Jamilzinho quer anular júri histórico, que o condenou por execução de estudante
A defesa aponta que não há provas de que ele foi mandante e destaca depoimentos ilegais
Jamil Name Filho pede ao TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) a anulação do júri em que foi condenado a 23 anos e seis meses de prisão por ser mandante da morte do universitário Matheus Coutinho Xavier, 19 anos, fuzilado por engano.
O recurso de apelação foi apresentado no fim da tarde de ontem (dia 30) pela defesa, que reúne uma banca renomada de advogados: o ex-ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça), Nefi Cordeiro, e o criminalista Eugênio Malavasi.
Os pedidos apontam que a decisão do júri foi contrária às provas, portanto, injusta. Em julho do ano passado, Name Filho foi condenado a 20 anos por homicídio qualificado (motivo torpe e recurso que dificultou a defesa da vítima) e a três anos e seis meses por porte ilegal de arma de fogo.
Segundo a defesa, o júri deve ser anulado devido à utilização de provas ilícita e derivadas delas no julgamento. A primeira foi o uso do depoimento informal prestado por Eliane Benites Batalha dos Santos, "realizado sob forte coação física e grave ameaça", conforme o documento.
Eliane é esposa do ex-guarda municipal Marcelo Rios, condenado no mesmo júri a 23 anos de prisão: 18 anos por homicídio qualificado, 3 anos e 6 meses pelo porte ilegal de arma e 1 ano e 6 meses por receptação.
O citado depoimento foi durante a investigação, na sede do Garras (Delegacia Especializada de Repressão a Roubo a Banco, Assalto e Sequestros). Ela contou que o marido trabalhava para Jamil Name e que estava preocupado após a execução por engano. Desta forma, se tornou testemunha-chave.
Ela e os filhos do casal chegaram a ficar na delegacia, diante do medo de Rios de que a família sofresse retaliação. Mas, na fase de audiências, Eliane mudou de versão e, no júri, afirmou ter vivido um “inferno” no Garras.
“Os seis, sete dias de inferno que a gente passou, que a gente viveu na mão daquele delegado Fábio Peró e ninguém fez nada! E dos outros policiais! Ninguém fez nada! Justiça, ninguém! Ninguém bateu na minha porta e falou “olha Eliane, quero ouvir seus filhos”, não! Ninguém fez nada! Todo mundo vê o que aconteceu, mas não vê por trás o que aconteceu! Porque no momento em que ele falou para mim tudo que a gente conversou, lá, com os policiais, o delegado, a única coisa que ele me falava é que meus filhos iam morrer, a cabeça dos meus filhos iam ser arrancada, como falaram que meus filhos “vou abrir o portão e vocês vão para rua...vão arrancar a cabeça de vocês!”, disse Eliane, durante o julgamento.
Neste raciocínio da defesa, deve ser declarada a ilicitude do depoimento, pois foi colhido sob condição inadmissível em um Estado Democrático de Direito.
“Tendo sido a referida prova ilícita demonstrada ao Conselho de Sentença em prejuízo aos réus, bem como havendo impugnação específica contrária a utilização do citado depoimento, é de se reconhecer a existência de nulidade posterior à pronúncia, haja vista o contato dos jurados com prova ilícita, contaminando o julgamento. Desse modo, de rigor o reconhecimento de nulidade posterior à pronúncia, devendo os acusados serem submetidos a novo julgamento, sem a possibilidade de utilização da referida prova ilícita em prejuízo dos réus”.
No dia do júri, o delegado Peró rebateu que as declarações eram fantasiosas e fruto de desespero da defesa.
Aviso de Miranda - O segundo ponto de nulidade destacado pela defesa foi o interrogatório informal de Marcelo Rios.
“Na espécie, também há nulidade posterior à pronúncia em razão da utilização de modo incriminador do interrogatório informal do corréu Marcelo Rios, realizado em ‘entrevistas informais’ do então investigado no momento da sua prisão em flagrante e enquanto permaneceu detido na Delegacia de Polícia. Tais conversas, se é que existiram, são evidentemente ilícitas, em razão da inobservância do comando constitucional de informar o preso ao seu direito de permanecer em silêncio, também conhecido como Aviso de Miranda”.
Bastante divulgado em filmes, o comunicado consiste na obrigação de informar o acusado de seu direito ao silêncio, de que tudo o que disser poderá ser usado contra si e da garantia de assistência jurídica, sob pena de nulidade.
Traição - Ainda segundo o recurso de apelação, não existe qualquer elemento probatório capaz de relacionar Jamil Name Filho como mandante do homicídio, cujo alvo era o policial Paulo Roberto Teixeira Xavier, pai de Matheus.
Conforme a banca de advogados, a tese do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) de que o crime teve como origem suposto prejuízo financeiro da família Name com o advogado Antônio Augusto de Souza Coelho, na disputa pela Fazenda Figueira não tem provas. O pano de fundo seria a traição de Xavier, que passou a trabalhar para Antônio.
“Analisem, Excelências, se o desacerto da Família Name seria com a pessoa de Antônio Augusto de Souza Coelho (e não com Paulo Roberto Teixeira Xavier), por qual razão, o atentado contra a vida não foi realizado em face de Antônio Augusto?”, questiona a defesa.
O documento alega que a tese de “traição” não faz o menor sentido, e não encontra amparo nos autos, quando se verifica que a família Name foi justamente a responsável por colocar Xavier à disposição de Antônio.
“A palavra dos policiais não pode servir como prova para condenação, mormente quando a palavra policial não encontra amparo em elementos concretos verificáveis nos autos, bem como quando não está calcada em prova lícita”.
Caso não seja determinado um novo julgamento, a defesa pede que a pena seja redimensionada.
Mais cadeia – No mesmo processo, a advogada Cristiane de Almeida Coutinho, mãe do jovem morto e assistente do MPMS, quer mais 12 anos “de cadeia” para Name Filho e até apresentou os cálculos. A decisão será da 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça. O relator é o desembargador Luiz Gonzaga Mendes Marques.
Matheus foi morto em 9 de abril de 2019, por volta das 18h, em frente de casa, no Jardim Bela Vista, enquanto manobrava a caminhonete do pai. O rapaz foi atingido com sete tiros.
Considerado o júri da década, o julgamento de Jamil Name Filho, Marcelo Rios e do policial civil aposentado Vladenilson Daniel Olmedo (condenado a 21 anos e seis meses) teve duração de 32 horas em Campo Grande. A sessão na 2ª Vara do Tribunal do Júri de Campo Grande começou em 17 de julho e foi encerrada às 23h de 19 de julho.
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