Decisão que rejeita ampliação da terra indígena Buriti reacende tensões
STJ manteve sentença que nega extensão da área cuja disputa, em 2013, culminou na morte de indígena e promessas de solução; agora, produtores cobram indenizações e terenas garantem resistir a eventuais reintegrações de posse
Decisão tomada pelo plenário do STJ (Superior Tribunal de Justiça) manteve posicionamento anterior da Justiça apontando que a área na qual está localizada fazenda Buriti, entre Sidrolândia em Dois Irmãos do Buriti, não é terra indígena. Com isso, reacenderam-se ânimos na região que culminaram, em 2013, em confronto com a polícia durante reintegração de posse no qual houve a morte do terena Oziel Gabriel. Indígenas prometem, na manhã desta segunda-feira (5), realizarem um ato em protesto contra a manifestação judicial e garantem resistir a eventuais reintegrações de posse.
A 1ª Turma do STJ se manifestou sobre o caso na terça-feira (27 de fevereiro) quando, por unanimidade, manteve decisão de 2016 da ministra relatora, Regina Helena Costa, que negou recurso à União à manifestação do TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região) –que em março de 2015 negou pleito da União para expandir dos cerca de dois mil hectares para mais de 17 mil a reserva indígena Buriti, englobando a área em conflito.
Desde as ocupações e a morte de Oziel em 2013, que desencadearam uma série de reuniões junto ao governo federal em torno de uma solução em torno da Terra Indígena Buriti, índios sustentam que têm cumprido o acordo de não avançar sobre outras propriedades rurais além daquelas em que já haviam entrado. A fazenda Buriti, do produtor rural Ricardo Bacha, seguiu ocupada.
“Não estamos em nenhuma outra área, inclusive tem uma aldeia lá”, afirmou Éder Alcântara (MDB), vereador de Dois Irmãos do Buriti e um dos líderes terena que organizam a manifestação para a qual, segundo ele, são esperados cerca de mil indígenas. Nas aldeias, explicou, a notícia sobre a decisão do STJ chegou por meio da imprensa, causando indignação.
Resistência – Alcântara afirma que os terena se baseiam em estudos técnicos que apontam a Buriti e propriedades na região como terra indígena. Mesmo assim, a questão vem sendo sucessivamente alvo de derrotas na Justiça. “Ganhamos na primeira instância, que considerou ser aqui uma terra tradicional. Mas depois começamos a perder”, afirmou o vereador, creditando o fato à organização entre os produtores e membros da bancada ruralista.
O ato, prosseguiu o vereador, trata-se de “uma resposta, para deixarmos claro que a comunidade não vai desistir [das terras]”. Em um primeiro momento, a intenção é apenas sinalizar que haverá resistência caso haja decisões visando a retirada das populações do local.
Proprietário de uma das áreas na região da fazenda Buriti, que segundo ele foi ocupada por indígenas e teve moradias incendiadas no auge da tensão, Vanti Vani considera que a decisão do STJ já era esperada, mas criticou o Ministério Público e a AGU (Advocacia-Geral da União), que atuaram em favor das populações das aldeias.
Na sua avaliação, tais órgãos“já sabiam da realidade” e, ao lado do Judiciário, “ficaram protelando a situação. Não resolveu para eles ou para nós”. Agora, conforme Vanti, os produtores lutarão pela indenização e compra das áreas pelo governo, “que ficou de olhos fechados” e permitiu a degradação das terras, que deixaram de ser cultivadas.
Indenização – “O governo sabia que estava errado e deixou passar batido. Agora, infelizmente, a nação vai pagar”, afirmou o produtor. Segundo ele, os produtores mantém a tese de que desejam receber pelo valor de mercado das terras, apontado por estudo encomendado por eles e que confrontou laudo do governo federal.
Durante discussões com o então ministro José Cardozo (Justiça), no governo de Dilma Rousseff, a União propos pagar cerca de R$ 80 milhões por todas as terras. A avaliação dos proprietários rurais, no entanto, chegou a R$ 124 milhões. “Trata-se da melhor área agrícola na saída da Capital e querem pagar preço de areião”, disse Vanti.
“Não queremos nem mais, nem menos, queremos o valor nosso e dos prejuízos para que possamos nos recompor em outro lugar. Infelizmente muitos que eram donos e estavam trabalhando já morreram, há famílias na miséria. Quem vai pagar por isso?”, questionou o produtor.
Vanti afirma que, após a decisão do STJ, não há mais possibilidade de recurso. Por isso, eventuais novas ocupações representarão “o abuso, vão mostrar que o Judiciário não serve para nada”.
Apesar da indignação de ambos os lados, não há, até o momento, movimentações envolvendo retiradas dos indígenas das terras ocupadas. Mesmo assim, Éder Alcântara considera que a manifestação do STJ “abriu espaço para que possam, sim, entrar com pedidos para reintegração de posse”. “Havia um combinado que não está se cumprindo e vamos estar preparados para enfrentamento, porque não tem jeito”, emendou o líder indígena, reiterando: “sair da área, nós não vamos. Por isso faremos o ato, para mostrar que estamos dispostos a aguardar e defender a causa com a vida”.