Pandemia 2
Os momentos que o coronavírus está a proporcionar à humanidade são de multiefeitos. A cada situação, nos vemos diante de situações inusitadas. Em determinados momentos, há a recomendação de se usar máscara. Essa situação, ironicamente, acabou na realidade desmascarando muita gente.
O mundo mudou muito em poucos dias. Nunca houve uma mudança tão radical e rápida. Uma nova ordem mundial começa a tomar corpo. A rapidez da circulação do vírus e de sua divulgação causou e continua causando transformações imediatas e acredito definitivas. A recomendação de se evitar a circulação colocou todos em face de si mesmos. Estamos em vias de proceder ao autoconhecimento por meios inimagináveis pelos filósofos. Frente a frente. Consigo mesmo.
Esse evento incerto e imprevisto pode levar a economia mundial a um colapso. Todas as atividades estão sendo afetadas. A rapidez com que forem tomadas as medidas adequadas reagindo com bom senso e equidade dará a resposta certa.
O vírus nos remeteu aos mais elementares hábitos de asseio e de higiene, há muito esquecidos, entre os quais o de lavar as mãos frequentemente. Essa prática nos leva a outro ensinamento, este esotérico: “Mãos limpas, conservai-as puras”.
Essa pandemia está demonstrando que todos somos semelhantes independentemente de riqueza, pobreza, títulos, propriedades, feiura, beleza, preto, branco, amarelo, – enfim, o vírus nos mostrou o quanto a nossa casa é um lugar sagrado e nos colocou em nosso verdadeiro lugar: somos todos irmãos.
A fábula seguinte, de Esopo, ilustra o comportamento de pessoas consideradas ilustres. Aqui e lá fora.
"Um jumento carregado de sal atravessava um rio. A certa altura escorregou e caiu na água. Então o sal derreteu e o jumento, levantando-se mais leve, ficou encantado com o acontecido. Tempos depois, chegando à beira de um rio com um carregamento de esponjas, o jumento pensou que, se ele se deixasse cair outra vez, logo se levantaria mais ligeiro; por isso resvalou de propósito e caiu dentro do rio. Todavia ocorreu que, tendo-se as esponjas embebidas de água, ele não pôde se levantar e morreu afogado ali mesmo. Assim também, certos indivíduos não percebem que, por causa das suas próprias astúcias, eles mesmos se precipitam na infelicidade".
Esopo foi um escritor da Grécia Antiga, que viveu no século VI A.C., a quem são atribuídas várias fábulas populares e a paternidade das fábulas como gênero literário.
A propósito, há um ditado que diz: “Quando a esperteza é muita, ela cresce, vira bicho e come o esperto”.
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Outro ponto a ser destacado é a dedicação e o altruísmo dos médicos e enfermeiros que colocaram a missão de suas vidas acima dos riscos que estão correndo pelo contato direto com os infectados. Merecem a homenagem e a gratidão de todos nós. Destaco o sacrifício do médico chinês Li Wenliang. Foi ele quem alertou seus colegas quando detectou o vírus e foi forçado a se calar pelo governo chinês, que não queria que a notícia da epidemia se tornasse pública. Mesmo assim, dedicou-se ao trabalho e veio a morrer aos 33 anos após contrair o novo vírus enquanto atendia pacientes na cidade de Wuhan, o epicentro do surto da doença. Dediquemos nossa reverência ao doutor Li Wenliang, como mártir deste novo tempo.
Outra observação que faço decorre do comportamento que se está adotando quanto ao velório dos infectados. O velório praticamente foi abolido. O carinho, a amizade, o respeito que devemos aos nossos entes queridos deve ser manifestado em vida, enquanto estamos juntos. Depois da morte, fica naturalmente a saudade e a lembrança dos atos que marcaram a vida de cada um.
(*) Heitor Rodrigues Freire é corretor de imóveis, advogado, associado ao Instituto Histórico e Geográfico – MS.