentado na tribuna da Alems durante a sessão desta terça-feira (5) pelo deputado Rinaldo Modesto (Podemos). Evangélico, ele disse que desde a noite de ontem tem recebido várias mensagens de pais revoltados com a obra. Rinaldo, inclusive, pediu apoio aos colegas com assinaturas em documento que será encaminhado ao governo do Estado para que o romance seja retirado das bibliotecas nas escolas.

“Em respeito às mulheres, avós que estão aqui, não consigo nem repetir os termos que ele usa no livro. Mas não podemos admitir que esse tipo de obra fique na biblioteca, à disposição dos nossos jovens. Não gosto dessas pautas de costume, mas é a banalização do sexo. Parece conversa de pescador. Adolescentes podem falar sobre temas do tipo, mas com responsabilidade”, argumentou Rinaldo.

Nem a Secretaria de Educação de Mato Grosso do Sul sabe responder se recebeu a obra via MEC. Segundo a SED, só o Ministério da Educação pode informar isso.

"A pasta informa que vai fazer uma análise mais aprofundada da obra em especial para os devidos encaminhamentos. Vale salientar que o processo de escolha e distribuição dos livros ocorre entre o ministério. Para o encaminhamento, o MEC cria uma lista com as obras disponíveis e as unidades escolares fazem a opção pelos acervos de interesse. Após a escolha feita pelas unidades, o envio é feito direto para as escolas", diz o comunicado.

Mas até quem não leu vai contra a obra, usando como base reportagens nacionais que têm sido publicadas desde a última semana, quando o Rio Grande do Sul anunciou que censuraria o romance. “É um livro que aparentemente fala de algo abominável, que é o racismo. Mas quando a gente tem acesso, é nojento. A palavra é nojento”, reclama a deputada Lia Nogueira (PSDB).

Nem a esquerda saiu em defesa do livro.  “Tenho recebido mensagens e algumas fake news de que foi o governo Lula que distribuiu. Mas foi distribuído em 2022, durante o governo Jair Bolsonaro”, informou o deputado Pedro Kemp (PT).

O petista também falou das ressalvas sobre a escolha. “Entrando no mérito do conteúdo do livro, também tenho muitas reservas e dúvidas se é adequado aos estudantes do Ensino Médio”.

A colega de esquerda, Gleice Jane (PT), teve uma postura mais contida; “Não li o livro, não sei o teor. Só temos de tomar cuidado de não criminalizar a literatura. O livro não é o debate, mas o fato dele estar na rede pública de ensino. Mas antes eu tenho de ler para dar qualquer opinião”.

O assunto foi apresentado na tribuna da Alems pelo deputado Rinaldo Modesto (Podemos). (Foto: Luciana Nassar/Assessoria_
O assunto foi apresentado na tribuna da Alems pelo deputado Rinaldo Modesto (Podemos). (Foto: Luciana Nassar/Assessoria_

A obra - Escrita por Jeferson Tenório, a obra foi avaliada e incluída no Programa Nacional do Livro e do Material Didático. A editora responsável, Companhia das Letras, tem rebatido os ataques. “Para chegar ao colégio em questão, ainda precisou passar por aprovação da própria diretora, que assinou o documento de ‘ata de escolha’ da obra e agora contesta o conteúdo do livro. Esses dados são transparentes e públicos”, escreveu.

A editora ainda repudiou a censura à obra. “A retirada de exemplares de um livro, baseada em uma interpretação distorcida e descontextualizada de trechos isolados, é um ato que viola os princípios fundamentais da educação e da democracia”;

O autor apresenta o romance como literatura sobre identidade e as complexas relações raciais, inclusive, sobre violência. O resumo mostra a história de Pedro, que após a morte do pai, assassinado numa desastrosa abordagem policial, sai em busca de resgatar o passado da família e refazer os caminhos paternos. O autor admite que usa uma narrativa por vezes brutal, para trazer à superfície um país marcado pelo racismo e por um sistema educacional falido, com um denso relato sobre as relações entre pais e filhos.

Ainda conforme a apresentação, em O Avesso da Pele, o que está em jogo é a vida de um homem abalado pelas inevitáveis fraturas existenciais da sua condição de negro em um país racista, um processo de dor, de acerto de contas, mas também de redenção, superação e liberdade.

A ministra da Cultura, Margareth Menezes, também saiu em defesa do livro.  “Somos absolutamente contrários a qualquer tipo de limitação ao acesso a obras. Para um livro ser levado às escolas, um conselho formado por um grupo de pessoas decidiu. O livro não é colocado de graça. O Ministério da Educação tem essa sensibilidade”.

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