Antes de réus, juiz quer ouvir médicas que tiveram menina assassinada nos braços
Interrogatório de mãe e padrasto de criança só deve acontecer depois de mais 3 depoimentos
Antes de interrogar os réus pela morte de garotinha de 2 anos e 7 meses, o juiz Carlos Alberto Garcete, titular da 1ª Vara do Tribunal do Júri, quer ouvir os depoimentos das médicas que receberam a menina já morta na UPA (Unidade de Pronto Atendimento Comunitário) do Bairro Coronel Antonino, no dia 26 de janeiro deste ano. A ação penal que julgará se houve ou não crime e quem são os responsáveis está na fase chamada de instrução e julgamento, quando testemunhos são formalmente registrados e provas juntadas ao processo.
Além das profissionais de saúde, mais uma testemunha chamada pelos advogados de Christian Campoçano Leitheim, 25 anos, acusado de espancar a enteada até a morte, também falará em juízo. O Campo Grande News apurou que a convocação das médicas partiu do próprio magistrado, já que nem a acusação e nem as defesas haviam feito o arrolamento.
Foram os profissionais de saúde da UPA que acionaram a Polícia Militar e o Conselho Tutelar após a chegada da criança. No prontuário médico, ficou registrado que a garotinha “deu entrada na área vermelha em óbito”, com “rigidez cadavérica” e “sinais de morte há mais de quatro horas”.
A anotação também fala em “hematomas por todo corpo”, “timpanismo [acúmulo de gases no abdômen]” e levanta um suspeita: “sinais de violência sexual?”. Detalhes de como foi o atendimento devem ser esclarecidos nos depoimentos.
O crime – Na tarde do dia 26 de janeiro, uma quinta-feira, a menina de 2 anos e 7 meses deu entrada na UPA de bairro no norte de Campo Grande, já sem vida. Inicialmente, a mãe, Stephanie de Jesus da Silva, 24, que foi até lá sozinha com a garota nos braços, sustentou versão de que ela havia passado mal, mas investigação médica apontou lesões pelo corpo, além de constatar que a morte havia ocorrido cerca de quatro horas antes de chegar ao local.
O atestado de óbito apontou que a menininha morreu por sofrer trauma raquimedular na coluna cervical (nuca) e hemotórax bilateral (hemorragia e acúmulo de sangue entre os pulmões e a parede torácica). Exame necroscópico também mostrou que a criança sofria agressões há algum tempo e tinha ruptura cicatrizada do hímen – sinal de que sofreu violência sexual.
O padrasto responde pelo homicídio com as três qualificadoras e pelo estupro, já a mãe da menina, pelo homicídio, como Christian, mesmo que não tenha agredido a filha, mas porque, no entendimento do Ministério Público, ela se omitiu do dever de cuidar.
Na delegacia, Christian optou por exercer o direito ao silêncio. Já Stephanie afirmou que o companheiro batia na filha como forma de correção, mas negou que ele tivesse espancado a enteada naquele dia. Ela alega que nunca denunciou por medo do marido, já que também era vítima de violência doméstica. Os dois ainda não foram interrogados em juízo.
A morte jogou luz sob processo lento e longo que a menina protagonizou com idas frequentes à unidade de saúde - 30 vezes em 2 anos -, tentativa do pai em obter a guarda após suspeita de que a criança era vítima de agressão e provocou série de audiências públicas, protestos e mobilização para criação da Casa da Criança, bem como soluções ao falho sistema de proteção à criança e ao adolescente em todo o Brasil.