Operações escancaram ‘central de controle’ do crime em presídios
Poder de facção só cresce com fragilidades do sistema carcerário e autoridades se calam
Alvo de duas operações nesta semana, Mato Grosso do Sul mostra a fragilidade do sistema penitenciário, dominado pelo PCC. Depois de décadas de supremacia dentro do Presídio de Segurança Máxima, em Campo Grande dominou todo o complexo, com membros no Instituto Penal, no Estabelecimento Penal Feminino Irmã Írma Zorzi e surpreende pela atuação até dentro do Presídio Federal, criado como modelo de isolamento para os maiores líderes de organizações criminosas no País.
De janeiro até agora, pelo menos seis pessoas foram julgadas pelo tribunal do crime do PCC (Primeiro Comando da Capital) e condenadas à morte. Nos últimos quatro anos, o total de integrantes da facção espelhados fora de São Paulo cresceu 6 vezes, passando de 3 mil para pouco mais de 20 mil em 2018, conforme apontou recente levantamento do jornal Estadão. Mato Grosso do Sul está na rota.
Desde 2016, guerra do poder entre PCC e Comando Vermelho, ficou mais intensa. A morte de Jorge Rafaat Toumani até mudou a geografia do crime no comando do PCC, mas não a situação dos presídios. De dentro das Instituições penais, os líderes do tráfico comandam crimes diversos, continuam movimentando muito dinheiro e decidindo quem vai morrer assassinado.
A Operação Paiol, deflagrada na terça-feiura (12) pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especial e Combate ao Crime Organizado) contra integrantes do PCC, cumpriu 75 mandados de prisão, 16 deles dentro de 6 presídios, inclusive do interior.
Sem satisfações - Diante desse cenário, ainda assim, a Agepen (Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário) e Sejusp (Secretaria de Justiça e Segurança Pública) silenciam. O Campo Grande News busca desde segunda-feira um posicionamentos sobre segurança, depois do fuzilamento do sub-tenente reformado da PM Ilson Martins de Figueiredo. No dia seguinte, com a primeira operação da semana contra o PCC, voltamos a solicitar uma entrevista com representantes da Sejusp, mas até agora não conseguimos nenhuma agendamento.
Titular da 2ª Vara de Execução Penal, o juiz Mário Esbalqueiro Júnior afirma que a estrutura do crime na atualidade ultrapassou a estrutura que o combate. “Qual que é o problema, o crime se organizou, hoje no século XXI a gente não tem mais a mesma criminalidade de cem anos atrás, é importante que o Estados se organizem. A gente não pode ter a mesma estrutura policial, quanto mais a gente investir na inteligência, melhor. Muito melhor na inteligência científica do que viaturas”, afirmou.
Para o magistrado, o grande gargalo nos presídios é a facilidade com que os detentos têm acesso à comunicação externa, com os celulares. “Porque enquanto o sinal funciona dentro da unidade, ele está preso mas está entrando o celular de outro jeito. Ainda que ele esteja preso, alguém assume o comando, como qualquer facção. Mas dificulta, atrapalha, a gente vai ter que se reorganizar”, comentou.
Presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-MS (Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Mato Grosso do Sul), o advogado Christopher Pinho acredita que a situação dos presídios reflete diretamente na organização das facções. “O caos que temos nos presídios são diretamente proporcionais a ausência de condições mínimas de dignidade daqueles que estão presos sob a custódia do estado”.
“Nos últimos anos temos visto um reaparelhamento do Estado na parte de inteligência. Porém não se foca no ponto crucial que é justamente cumprir a lei quando se determina o oferecimento de condições dignas as pessoas com liberdade restrita. Enquanto se foca somente em pessoas "lideres" que são substituídos não se tem ações concretas para reduzir essas precariedade onde se tem pessoas nesse momento passando por situações ansiosas a tortura e reconhecidamente tratados como coisas e não como pessoas”, comenta.
Posição - O Depen (Departamento Penitenciário Nacional) informou que os mandados de prisão preventiva cumpridos no Presídio Federal de Campo Grande, durante as operações policiais, desta semana, tinham como alvos criminosos que atuavam no PCC (Primeiro Comando da Capital), antes da transferência para a unidade, há cerca de 30 dias.
Ou seja, atuavam na facção de dentro de presídios de responsabilidade do Estado e não de dentro do Presídio Federal, estabelecido como modelo de isolamento para líderes de organizações criminosas no País.
“Em nenhum momento os órgãos de investigação cientificaram o Sistema Penitenciário Federal sobre a prática de qualquer crime dentro da Unidade Penal Federal. Nenhum dos presos foi contemplado com visita ou contato com advogados fora do ambiente de parlatório, atendimentos estes devidamente monitorados e com acompanhamento da Divisão de segurança e dos setor de inteligência da Unidade Penal Federal”, diz a nota da entidade.
Contra o PCC - Nas duas operações da semana, um dos alvos foi José Cláudio Arantes, o Tio Arantes, apontado como um dos principais líderes da facção criminosa em Mato Grosso do Sul, preso em Dourados.
Já considerado um dos líderes da facção paulista, ele foi enviado à Penitenciária de Segurança Máxima de Campo Grande para cumprir pena por assassinato e em poucos meses na unidade foi responsável por liderar a maior rebelião já vista no Estado, em maio de 2006, que começou em São Paulo, chegou a Mato Grosso do Sul e se espalhou por quatro cidades do Estado, Corumbá, Dourados, Três Lagoas e na Capital.
Apesar do histórico, ele já conquistou direito ao semi-aberto, foi preso anos depois por tráfico, acabou liberado em 12 dias e voltou ao Presídio de Dourados em 2017, por assalto a banco em Campo Grande.
Tio Arantes também é um dos 7 líderes, alvos da operação Echelon, da Polícia Civil de São Paulo, também com mira no PCC, desencadeada na quinta-feira (14) em 14 Estados, entre eles Mato Grosso do Sul.
Foram 12 meses de investigação que culminaram na descoberta de com a cúpula do grupo mantinha contato com bandidos em outros Estados, atuando nos tráficos de armas e drogas.
A polícia foi acionada quando pedaços de manuscritos foram encontrados nos esgotos do Presídio de Segurança Máxima de Presidente Venceslau (SP) por agentes penitenciários. Após a identificação de sete líderes da organização, a equipe policial descobriu a existência da célula “Sintonia de Outros Estados e Países”.
O grupo investigado, ainda segundo a Polícia Civil de São Paulo, é responsável por acirrar a disputa de facções no Brasil, além de envolvimento em homicídios e desaparecimentos de pessoas.