Propina era paga a juiz com terras e denúncia tem até “frentista fazendeiro”
Segundo o MP, frentista tinha salário de R$ 2 mil, mas fez depósitos de R$ 117 mil para integrantes do esquema
Do conjunto de processos contra o juiz afastado Aldo Ferreira da Silva Júnior emerge denúncia de lavagem de dinheiro por meio de propina paga em propriedades rurais e até um frentista fazendeiro, suspeito de ser laranja num esquema em que a Justiça virou “balcão de negócios”.
A denúncia da PGJ (Procuradoria-Geral de Justiça), protocolada em abril no TJ/MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) por Paulo Cezar dos Passos, então chefe do MP/MS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul), detalha o recebimento de terras pelo magistrado, com sequência de ações, com rede de “laranjas” para esconder a origem ilícita.
Um dos episódios foi num processo de espólio (conjunto de bens de pessoa falecida), que começou a tramitar na Justiça em 2011. O documento do Ministério Público afirma que em junho de 2014 o juiz afastado recorreu ao nome da sogra para ocultar 115 hectares de uma fazenda localizada em Rochedo. A propriedade estava na lista de bens a inventariar no processo e avaliada em R$ 986 mil.
A denúncia informa que o juiz aceitou o bem de um herdeiro do processo de inventário em esquema de corrupção. Na sequência, a sogra funcionou como “laranja” para ocultar o bem a título de propina, “de forma a camuflar a sua aquisição”.
Numa segunda fase da lavagem, a propriedade rural foi negociada e vendida pelo valor de R$ 1,4 milhão no ano de 2016. O pagamento foi pulverizado com depósito nas contas bancárias de três pessoas, incluindo o pai do juiz. Pagamentos para a sogra do magistrado, por exemplo, foram transferidos para Aldo Ferreira. O fracionamento seria para despistar controle do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras).
Inventário de 1990 - Também em 2014, o juiz é acusado de ter recebido 102 hectares de terra no distrito de Anhanduí, avaliados em R$ 1 milhão, objeto de um inventário que data de 1990, nascido ainda época em que a moeda corrente era o Cruzeiro.
Depois, realizou transação comercial ilegal, por meio de associação criminosa com empresários. O documento cita que o lucro para magistrado na transação foi de R$ 3,8 milhões.
Frentista - A situação de ocultação de propriedade também foi verificada em relação à fazenda de 56 hectares em Sidrolândia, avaliada em R$ 280 mil. Em 2014, a propriedade rural foi transferida para um frentista de posto de gasolina, com renda média de R$ 2 mil.
“O qual, segundo apurado no presente inquérito judicial, tratava-se de laranja da associação criminosa, tendo recebido e mantido em sua guarda a área rural, ocultando sua origem e propriedade até 22 de setembro de 2015”.
Uma nota técnica aponta que entre 12 de maio e 2014 e 15 de julho de 2015, frentista, que também foi denunciado, fez uma série de transferências bancárias para a esposa do juiz e um advogado, totalizando R$ 117.400.
Em depoimento ao Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado), frentista disse que fez os depósitos por orientação de Jesus Silva Dias, apontado como intermediador de negócios para o juiz.
Para o Ministério Público, o frentista de posto de combustíveis “trouxe em sua fala elementos relevantes sobre a sua atuação como laranja da associação criminosa, porquanto, além de movimentar expressiva quantia em dinheiro, possuía emprego humilde e nenhuma informação sobre suas movimentações bancárias”.
Na ação penal, é solicitado que o juiz perca o cargo e o pagamento de R$ 29,2 milhões por danos morais à coletividade.
O Campo Grande News não conseguiu contato com a defesa do juiz afastado e nem de Jesus Silva Dias.