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Capital

Laudo trava inquérito sobre morte de motoentregador atingido por Porsche

Advogada da família de Hudson diz que caso semelhante ocorrido em SP já tem denúncia contra condutor

Por Silvia Frias e Geniffer Valeriano | 25/07/2024 13:07
Kelly Ferreira aguarda a finalização do inquérito e punição do condutor: "É horrível passar por isso, tem que ter punição" (Foto: Paulo Francis)
Kelly Ferreira aguarda a finalização do inquérito e punição do condutor: "É horrível passar por isso, tem que ter punição" (Foto: Paulo Francis)

Desde o dia 22 de março, a atendente Kelly Patrícia Ferreira, 39 anos, não teve ânimo para lavar a camisa que foi deixada dobrada pelo marido, Hudson de Oliveira Ferreira, ou guardar a bíblia que era lida por ele, todas as manhãs. “Eu não consegui mexer nas coisas dele, não consegui”, diz, emocionada.

Viúva desde que o motoentregador foi morto pelo condutor do Porsche, o empresário Arthur Torres Rodrigues Navarro, na Rua Antônio Maria Coelho, Kelly se diz ainda perdida, tentando sobreviver ao cotidiano e à espera da conclusão da investigação, ainda em fase de inquérito, quatro meses após o acidente.

“É meio revoltante, porque já se passaram quatro meses, a doutora [advogada] falou que pediram mais prazo para poder finalizar o inquérito, era para já ter finalizado, né?, questiona Kelly, em entrevista ao Campo Grande News. Emocionada, Kelly preferiu não mostrar as lembranças do marido, que ainda estão no quarto da casa da família, na Mata do Jacinto, como ele deixou.

Na noite de 22 de março, Hudson tinha acabado de fazer entrega em um prédio, quando foi atingido pelo Porsche de Arthur. Ainda conseguiu mandar áudio para a esposa, pedindo socorro. “Vem ligeiro, vida. Acabou com minha perna, acabou”.


O motoentregador foi encaminhado à Santa Casa, às 21h10, com fratura exposta de tíbia, lesões extensas, sangramento ativo, choque hipovolêmico e hemorrágico. Morreu no dia 24 de março, à 1h10, aos 39 anos.

Arthur Navarro só se apresentou à polícia no dia 5 de abril e disse que não percebeu o que havia ocorrido. Ele foi indiciado por homicídio culposo (sem intenção) e evasão do local sem prestar socorro.

No inquérito policial, que tramita na 3ª DP (Delegacia de Polícia), consta que, no dia 29 de maio, a delegada Priscilla Anuda, pediu dilação de prazo, conforme previsto no artigo 10 do CPP (Código de Processo Penal) para terminar diligências, laudos periciais e oitivas de testemunhas.

Um desses laudos, o mais aguardado, tanto pela família de Hudson quando pelo condutor do Porsche é o que irá atestar a velocidade a que o Porsche estava quando atingiu a vítima.

No dia 3 de junho, o promotor de Justiça Marcelo Eloy concedeu o prazo de 60 dias para “realização das diligências ainda necessárias”. No mesmo dia, certidão emitida pela 3ª Vara Criminal informa que, até que ocorra o oferecimento da denúncia, o inquérito constará como “baixado”, sem intervenção do Judiciário. Caso seja pedido mais prazo, isso será tratado diretamente entre MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) e Polícia Civil.

O prazo, caso conte apenas os dias úteis, termina na segunda semana de agosto.

O Porsche Cayenne, avaliado em R$ 1 milhão, conduzido pelo empresário, no pátio da delegacia (Foto/Arquivo/Alex Machado)
O Porsche Cayenne, avaliado em R$ 1 milhão, conduzido pelo empresário, no pátio da delegacia (Foto/Arquivo/Alex Machado)

A advogada Janice Terezinha Andrade, que representa a família de Hudson diz que questiona regularmente a Polícia Civil para saber sobre a conclusão do laudo. “A minha indignação é a demora, porque lá em São Paulo aconteceu a mesma coisa, uma semana depois, o motorista já foi pronunciado, está preso, vai a júri, a indenização também saiu, é uma lentidão inexplicável para o caso”.

Janice refere-se ao caso do empresário Fernando Sastre de Andrade Filho, que também conduzia Porsche e atingiu a traseira do Sandero do motorista de aplicativo Ornaldo Viana, na Avenida Salim Farah Maluf, em São Paulo, em acidente ocorrido no dia 31 de março.

Fernando Sastre foi liberado após o acidente para atendimento hospitalar e não passou por teste de bafômetro. Quando se apresentou à polícia, disse que estava um pouco acima da velocidade permitida, que é de 50 km/h.

Laudo do Instituto de Criminalística apontou que a velocidade média do Porsche era de 156 km/h. No dia 6 de maio, Fernando se entregou à Justiça, três dias depois do decreto da prisão preventiva. No dia 29 daquele mês, o empresário foi denunciado pelo MPSP (Ministério Público de São Paulo) por homicídio doloso e lesão corporal gravíssima.

Arthur Torres Rodrigues Navarro está sendo investigado por homicídio culposo e evasão (Foto/Redes Sociais)
Arthur Torres Rodrigues Navarro está sendo investigado por homicídio culposo e evasão (Foto/Redes Sociais)

Freio - Voltando a Campo Grande, Kelly diz espera desfecho semelhante ao caso, com punição do condutor. “Eu espero que sim, tenho esperança que isso aconteça, porque não é o primeiro caso que ele fez, já é o segundo, do rapaz que ficou inválido, eu acho que tem que colocar um ponto final”.

Kelly se refere ao acidente ocorrido em 19 de agosto de 2014, na Avenida Bom Pastor. Na ação de indenização protocolada na Justiça da Capital, consta que Arthur Navaro dirigia Fiat Uno, de empresa de engenharia, não respeitou a sinalização e atingiu a moto conduzida pelo servente de pedreiro, hoje, com 73 anos. A vítima ficou com limitação para erguer e carregar peso e para realizar movimentos

“É horrível passar por isso, eu não desejo para ninguém; então colocar um freio nisso, e mostrar que dinheiro não pode comprar tudo, tem que ter uma punição”, diz Kelly. Ela afirma que, até agora, não recebeu qualquer ajuda efetiva por parte de Arthur Navarro, embora ele tenha divulgado que estava à disposição da família. Janice Terezinha contou que teve reunião com advogados do empresário, mas, nada conclusivo foi definido.

Contas – Em agosto, Kelly vai começar em um segundo trabalho, esforço dobrado para pagar as contas, algumas, pelo caminho desde a morte do Hudson. “Estou tentando entrar nos trilhos, me adaptando”, explicando que o salário recebido por ela e pelo filho de 19 eram repassados ao motoentregador, responsável pelos pagamentos.

Kelly é mãe de quatro filhos, de 21, 19, 17 e 15 anos. A mais nova tinha quatro anos quando conheceu Hudson.

“Ausência maior vem no fim de semana, eu e ele ficávamos juntos direto, eu trabalhava com ele até umas 14h, vinha para casa, descansava e umas 16h30 entrava no serviço; domingo a gente ficava com as crianças, assava uma carne, chamava os amigos. Agora, a gente ficou meio perdido, a gente ficou assim, meio sem rumo”.

No último dia 2, Hudson completaria 40 anos. “Ele estava muito animado com os 40 anos dele, falei para ele que ia alugar uma casa com piscina, ele estava todo faceiro, contava para todo mundo”, contou Kelly.

Hudson chegou a mandar áudio pedindo para Kelly encontrá-lo. "Vem ligeiro, vida" (Foto/Arquivo)
Hudson chegou a mandar áudio pedindo para Kelly encontrá-lo. "Vem ligeiro, vida" (Foto/Arquivo)

Defesa – O advogado André Borges, que representa Arthur Navarro, diz que o cliente está à disposição da família, confirmou que já ocorreram conversas iniciais com a advogada da família de Hudson Oliveira, mas que o assunto ainda não evolui.

Sobre a velocidade do Porsche, o assunto vai ser resolvido quando sair o laudo da perícia. Segundo André Borges, a alegação é que o empresário estava em velocidade regular.

No dia 5 de abril, em entrevista coletiva, a delegada Priscila Anuda, havia dito que o empresário relatou em depoimento que “estava rápido”, pois havia recebido ligação da esposa, gestante, que estava passando mal.

A reportagem entrou em contato com a Polícia Civil para saber sobre o andamento da investigação e aguarda retorno. Sobre o pedido de suspensão da CNH (Carteira Nacional de Habilitação), feito pela delegada, a informação é que ainda não tinha sido avaliado pela Justiça.

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