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Cidades

Moradores do Deserto do Atacama homenageiam morto pela estrada

Expedição de empresários e autoridades de MS passou pela rodovia Panamericana

Sílvio Andrade, do Chile | 31/08/2017 08:50
Sepultura à beira da estrada (Foto: Sílvio Andrade)
Sepultura à beira da estrada (Foto: Sílvio Andrade)

O Deserto do Atacama, um dos destinos turísticos mais procurados no mundo – e principalmente por brasileiros – é um espetáculo da natureza com suas formações rochosas, salinas, gêiseres, vulcões, lagoas coloridas, vales verdejantes e cânions de água cristalina.

Considerado o deserto mais alto do mundo – com mais de 5 mil metros de altitude –, está localizado na região norte do Chile até a fronteira com o Peru, com cerca de 1 mil km de extensão. Um lugar também intrigante, onde os Chinchorros, antigos habitantes, teriam deixado múmias com mais de 1 mil anos.

Nesse ambiente inóspito, cruzando a Rodovia Panamericana, de São Pedro do Atacama a Antofagasta (são mais de 300 km), o visitante encontra uma centena de sepulturas à beira da estrada, que chamam a atenção pela forma como os moradores locais reverenciam seus mortos.

São miniaturas de casas e até vilarejos com muitas casinhas coloridas, decoradas com adornos, cruzes, flores de plástico, bilhetes, fotografias, bancos de madeira, sofás, pneus, capacetes e até carcaças de veículos. Ao lado das cruzes, tremulam bandeiras do Chile e até de clubes de futebol, como o Colo Colo.

Mais um monumento (Foto: Sílvio Andrade)
Mais um monumento (Foto: Sílvio Andrade)
Interior do túmulo no deserto (Foto: Sílvio Andrade)
Interior do túmulo no deserto (Foto: Sílvio Andrade)

Adoração aos mortos – Mais interessante ainda é que estes locais considerados sagrados pelas famílias dos mortos, não são depredados. Relatos de turistas que viajaram por diversas vezes ao Atacama, espalhados nas redes sociais, afirmam que as sepulturas foram encontradas sem alteração, com os mesmos objetos – ou ainda mais enfeitadas.

Apesar da condição subhumana de se viver no lugar – em algumas áreas onde não chove um milímetro há anos -, o deserto já foi habitado por tribos indígenas e antigos trabalhadores em mineração e sobreviventes do comércio de esterco de aves que se concentra nas montanhas, a maior fonte de riqueza no início do século passado.

Estes nômades tinham a cultura de adorar seus mortos com oferendas, deixando ao lado da sepultura seus bens pessoais como lembrança, explicou o diplomata chileno César Gatica, que acompanha a caravana de empresários e gestores públicos de Mato Grosso do Sul em viagem pela rota da integração, de Porto Murtinho a costa do Pacífico, passando pelo Paraguai, Argentina e Chile.

Os costumes dos antepassados se incorporaram aos novos e dispersos moradores, de forma já mais intensa. Os índios matuches, que habitam regiões do Chile e Argentina, cultuam essa crença religiosa, chamada de animismo, muito comum na antiguidade.

Miniatura de grua é um dos adornos de sepultura de operário, morto em 2005 (Foto: Sílvio Andrade)
Miniatura de grua é um dos adornos de sepultura de operário, morto em 2005 (Foto: Sílvio Andrade)

Carta do pai ao filho – Estas comunidades cultuam os mortos, acreditam no renascimento e na reencarnação e no fato de que tudo tem uma alma ou espírito e uma consciência, desde o mais pequeno micro-organismo da Terra até os grandes planetas dos céus para todo o universo.

Segundo guias de turismo da região, era costume dos povos da região, em especial do Atacama, enterrar seus entes queridos na estrada e homenageá-los com estas estruturas surreais, espalhadas por aquela imensidão sem o verde. Outros contradizem, afirmando que aquelas casinhas não são túmulos, fazem apenas parte da cultura animista.

O fato é que são incomuns e atraem que cruza o deserto. Algumas cruzes estão colocadas exatamente onde a pessoas morreu por acidente na estrada – hábito também dos brasileiros –, principalmente nas curvas perigosas, mas a maioria – as mais ornamentadas – apenas contam a vida do falecido, o que ele fazia e gostava, para qual time de futebol torcia, enfim...

Duas sepulturas, no entanto, chamaram a atenção do jornalista, que também acompanha a comitiva formada por 25 caminhonetes, cuja finalidade de propagar o corredor bioceânico.

Uma delas conta a história de um operador de grua, falecido em 2005, cujo adorno é uma miniatura da máquina na entrada do “imóvel”.

A segunda, sem dúvida, arrepia os pêlos quando se lê uma carta deixada pelo pai, onde ele conta a história do filho e se condena pela sua morte em um acidente de carro, cuja carcaça está exposta na ampla sepultura cercada por um muro de alvenaria. A mãe e uma irmã também deixaram relatos emocionantes.

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