‘Volta ao mundo’ colocou presidente da Omep na mira do Gaeco
Maria Aparecida Salmaze, presa ontem, é um dos principais alvos de investigação do MPE e em cinco anos, esteve em ao menos 12 países
A “volta ao mundo” e também as diversas viagens em território nacional realizadas por Maria Aparecida Salmaze, a presidente da Omep (Organização Mundial para Educação Pré-Escolar) de Campo Grande, chamaram a atenção do MPE (Ministério Público Estadual), que desde 2011 investiga convênios da Prefeitura de Campo Grande com a instituição.
Entre 2010 e 2015, a pedagoga, que é um dos principais alvos da Operação Urutau, esteve em ao menos 12 países diferentes, em quatro dos seis continentes. Em 2011, Maria Aparecida percorreu 16 mil km para conhecer a China. O ano de 2014 foi intenso. A presidente visitou o Deserto do Saara, fez um tour pela Europa e também conheceu a Índia.
Maria Aparecida, que trabalha na instituição há 23 anos – desde 1993 – e está no comando da entidade desde 2008, foi presa ontem pela força-tarefa comandada pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), que apura crimes de improbidade administrativa, peculato (desvio de dinheiro público), associação criminosa, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica.
Para conseguir os mandados de busca e de prisão contra a dirigente, o Gaeco argumentou que “as apurações mostram também que alguns investigados possuem histórico de viagens internacionais e padrão de vida incompatível com a remuneração que recebem”.
Tour – Maria Aparecida não esconde que gosta de viajar. Os registros mais recentes dos passeios estão em check-ins feitos pelo Facebook e fotos postadas nas redes sociais.
Em um dos inquéritos civis instaurados para investigar a Omep, o Ministério Público Estadual questiona o motivo de tantas excursões internacionais – mais especificamente entre os anos de 2010 e 2014 – e a presidente justifica que as excursões foram custeadas pela Omep Brasil e que o intuito era a participação dela em congressos na área da educação.
Em ofício encaminhado no ano passado ao MPE, Maria Aparecida explica que viajou em 2011 para o Congresso Mundial da Omep, na Suécia, na companhia da nora, que mora em Londres, na Inglaterra, porque necessitaria de uma intérprete. Mas, a dirigente garante que nenhum dos custos da viagem da nora foi pago com recursos da entidade.
Maria Aparecida apresentou ao MPE recibos da contratação de agências de viagens, compra de passagens e reservas em hotéis que mostram que por meio a Omep, a presidente esteve no Chile, Argentina, Inglaterra, China, Emirados Árabes e no Panamá.
Ela ainda tornou públicas pelo Facebook, viagens à Bélgica, Portugal, Inglaterra, Estados Unidos, Colômbia, ao Deserto do Saara e Índia.
A presidente da entidade também esteve em pelo menos 20 cidades dos Estados do Sul e Sudeste neste ano, no ano passado e em 2014, sem contar as viagens ao interior de Mato Grosso do Sul.
Defesa - Laudson Cruz Ortiz, advogado de Maria Aparecida, explica que a cliente foi ouvida nesta quarta-feira (14) pelo Gaeco e que mais uma vez esclareceu os motivos das viagens. “Além de ser presidente da Omep de Mato Grosso do Sul, ela é presidente da Omep Brasil e tem por obrigação participar de congressos, seminários. Mas, jamais que estas viagens seriam custeadas pelos convênios [com a prefeitura]. Tudo que é gasto com o dinheiro dos convênios vai para as prestações de contas”.
O defensor afirma que quase sempre que viaja a trabalho, a presidente da Omep aproveita para fazer passeios, pagos com o dinheiro dela. Ele diz ainda que ela tem um neto que mora em Londres e por isso vai até lá com frequência. “Agora cabe ao Gaeco provar que ela usou dinheiro público para viajar”.
Ortiz vai pedir o habeas corpus da pedagoga e classifica a prisão dela como descabida. “Estamos na fase de inquérito ainda, não existe processo, acusação criminal. Mas, infelizmente, preferem prender para depois esclarecer”.
Operação – A Urutau é resultado de investigações sobre os desvios de recursos dos cofres municipais, por meio das Omep e da Seleta, que terceirizam mão-de-obra e serviços para a Prefeitura de Campo Grande. A suspeita é que as entidades eram usadas na contratação de “fantasmas” e que os prejuízos cheguem à casa dos milhões. O trabalho de apuração ainda não terminou.
De acordo com o promotor Marcos Alex Veras, da 29ª Promotoria de Justiça do Patrimônio Público, a ação na Justiça que culminou na expedição de três mandados de prisão, sete de condução coercitiva e 14 de busca e apreensão, está em sigilo “para não atrapalhar as investigações”.
Nesta terça-feira, o trabalho das equipes comandadas pelo Gaeco começou no início da manhã. Além da presidente da Omep, Ana Claudia Pereira da Silva, que atuaria como chefe do departamento pessoal na Seleta Sociedade Caritativa e Humanitária, e Kelly Ribeiro Pereira, coordenadora da creche Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, foram presas.
O Gaeco cumpriu os mandados de busca e apreensão nas sedes da Seleta e da Omep, no gabinete da vereadora Magali Picarelli (PSDB), na creche, em uma empresa, um instituto de formação e na casa do presidente da Seleta, dentre outros locais.
Além disso, sete pessoas foram levadas até a sede do Grupo de Combate ao Crime Organizado para depor: o presidente da Seleta, Gilbraz Marques, a vereadora Magali Picarelli, além de Elcio Paes da Silva, Wenrril Pereira Rodrigues, Eder Tulio Bezerra Pereira, Aliny Aparecida de Souza, tesoureira da Omep, e Rodrigo Messa, genro da presidente da Omep e que já ocupou o comando da entidade.
As ordens de prisão, busca e condução coercitiva foram expedidos pelo juiz Mario José Esbalqueiro Junior, quando ele estava vinculado à 1ª Vara das Execuções Penais de Campo Grande.
Urutau - José Sabino, biólogo, mestre em zoologia e doutor em ecologia, explica que o Urutau é uma ave que se esconde durante o dia, pousa em troncos de árvores e se camufla como defesa. À noite, sai para caçar insetos.
Em Campo Grande, como temos muitas árvores, é uma ave até comum, mas o biólogo lembra que “tem de ter um olho bem treinado para conseguir encontrá-la”.
Urutau é o nome popular do pássaro que emite barulhos parecidos com os usados nas trilhas de filmes de terror, segundo o biólogo. “As pessoas têm medo e por isso existem muitas lendas sobre a ave”.
O nome da operação foi escolhido possivelmente em referência às supostas contratações de “fantasmas” pela Omep e pela Seleta.