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O coronavírus na Itália: notícias do futuro

Por Liziane Soares Guazina (*) | 31/03/2020 08:05

Liziane Soares Guazina Trago notícias do futuro. E elas não são boas. A Itália vive uma guerra, onde a cada dia é preciso vencer uma batalha contra um inimigo invisível. Mas também contra o cansaço, a angústia e a incerteza quanto ao futuro do país. A Proteção Civil italiana registrou, somente na última sexta-feira, dia 27 de março, quase mil mortos por causa do coronavírus: 969 pessoas faleceram naquelas últimas 24h, em decorrência da Covid-19. Desses, 541 faleceram na região da Lombardia.

Mais de 10 mil pessoas já morreram desde o primeiro registro oficial de casos na cidade de Codogno, em 21 de fevereiro (10.023 mortos até agora). De acordo com o Instituto Superiore di Sanità, dois por cento dos mortos não apresentavam outras patologias.

Cerca de 70 pessoas falecidas eram padres das paróquias das cidades italianas atingidas, segundo as últimas informações dos jornais. Dos mais de 92 mil casos positivos registrados (92.472 registrados pela Proteção Civil no sábado, 28 de março), ao redor de 6 mil são de profissionais de saúde, como médicos, dentistas, enfermeiros. Cinquenta e um médicos faleceram durante este um mês de epidemia.

O prefeito de Milão, Beppe Sala, internacionalmente conhecido por ter pedido desculpas na televisão por haver compartilhado um vídeo nas mídias sociais que conclamava os milaneses a não pararem a cidade em fevereiro, no início da epidemia, reconheceu em entrevista ao jornal Corriere della Sera, no sábado passado, que o recomeço após o pico da emergência será longo e gradual, e não exclui eventuais paradas. Para ele, será preciso repensar o modo como nos movemos, do sistema de transportes aos espaços de aglomerações, como estádios e cinemas.

E não é somente no Norte do país, a região mais rica da Itália, que a situação é preocupante. As regiões do Sul começam a registrar aumento de casos. Nos telejornais, imagens de pessoas desesperadas que tentam sacar dinheiro em caixas eletrônicos e são impedidas pelas forças de segurança, pois não podem circular nas ruas. “Non abbiamo più soldi! (Não temos mais dinheiro!)”, grita uma moça aos policiais.

Na última sexta, o presidente da República, Sergio Mattarela, falou à nação italiana: é um período dramático, será preciso reconstruir o país. Ele pediu união e criticou a Europa: “Que intervenha antes que seja muito tarde. Vivemos uma página triste da história”. E completou: “Ninguém será deixado para trás.” Uma hora antes desse pronunciamento, um outro homem caminhou solitário em meio à chuva pela praça São Pedro, no Vaticano. “Estamos no mesmo barco, ninguém se salva sozinho”, disse o papa, durante a pregação.

No majestoso e vazio cenário da praça, reluzia o crucifixo que, em 1512, também foi alvo das preces contra outra peste que assolava o mundo, a chamada ‘Peste Negra’. Enquanto Francisco abençoava crentes e não crentes, sinos e sirenes de ambulância cruzavam Roma e as telas do mundo, lembrando aos vivos que ficassem em casa.

Nos próximos dias, a Itália provavelmente não sairá do lockdown, como era esperado. E já se discute publicamente a reabertura das escolas e universidades para setembro. A Europa parece estar à beira do abismo. Os Estados Unidos enfrentam o crescimento do contágio. O Brasil pode se tornar a Itália daqui a algumas semanas, em proporções ainda maiores. Se o Brasil não quiser repetir o que está acontecendo aqui, deve aprender com a experiência de quem está à frente no combate à epidemia.

Devemos olhar o que funcionou e o que não funcionou em países como a Itália. Os italianos pagam, hoje, um preço muito alto por não terem se dado conta dos impactos causados pelo coronavírus logo no início da epidemia. Os cientistas italianos apontam que o distanciamento social é o único caminho comprovado para se evitar uma tragédia.

Ouçamos nossos cientistas. Apoiemos todas as medidas de fortalecimento das campanhas de saúde pública do SUS. Sigamos os bons exemplos para o enfrentamento ao coronavírus que têm sido dados pelas universidades públicas brasileiras, incluindo a Universidade de Brasília: produção de álcool em gel, fornecimento de equipamentos de alta tecnologia, produção de máscaras e esforço concentrado na busca de soluções às muitas necessidades urgentes decorrentes de uma pandemia.

É o momento de escolher a vida e ficar em casa. Só assim haverá futuro para todos. Até líderes internacionais, como Boris Johnson e Donald Trump, já reconheceram isso. Em uma guerra, qualquer líder que não defenda sua população e a entregue ao inimigo por causa de seus próprios interesses, só pode ser chamado por um nome. E poderá ter o fim que não deseja.

(*) Liziane Soares Guazina é doutora em Comunicação pela Universidade de Brasília (2011), professora de graduação e pós-graduação da Faculdade de Comunicação da UnB.

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