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Capital

Jamilzinho quer anular júri histórico, que o condenou por execução de estudante

A defesa aponta que não há provas de que ele foi mandante e destaca depoimentos ilegais

Por Aline dos Santos | 31/01/2024 09:09
Jamil Name Filho (de casaco) durante julgamento pela morte de estudante. (Foto: Henrique Kawaminami)
Jamil Name Filho (de casaco) durante julgamento pela morte de estudante. (Foto: Henrique Kawaminami)

Jamil Name Filho pede ao TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) a anulação do júri em que foi condenado a 23 anos e seis meses de prisão por ser mandante da morte do universitário Matheus Coutinho Xavier, 19 anos, fuzilado por engano.

O recurso de apelação foi apresentado no fim da tarde de ontem (dia 30) pela defesa, que reúne uma banca renomada de advogados: o ex-ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça), Nefi Cordeiro, e o criminalista Eugênio Malavasi.

Os pedidos apontam que a decisão do júri foi contrária às provas, portanto, injusta. Em julho do ano passado, Name Filho foi condenado a 20 anos por homicídio qualificado (motivo torpe e recurso que dificultou a defesa da vítima) e a três anos e seis meses por porte ilegal de arma de fogo.

Segundo a defesa, o júri deve ser anulado devido à utilização de provas ilícita e derivadas delas no julgamento. A primeira foi o uso do depoimento informal prestado por Eliane Benites Batalha dos Santos, "realizado sob forte coação física e grave ameaça", conforme o documento.

Eliane é esposa do ex-guarda municipal Marcelo Rios, condenado no mesmo júri a 23 anos de prisão: 18 anos por homicídio qualificado, 3 anos e 6 meses pelo porte ilegal de arma e 1 ano e 6 meses por receptação.

O citado depoimento foi durante a investigação, na sede do Garras (Delegacia Especializada de Repressão a Roubo a Banco, Assalto e Sequestros). Ela contou que o marido trabalhava para Jamil Name e que estava preocupado após a execução por engano. Desta forma, se tornou testemunha-chave.

Ela e os filhos do casal chegaram a ficar na delegacia, diante do medo de Rios de que a família sofresse retaliação. Mas, na fase de audiências, Eliane mudou de versão e, no júri, afirmou ter vivido um “inferno” no Garras.

Durante julgamento, Eliane disse que viveu dias de "inferno no Garras". (Foto: Henrique Kawaminami)
Durante julgamento, Eliane disse que viveu dias de "inferno no Garras". (Foto: Henrique Kawaminami)

“Os seis, sete dias de inferno que a gente passou, que a gente viveu na mão daquele delegado Fábio Peró e ninguém fez nada! E dos outros policiais! Ninguém fez nada! Justiça, ninguém! Ninguém bateu na minha porta e falou “olha Eliane, quero ouvir seus filhos”, não! Ninguém fez nada! Todo mundo vê o que aconteceu, mas não vê por trás o que aconteceu! Porque no momento em que ele falou para mim tudo que a gente conversou, lá, com os policiais, o delegado, a única coisa que ele me falava é que meus filhos iam morrer, a cabeça dos meus filhos iam ser arrancada, como falaram que meus filhos “vou abrir o portão e vocês vão para rua...vão arrancar a cabeça de vocês!”, disse Eliane, durante o julgamento.

Neste raciocínio da defesa, deve ser declarada a ilicitude do depoimento, pois foi colhido sob condição inadmissível em um Estado Democrático de Direito.

“Tendo sido a referida prova ilícita demonstrada ao Conselho de Sentença em prejuízo aos réus, bem como havendo impugnação específica contrária a utilização do citado depoimento, é de se reconhecer a existência de nulidade posterior à pronúncia, haja vista o contato dos jurados com prova ilícita, contaminando o julgamento.  Desse modo, de rigor o reconhecimento de nulidade posterior à pronúncia, devendo os acusados serem submetidos a novo julgamento, sem a possibilidade de utilização da referida prova ilícita em prejuízo dos réus”.

No dia do júri, o delegado Peró rebateu que as declarações eram fantasiosas e fruto de desespero da defesa.

Ex-guarda muncipal Marcelo Rios durante júri popular em Campo Grande. (Foto: Henrique Kawaminami)
Ex-guarda muncipal Marcelo Rios durante júri popular em Campo Grande. (Foto: Henrique Kawaminami)

Aviso de Miranda - O segundo ponto de nulidade destacado pela defesa foi o interrogatório informal de Marcelo Rios.

“Na espécie, também há nulidade posterior à pronúncia em razão da utilização de modo incriminador do interrogatório informal do corréu Marcelo Rios, realizado em ‘entrevistas informais’ do então investigado no momento da sua prisão em flagrante e enquanto permaneceu detido na Delegacia de Polícia. Tais conversas, se é que existiram, são evidentemente ilícitas, em razão da inobservância do comando constitucional de informar o preso ao seu direito de permanecer em silêncio, também conhecido como Aviso de Miranda”.

Bastante divulgado em filmes, o comunicado consiste na obrigação de informar o acusado de seu direito ao silêncio, de que tudo o que disser poderá ser usado contra si e da garantia de assistência jurídica, sob pena de nulidade.

Traição - Ainda segundo o recurso de apelação, não existe qualquer elemento probatório capaz de relacionar Jamil Name Filho como mandante do homicídio, cujo alvo era o policial Paulo Roberto Teixeira Xavier, pai de Matheus.

Conforme a banca de advogados, a tese do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) de que o crime teve como origem suposto prejuízo financeiro da família Name com o advogado Antônio Augusto de Souza Coelho, na disputa pela Fazenda Figueira não tem provas.  O pano de fundo seria a traição de Xavier, que passou a trabalhar para Antônio.

O advogado Eugênio Malavasi durante julgamento de Jamilzinho. (Foto: Henrique Kawaminami)
O advogado Eugênio Malavasi durante julgamento de Jamilzinho. (Foto: Henrique Kawaminami)

“Analisem, Excelências, se o desacerto da Família Name seria com a pessoa de Antônio Augusto de Souza Coelho (e não com Paulo Roberto Teixeira Xavier), por qual razão, o atentado contra a vida não foi realizado em face de Antônio Augusto?”, questiona a defesa.

O documento alega que a tese de “traição” não faz o menor sentido, e não encontra amparo nos autos, quando se verifica que a família Name foi justamente a responsável por colocar Xavier à disposição de Antônio.

“A palavra dos policiais não pode servir como prova para condenação, mormente quando a palavra policial não encontra amparo em elementos concretos verificáveis nos autos, bem como quando não está calcada em prova lícita”.

Caso não seja determinado um novo julgamento, a defesa pede que a pena seja redimensionada.

Ex-ministro do STJ, Nefi Cordeiro faz a defesa de Jamilzinho em julgamento. (Foto: Henrique Kawaminami)
Ex-ministro do STJ, Nefi Cordeiro faz a defesa de Jamilzinho em julgamento. (Foto: Henrique Kawaminami)

Mais cadeia – No mesmo processo, a advogada Cristiane de Almeida Coutinho, mãe do jovem morto e assistente do MPMS, quer mais 12 anos “de cadeia” para Name Filho e até apresentou os cálculos. A decisão será da 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça. O relator é o desembargador Luiz Gonzaga Mendes Marques.

Matheus foi morto em 9 de abril de 2019,  por volta das 18h, em frente de casa, no Jardim Bela Vista, enquanto manobrava a caminhonete do pai. O rapaz foi atingido com sete tiros.

Considerado o júri da década, o julgamento de Jamil Name Filho, Marcelo Rios e do policial civil aposentado Vladenilson Daniel Olmedo (condenado a 21 anos e seis meses) teve duração de 32 horas em Campo Grande. A sessão na 2ª Vara do Tribunal do Júri de Campo Grande começou em 17 de julho e foi encerrada às 23h de 19 de julho.

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